Recôncavo

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Luísa escrevia mais uma carta, naquela escrivaninha de madeira que seu pai tanto amava. Mais uma vez, nada havia mudado na casa. Parecia ser uma constante, independente dos caminhos que sua vida tomava. O Engenho no Recôncavo baiano seria sempre um lar. Era uma pena que estava na hora de tomar uma decisão. E talvez fosse a última vez que pisava ali.

Era esse o motivo de sua licença na educação das Princesas. Após a morte de Eugênio e o fim do contrato de arrendamento, era hora de definir os rumos daquele lugar. Precisava decidir se largaria sua vida no Rio de Janeiro ou se venderia o Engenho. Não havia outra possibilidade no atual cenário.

Porém não conseguia imaginar uma vida que não envolvesse o Rio de Janeiro. Não naquele momento. Não com as princesas tendo tanto por aprender, e principalmente, não uma vida longe de Pedro. Seria tudo mais simples se ele fosse um homem qualquer, mas Pedro era o Imperador do Brasil. E nunca seria um homem livre.

Seu dilema era justamente o tema da carta que escrevia para Pedro. Contava sobre o clima, o estado da casa, da plantação, funcionários. Falava de sua saudade, e inclusive cobrava Pedro pela frequência das cartas. Afinal, ele havia prometido escrever todos os dias, e mesmo que levasse algum tempo para a correspondência chegar até ela, não era o que estava acontecendo.

Mas não havia insegurança em suas palavras, apenas um tom de brincadeira de quem tinha a intimidade para fazê-la. Estavam juntos há mais de dois anos e Luísa não duvidava nem por um segundo dos sentimentos de Pedro. Ou dos seus próprios sentimentos por ele.

Lembrava-se ainda daquele primeiro período separados, quando aquele mal-entendido havia colocado mais do que distância física entre eles. Eram cartas e declarações de Pedro, e cada uma dilacerava mais seu coração. Quando finalmente se encontraram e esclareceram as coisas, juraram que nunca mais deixariam nada como aquilo separá-los novamente.

E foi assim pelos dois anos, até aquela carta informando a necessidade da presença de Luísa na Bahia. Era mandatório que partisse, e embarcou com suas malas, seu filho, e uma tonelada de saudades de seu amor. Por isso escrevia para ele todos os dias. Contava a ele sobre tudo.

Luísa fechou os olhos, sentindo o peso daquele dia cansativo. Três temporadas como preceptora das princesas fizeram com que se desacostumasse a montaria, sol, poeira. Sentia-se exausta das atividades na fazenda. Não queria nada mais do que um banho. Exceto talvez por Pedro, mas esse era um desejo impossível.

Ela sobressaltou ao sentir duas mãos em seus ombros, mas antes que pudesse reagir sentiu o cheiro dele, e aquele toque de repente fez sentido. Embora, na realidade, não fizesse o menor sentido.

- Condessa. – ele sussurrou no ouvido dela.

Luísa sorriu, sentindo a familiaridade de seu Pedro. O Imperador, mas que para ela era apenas Pedro. Apenas "meu amor".

- O que você está fazendo aqui? – ela perguntou, levantando-se e automaticamente girando para os braços dele. – Você está mesmo aqui, não é? Não é uma alucinação?

- Tenho certeza que estou. – Pedro sorriu, os olhos se fechando levemente com o movimento. – E eu vim em viagem pelo norte. Eu sou o Imperador, afinal.

- Mesmo? – Luísa acariciou a barba dele. – E essa viagem foi planejada, Imperador?

- Alguns dias depois de sua partida, naturalmente. – disse, como se não fosse nada.

- Pedro!

Luísa não sabia se sentia-se ultrajada ou lisonjeada por ser digna daquelas atenções.

- A Imperatriz? – perguntou, com receio da resposta.

- Teresa e eu concordamos que, com sua ausência, era melhor que ela ficasse com as meninas.

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