As primeiras semanas foram intensas. Descobri que o visto de estudante, o qual possuía, não me permitiria trabalhar fora do campus, só ilegalmente. Acho que já deu para perceber que sou uma pessoa de muitos medos. Não sou perfeitinha... Gosto de me aventurar, entretanto, isso estava longe da minha alçada.
Caminhei por algumas oficinas em busca de oportunidades. As melhores vagas eram oferecidas aos alunos do segundo ano. Eu não tinha experiência na área, foi o que me questionaram. Do contrário, poderiam abrir uma exceção.
— Eu sei desenhar, escrevo bem, sou criativa... — Já me apresentava com a voz embargada no estúdio de figurino.
— Você costura? — Uma estudante, que segurava uma tesoura gigantesca, me perguntou. Lembrei-me das minhas roupinhas de boneca, fazia todas à mão.
— À mão serve? — respondi baixinho. A menina negou com a cabeça. Suspirei pesadamente, me dirigindo para fora da sala.
Estava desesperada, achando tudo bem complicado. Saí do local, cabisbaixa, começando a chorar, pois em menos de dois dias, ser rejeitada 4 vezes foi muito para minha cabeça. Ou eu era desnecessária demais, ou azarada. Nas duas opções iria acabar sem dinheiro.
— Pai — disse quando ele atendeu o telefonema. Encontrava-me no banheiro do conservatório, sentada no vaso.
— O que foi, filha? O que aconteceu? — indagou, estarrecido.
— Eu não quero mais.
— Do que você está falando, Carol?
— Está muito difícil, tudo está muito difícil... Eles falam muito rápido... É muito diferente do curso de inglês. Toda hora tenho que pedir para falarem mais devagar...
— Filha, você vai pegar o jeito. Vai ver. É normal.
— Não, o senhor não entende. Tem um monte de coisas que eu não sei fazer. Agora há pouco o professor pediu um trabalho integrado com os outros cursos, mas faltava uma menina na atuação... — soluçava.
— Ahn...
— Só tem menino! — Excedi-me na voz.
— Calma, filha.
— Eles querem que eu faça o papel da menina estrangeira. Estou com vergonha. Não quero...
— Carol, você está aí para aprender... Por mais que não queira ser atriz, vai ter mais experiência.
— Pai?
— Olha, se você for muito ruim, eles vão dar um jeito de encontrar outra pessoa. — Riu do outro lado da linha. Bufei, irada.
— Ajudou muito.
— Que bom! — debochou ainda sorrindo. Dava para sentir. — Agora é sério... Você é muito talentosa. Começou a fazer um monte de coisas de uma hora para outra. Você nem tinha ideia que sabia tudo isso. Vai que isso é como essas outras maluquices suas.
— Até parece! — Esfreguei meu rosto. Não sei como aquela conversa louca me tranquilizava. Talvez eu só precisasse escutar sua voz. Não quis entrar em detalhes financeiros. Tinha fé apesar das oscilações de humor, vivendo em constantes altos e baixos, que apareceria algo para mim.
Quando deixava o setor de indumentária, ouvi uma voz feminina a me gritar: — Ei, menina da jaqueta colorida!
Logo olhei para trás, era a estudante que me atendera na oficina. Ela tinha um piercing no nariz, como eu não reparei antes? Deveria estar muito nervosa mesmo.
— Oi. — Aproximei-me, esperançosa.
— Você é pequena, tem os dedos pequenos... Isso é bom. — Fez bico, afirmando com a cabeça. O que o meu tamanho teria a ver com alguma coisa? Espero que não me ofereça outro papel. Eu berraria. — Nós temos algumas peças delicadas e minúsculas. Acho que daria conta do trabalho, mas precisa ser comprometida.
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NEM NOS MELHORES SONHOS | Degustação
RomansaCarol é uma brasileira que foi abandonada por sua mãe na infância. Aos 19 anos, deixa a família, a faculdade de engenharia, mas mantém o seu namoro à distância com Edu, para se aventurar no exterior, estudando cinema. A bolsista, tímida, ao chegar n...