Todd's pov
Olhar para ele é como uma noite de verão. Sentir o ar denso entrando em meus pulmões, dificultando um pouco mais a respiração do que o normal. É a tranquilidade do céu escuro e estrelado brigando com o calor que o sol deixara ao se pôr. É o suor inoportuno, provindo da ansiedade de que a qualquer momento posso ser flagrado encarando seus olhos.
Será que ele pensa em mim?
Bom, é claro que pensa, somos amigos, colegas de quarto, para ser mais exato. Mas eu quero dizer, com carinho, como alguém a se considerar ou qualquer relâmpago de ideia que faça com que minha loucura pareça um pouco menos insana do que é.
Eu sei que não. Claro que não. Todd, pare de pensar idiotices por um segundo!
Após sair de meu estado de melancolia, fechei os olhos novamente, numa tentativa falha de pegar no sono. Já era meia-noite e eu precisava estar de pé às 06h para não perder a aula de Trigonometria super empolgante do Sr. Henryson.
Droga. Droga. Droga. Simplesmente durma Todd e, mais uma vez, pare de pensar besteira!
Virei-me de barriga para cima e soltei um suspiro como se conseguisse remover meus devaneios absurdos pelos pulmões. Empurrei o cobertor para baixo com impaciência, como se ele tivesse culpa de minha insônia. Olhei para minha direita, observando Neil dormindo profundamente.
Claro que não pensa em mim, do contrário estaria tão perturbado com a ideia que não pegaria no sono por uma semana.
Mas no fundo eu queria que ele estivesse acordado, com os olhos esbugalhados, encarando o relógio e se lamentando ao prever a sonolência matinal do dia seguinte, assim como eu. Não que eu desejasse mal ao meu colega de quarto – muito longe disso -, meu desejo era que ele virasse de um lado para o outro na cama, sem encontrar uma posição confortável, balançando seu corpo da esquerda para a direita, e vice-versa, a fim de não somente se aconchegar, mas de espantar seus pensamentos sórdidos para bem longe. Pensamentos estes que me incluíssem, de preferência. Que incluíssem a fantasia de nossas mãos se tocando despretensiosamente por baixo da mesa da biblioteca ou nossos olhos se encontrando ao nos identificarmos com um verso de mais um poema sobre amor não correspondido, na aula do Sr. Keating.
Já com a respiração compassada, após submerso em meus devaneios, comecei a sentir meus olhos – ainda grudados em Neil – pesarem, pouco a pouco, e meus pensamentos passaram a se dispersar, até que, sem perceber, eu me transportei ao mundo dos sonhos.
*
- Todd! Pela milésima vez, levante-se, já são 6h35, vamos perder o café da manhã! - Neil exclamou enquanto me balançava pelo ombro.
Eu sabia que isso aconteceria. Perdera a hora mais uma vez.
Levantei-me de supetão como se tivesse sido alertado sobre um incêndio, piscando os olhos com firmeza, a fim de abri-los com mais sucesso. Meu colega de quarto tinha essa mania estranha de me acompanhar, mesmo em meus momentos mais atrapalhados.
- Pode ir sem mim, vou me aprontar "correndo" - disse estendendo a palma da mão como sinal de permissão.
- Nada disso, se eu te deixar aí é capaz de você dormir de novo! - respondeu negando com a cabeça e piscando os olhos demonstrando convicção.
Dei de ombros e comecei a me aprontar. Estava tão afoito que mal me incomodei com meu colega presente enquanto eu me despia, afinal, já me acostumara por sermos colegas de quarto. Não era nada estranho.
Caminhando rapidamente ao lado de Perry, após sair do banheiro, estava com pressa de chegar ao refeitório. Já era 06h45, provavelmente pegaríamos os restos que café da manhã que os alunos pontuais deixavam.
- Onde diabos vocês estavam? O café da manhã termina em 5 minutos! - interrogou Meeks, com um pedaço de bolo nas mãos.
- Er... eu tive insônia e... acabei pegando em um sono profundo – eu disse encarando o chão e balançando a cabeça, a fim de espantar da minha mente os motivos pelos quais não conseguia dormir.
- Ah que seja, sentem aí que o dia vai ser longo – disse Charlie com desdém apontando para as cadeiras vazia com o nariz.
Sentei-me ao lado de Neil. Por andarmos sempre juntos, a turma já deixava duas cadeiras vazias, lado a lado, reservadas para nós, já cientes de meus constantes atrasos. Enchi a boca de pão, bebendo suco ao mesmo tempo, para deglutir mais rapidamente, afinal em poucos minutos já deveria estar na sala de Trigonometria. Após terminarmos o desjejum, nos levantamos e caminhamos todos em bando para a aula.
- Nossa, aquela lista de exercícios do Sr. Henryson estava impossível! Fiquei até 23h tentando resolver a última questão, e no fim das contas tive que copiar do Meeks – disse Knox sorrindo, com diversão em suas palavras.
- A lista de exercícios! - exclamei batendo a palma da mão em minha testa, incrédulo - Deixei em cima da escrivaninha, preciso correr para pegar.
- Você vai acabar se atrasando para a aula Todd, precisa ter mais atenção - meu colega de quarto, com os olhos arregalados, mirou-me sem acreditar em mais uma de minhas trapalhadas.
- Me encontro com vocês lá! - afirmei olhando para trás, já caminhando rapidamente em direção aos dormitórios, com Neil me encarando enquanto continuava seu trajeto, ainda incerto se me seguia ou não.
Praticamente corri para meu quarto e encontrei a lista de exercícios bem como deixei em cima da mesa. Estava tão submerso em meus pensamentos que esquecera de guardá-la em minha pasta. Já com a lição de casa em minhas mãos, caminhando de prontidão em direção à porta, mirei a cama de meu colega, com aquele suéter verde que ele usava na noite passada. "Ainda deve estar com seu perfume", pensei e, olhando para os lados, confirmando se ninguém me observava, andei lentamente até sua cama, apanhei a peça em minhas e a levei até meu rosto. Respirei fundo, desejando sugar todo o aroma que exalava da lã. O cheiro de Neil me envolvia a mente em uma nuvem inebriante, que me fazia até perder a firmeza das pernas. Já havia o inalado diversas outras vezes, quando se aproximava de mim para explicar as matérias escolares, ou quando sussurrava uma piada boba em meu ouvido durante as reuniões do Sr. Nolan.
Desperto de meus pensamentos, lembrei-me de que estava terrivelmente atrasado. Deixei o suéter como estava em cima da cama, não deixando vestígios de que fora tocado e me dirigi à sala de aula. Chegando lá, dei graças a Deus que a porta ainda estava aberta e os alunos ainda conversavam esperando o início da tortura sem fim. Neil virou-se para mim, que estava entrando pela porta, e ao observar a lista de exercícios em minhas mãos, lançou uma piscadela seguida de um sorriso, em aprovação. Sorri abaixando meus olhos, tímido pelo o significado profundo que estes singelos momentos tinham para mim.
Certamente, o que eu nutria por meu colega existia somente em meus devaneios, portanto cada situação de maior proximidade eu guardava com afeto em meu palácio mental, em uma gaveta especial nomeada com a etiqueta "Para se recordar". Cada roçar de dedos, olhares e piscadelas despretensiosas eu armazenava como verdadeiros tesouros, já que, provavelmente, seriam o mais perto que eu chegaria de minhas fantasias se realizarem.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Será que ele pensa em mim?
RomanceOlhar para ele é como uma noite de verão. Sentir o ar denso entrando em meus pulmões, dificultando um pouco mais a respiração do que o normal. É a tranquilidade do céu escuro e estrelado brigando com o calor que o sol deixara ao se pôr. É o suor ino...