O Vilão colocou a xícara em cima da mesa. A mão tremia levemente, fora de seu controle. Ele fechou os olhos e repetiu para si mesmo que estava tudo bem, tudo estava no controle. As coisas terminaram da forma que deveriam terminar.
Lá fora, as janelas batiam entre si devido às rajadas violentas dos ventos de inverno. Aquela casa isolada estava vazia de alma e cultura. Era apenas a casca do que já fora há muito tempo. A verdade, ele sabia bem, é que ela estava muito mais fria com sua apatia e com seus feitos do que qualquer pedaço de inverno estaria naquela terra congelada.
Quando abriu os olhos novamente, dois olhos verdes grandes o encaravam. Ele os encarou de volta, desejando que fossem reais. Desejando que os deixasse em paz.
- Você parece triste. - Ela falou, se afastando. Os cabelos castanhos estavam sujos de neve dessa vez. - Disseram-me que você dormiu o dia todo.
Ele não respondeu e sua alucinação se aborreceu. Ela começou a vagar pelo quarto, encarando as prateleiras repletas de livros que não eram lidos, avaliou a mobília com aqueles olhos perturbadores e julgadores e se voltou para ele novamente.
- A verdadeira eu te odeia, não é? - Ela falou. Com um suspiro, os olhos que estavam tão amáveis como anos atrás, ficaram vermelhos de ódio. Do jeito que ele se lembrava, tatuado em sua memória como da última vez que a tinha visto. - Você não está miserável o suficiente.
- Eu sei. - Ele respondeu. Aprofundou-se na poltrona, já acostumado. Antes, ela estava sempre lá. Agora, ela aparecia constantemente, mas ele ficava sozinho às vezes. Ele não sabia o que era pior. - Eu sei disso.
- Deveria ter sido mais corajoso, lutado por mim. - Ela continuou falando, mas ele não estava mais a ouvindo. Não doía mais. Não tinha mais o que ser feito, então o que mais ele deveria fazer? Essa coisa que ele sentia - essa apatia, esse vazio - estava sempre lá. Sempre estaria lá. E não havia nada a ser feito. - Lutado pelo que é certo.
- Mas eu não fiz isso. - Houve um silêncio. Quando achava que ela tinha ido embora, ele abriu os olhos, mas ela ainda estava lá. Parecia prestes a chorar. Sentiu uma pontada no peito. - Você está bem?
- Sabe que o que eu te disser não é necessariamente verdade, não sabe? - Eles se encararam. Algo de pesado estava no ar, algo mórbido demais para ser resolvido. Talvez pela morte do pai dela, jogando fora todos os anos de amizade e de amor. Talvez pela morte da família dele pelas mãos de um velho tirano por serem uma ameaça ao trono, apesar da filhinha amável que ele tinha em casa. Ou talvez aquilo tudo fosse os problemas que viviam com ele o assombrando, afinal, era com ele mesmo que ele estava conversando. - Mas estou bem.
Ele assentiu levemente.
- Que bom. - Ele encarou seu pequeno exílio. - Isso é muito bom.
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O vilão. - parte final
RandomConjunto de histórias tristes - um livro rápido dos sentimentos.