Foi na casa da tia Adelaide que ela viu o Natal pela primeira vez. As luzes da árvore piscavam, emando brilho diretamente para aqueles olhos infantis, maravilhados com os mini enfeites pendurados em cada galho. Cada detalhe lhe era extremamente precioso, As esculturas com as mini cidades cobertas de neve, a caixinha de música com um trenzinho que soava angelicalmente enquanto passeava pelo pitoresco cenário que compunha, os presentes empilhados em baixo da árvore; e de repente, era como se aquela sala, que sempre lhe fora comum, se transformasse em algo mágico, raro e incrível.
— Liana, sai debaixo dessa árvore! — ordenou a mãe para a garota, mas a menina nem se mexeu, estava perdida naquele mundo novo e maravilhoso.
— Deixe ela! — interferiu a tia, rindo — A culpa é sua por nunca ter levado essa garota para uma festa de natal em cinco anos.
A mãe soltou um suspiro cansado, deixando seu incômodo transparecer livremente.
— Não tem muito como arrumar decoração numa estação de pesquisa no meio do Pólo Norte, não é mesmo?!
Sendo amigas por anos, A tia Adelaide sabia o que aquela confissão significava para a cunhada, mas ainda assim não podia deixar de sorrir.
— Me parece o lugar perfeito, na verdade — Ao ver a amiga revirando os olhos, Adelaide riu — Sério, Mari você podia ter encomendado comigo, eu mandava coisas direto pra você e pro Paulo.
— Não quero encher a cabeça dela com bobagens.
A tia Adelaide decidiu interromper a conversa ali. Não era uma discussão que iria dar prosseguimento. Ela amava o Natal desde que podia se lembrar, e por isso mesmo, sempre exagerava na sua decoração. A sua casa era repleta de enfeites natalinos até onde os olhos podiam ver e além, a coleção de uma vida inteira, que ganhava novos elementos todos os anos. Mariângela, porém, não era fã do natal, seja de forma religiosa, seja de forma comercial, por isso não fazia questão de comemorar. Adelaide achou que com o nascimento de Liana, a amiga iria acabar cedendo um pouco, mas aparentemente isso não acabou acontecendo.
— Liana, você quer ver o que o Papai Noel deixou na árvore pra você? — chamou Adelaide empolgada. Mariângela lhe deu aquele olhar imediatamente, mas o estrago já estava feito.
— Quem é Papai Noel? — perguntou a menina saindo debaixo da árvore.
A expressão apologética de Adelaide não ajudou a amenizar as feições no rosto de Mariângela.
— Ninguém, filha! É só uma brincadeira da tia — falou inflexível.
Liana olhou para a tia, que lhe mandou uma piscadela, e a garota não perguntou mais nada a respeito o resto da noite.
Mas Liana era esperta para seus cinco anos. Não que ela fosse um prodígio, mas qualquer criança criada em um centro de pesquisa, onde tudo o que ela tinha eram livros e adultos com inteligência acima da média à sua volta para interagir, acaba desenvolvendo uma mente mais afiada. E por isso mesmo, quando a mãe foi dormir, a garota saiu da sua cama e se arrastou de volta para a sala onde a tia ainda estava confortavelmente sentada no sofá, ao lado da árvore mágica, folheando uma revista.
— Oi Lili, achei que você já tava dormindo! — exclamou a tia ao ver Liane postada à sua frente.
— Shhh! — soltou a menina, colocando as duas mãozinhas na frente da boca da tia, enquanto seus olhos encaravam o corredor para se certificar de que a mãe não a havia escutado.
Adelaide teve que segurar o riso, muito embora a expressão séria, que aquela pequena garota de cinco anos lhe dava, tornasse a tarefa difícil.
— Quem é Papai Noel? — sussurrou como se quisesse saber um segredo. O espírito jovem de Adelaide a fez entrar na brincadeira da sobrinha.
— Ohh Papai Noel, ele é muito famoso Lili. — começou a tia — Ele é um velhinho que trabalha no Pólo Norte e distribui brinquedos pra todas as crianças do mundo.
— No Pólo Norte? — repetiu a garota ao ouvir o nome familiar.— Eu já vi ele antes? Porque ele nunca me deu brinquedos? É porque eu não sou filha dele?
Adelaide riu com o bombardeio de perguntas da sobrinha. Em um gesto amável e pouco conhecido pela garota, Adelaide pegou a menina e sentou-a em seu colo. Liane se mostrou surpresa e demorou a entender o gesto da tia, mas rapidamente se encontrou confortável.
— O Papai Noel não é pai de ninguém específico, mas chamam ele de Papai Noel porque ele é bondoso e trata todas as crianças como se fossem seus filhos.
Quanto mais Adelaide falava sobre o famoso Papai Noel, mais Liane ficava maravilhada. A tia lhe apontava a imagem do bom velhinho em suas decorações, falava sobre a misteriosa fábrica e os duendes que trabalham nela.
Adelaide foi surpreendida por Liane quando teve que lhe responder quanto os duendes ganhavam por ano de salário, o que você tinha que estudar para ser um duende, se o Papai Noel tinha filiais da sua fábrica em outros lugares do mundo e quanto ele pagava pelo frete dos presentes. Depois de sobreviver a essas indagações, Adelaide concluiu que aquela garota era definitivamente filha de Mariângela e Paulo.
— Tia, como faz pra ser Papai Noel? — perguntou a garota.
Adelaide foi pega de surpresa de novo.
— Não acho que ele vai se aposentar tão cedo, Lili — respondeu com o sorriso mais confiante que conseguiu.
— Mas ele já é velho, não é?
A risada da tia ecoou involuntariamente. Como explicar pra uma criança que Papai Noel é apenas uma folclore, que nunca vai envelhecer ou se aposentar.
— Liane, o que tá fazendo acordada? — A voz de Mariângela surgiu na porta do corredor.
Liane olhou para a tia, seus pequenos olhinhos implorando segredo. Adelaide sorriu e assentiu, tampouco queria que sua amiga e cunhada soubesse que ela havia enchido a cabeça de sua filha de "bobagens".
— Volte já pra cama, temos um vôo pra pegar amanhã! — disse enquanto pegava a garota no colo e levava de volta para a cama.
Mas Liane não dormiu. Ao contrário, sua pequena mente estava mais acordada do que nunca. Tanta coisa nova e maravilhosa que ela tinha aprendido hoje. Sua mente imaginou que lugar incrível deveria ser a fábrica do Papai Noel, um lugar repleto de brinquedos e decorações de Natal. Ela não sabia muito sobre duendes, mas já gostava de todos eles. Mas Papai Noel não era infalível, ele havia esquecido dela por todos esses anos pois, segundo a tia, "ele não conseguiu perceber uma criança no meio de tanto adulto." Mas Liane não comprava essa desculpa. Ela ser a única criança no meio de adultos era um motivo para se destacar, não ser ignorada. Como Papai Noel ou nenhum duende nunca reparou que ela estava por ali, mesmo ela sendo quase vizinha deles por cinco anos? Isso demonstrava claros erros na administração.
Amanhã isso mudaria. Ela voltaria pro Pólo Norte, e poderia pôr seu plano em ação. Ela iria descobrir como se tornar a próxima Papai Noel.
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A Escola de Papais Noéis
AdventureUm conto com alguns poucos capitulos, em homenagem ao Natal. Liane nunca soube nada a respeito do Natal ou Papai Noel, mesmo morando no Pólo Norte toda a sua vida. Agora que sua tia Adelaide lhe contou todos os segredos do Natal e sobre quem é o Pa...