Vazamento
O sol já havia sumido e Hazel estava no jardim da frente com Llira. As duas esperavam Isabel chegar quando o celular da pequena vampira vibrou em seu bolso. Ela imaginou o porquê sua namorada ligaria àquele horário e ficou surpresa ao ver outro nome na tela: Pedro. Atendeu a ligação e percebeu no mesmo instante a ansiedade na voz do rapaz.
— Minha senhora, por favor, me desculpe por incomodar, eu... — Sua respiração estava desregulada do outro lado da linha — Eu gostaria de saber se há algo que eu poderia fazer pela senhora hoje.
— Acredito que não, Pedro. — Hazel achou graça — Você quer alguma coisa?
— Eu, bem, sim, eu queria, ah, se não for um incômodo, faz algum tempo e hoje eu, no hospital, hoje eu trabalhei tanto e, bem, faz semanas que...
— Venha aqui — Hazel o interrompeu — Eu posso morder você.
— Sem que eu faça algo em troca? — A felicidade e o alívio em sua voz eram claros.
— Uhum.
Pedro agradeceu e desligou, então Hazel voltou o telefone no bolso. Seria interessante comer algo diferente e a lua cheia ainda tinha algumas semanas para chegar. De fato não era má ideia. Depois de alguns minutos, ela ouviu o som conhecido do carro do rapaz ao longe, então tomou a pequena gata nos braços e o esperou. Ela havia sido castrada há algumas semanas e Hazel parecia sempre preocupada com a pequena felina, apesar de Isabel insistir que ela estava bem. Havia séculos que a vampira não tinha animais de estimação, então parecia insegura com tudo o que pudesse soar perigoso. Uma vez que o carro estacionou em frente a sua casa, porém, ela deixou a preocupação de lado.
Uma senhora abriu a porta, surpresa com o som do carro, então acenou para Hazel. Com um sorriso simpático, a vampira acenou de volta e a senhora pareceu lembrar-se de algo. Pedro saía do carro quando ela surgiu mais uma vez à porta, com um prato coberto por uma pequena toalha de crochê. Por um momento, o médico não soube o que fazer. Não sabia se entrava na casa, se voltava para o carro, se esperava por alguma instrução de Hazel, até que seus olhos se encontraram. "Entre" ela sussurrou e o rapaz não viu porque procurar por outra opção. Assim que passou por Hazel, a vampira lhe entregou a gata e pediu que a levasse para dentro.
— Eu fiz alguns biscoitos para os meus netos, mas eles não comeram tudo. Meu médico falou que eu não posso ficar comendo muito doce, por causa da diabetes, mas se ficar em casa eu vou acabar comendo tudo! Aqui, fique com eles. — Amélia, a senhora que morava na casa da frente, comentou ao entregar o prato cheio de doces para Hazel — Oras, suas mãos estão tão frias! Mesmo nesse calor! Menina, você precisa usar luvas. Eu vou fazer um par para você, me dê suas mãos.
— Não é preciso, Dona Amélia.
— Mas, Renata, suas mãos são muito frias e pequenas, eu vou fazer luvas para você. — Amélia sorriu e se afastou.
Hazel suspirou, havia desistido de corrigir seu nome. Cada uma das senhoras do condomínio a chamava de uma forma diferente e depois de certo tempo, ela deixou de se importar. Olhou os biscoitos sob a delicada toalha, estavam bonitos, mas não comeria nenhum. Fechou as portas e colocou o prato sobre a mesa da sala.
Pedro estava sentado ali, Llira no colo. Seus olhos brilhavam em expectativa e Hazel quase sentiu pena. A gata pulou para o chão e miou próximo do prato de ração. A vampira chacoalhou o prato e esperou enquanto o rapaz abria o pulso da camisa. Fazia semanas que Hazel não lhe pedia algum favor, semanas que ele não sentia o torpor dos dentes afiados contra sua pele, a voz da vampira que era um veneno para seus ouvidos. A vampira tomou seu braço e sentiu o sangue pulsar sob a pele. Ela abriu a boca, as presas longas e afiadas, e afundou seus dentes nas artérias do rapaz, no calor da vida. Sangue encheu sua boca e ela fechou os olhos vermelhos.

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Arriscado
VampireHá muitos riscos durante a vida, alguns podem ser evitados, outros precisam ser confrontados e há aqueles que escolher correr.