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Jane deu as costas ao homem armado que esperava na porta e subiu as escadas sentindo cada degrau cair sob seus pés. Ela derramou lágrimas de ódio enquanto as mãos amassavam o contrato que ele entregou. O sangue latejava em seus ouvidos freneticamente. A marcha de seus pés contra os degraus era furiosa. O quarto da mãe era o último no corredor. Ele já nem sabia se deveria chamá-la assim. Pensara que as mães protegiam seus filhos, mas ela era, claramente, uma exceção.

Jane chutou a porta, que se abriu com um estrondo. Bridget estava tão bêbada, jogada na poltrona, que não conseguiu se assustar.

— De todas as coisas que você fez até hoje essa é a pior, Bridget.

Jane já não a chamava de mãe há algum tempo. Desde a morte do pai, quando ela tinha dez anos, Bridget se refugiou na bebida. Três anos de jogos e apostas. Dez de alcoolismo. Mas Jane seguia ao seu lado.

Aos quinze anos começou a trabalhar em dois empregos de meio período para ajudar com as despesas. Era exaustivo passar horas em pé na caixa da loja de fast food. Depois corria para pegar o ônibus para chegar a tempo no pet shop. Café da manhã no transporte público. Quinze minutos de almoço. Trabalho doméstico à noite. Dormia e recomeçava no dia seguinte.

— Eu me mato de trabalhar todos os dias e pago tudo sozinha desde que você foi demitida enquanto você fica jogada no quarto se matando de beber, parei de estudar para não morrermos de fome e você faz isso? — ela lançou a bola de papel contra a mãe, que a pegou trêmula.

Apesar da embriaguez, a inexpressividade na voz de Jane faz Bridget prestar atenção. Costumava ouvi-la irritada, gritando o quanto ela tornava suas vidas mais difícil. Mas aquela decepção era cortante.

— Filha, eu... perdão. Eu sei que é a nossa casa...

— Antes fosse a casa. Por sua culpa eu tenho que trabalhar para um agiota assassino até quando ele quiser.

O olhos de Bridget saltaram para fora e seus corpo esguio tremeu.

— Trabalhar? — o murmúrio praticamente saltou os lábios dela por conta própria.

— O contrato diz que caso a sua dívida esteja alta demais, ele pode escolher o que você tem de maior valor por tempo indeterminado.

— Eu li de maior valor, achei que fosse... a casa — Bridget passou as mãos pelos olhos embaçados soluçou — Eu não podia imaginar. Você não conhece o Ryan, as coisas que ele é capaz de fazer!

— Sabia disso e ainda assim se envolveu com ele — Jane sorriu e cruzou o corredor até seu quarto.

— Jane — Bridget deu um passo à frente, mas encontrou a madeira branca e fria da porta.

Ela pegou a mala de viagem e abriu sobre a cama. Sentiu as lágrimas fazerem arder  seus olhos, mas continuou pegando punhados de roupas e sapatos. Jane foi até a mesa de cabeceira e pegou o porta-retratos que exibia a foto com o pai. Jane tinha seis anos e eles se divertiam no campo de flores selvagens de Columbia River Gorge. Ela sorria para James, que a girava suspensa no ar.

— Tentei honrar sua memória nessa casa, pai — Jane deixou as lágrimas caírem no vidro — Perdão por ter falhado.

Jane engoliu em seco e decidiu se recompor. Fechou tudo, olhou a última vez para o quarto e desejou viver a paz que aquelas paredes brancas transmitiam. Encontrou Bridget ao descer até a sala. 

— Filha... 

— Por favor, apenas não fale comigo. Só invente alguma história para Ash e Peter. Eles precisam contratar alguém para me substituir.

— Por favor, me leve no lugar dela — Bridget suplicou aos tropeços seguindo a filha até o carro — Por...

— Vim buscar a garota, mas não me importo em atirar hoje — o homem agarrou o cabo metalizado sob o cinto da calça e Jane correu para se pôr entre eles.

WILDFLOWEROnde histórias criam vida. Descubra agora