Capítulo 1 - Sangue

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Meus dedos finos e longos, tocam as teclas do piano com destreza. Um sorriso se forma em meus lábios, ao ouvir vozes murmurando algumas poucas palavras. O silêncio volta a prevalecer naquela sala e uma canção bem conhecida, se forma a medida que eu tocava o instrumento - Amava fazer isso no meu tempo livre - Meu olhar se volta a aquelas seis crianças, que estavam sentadas no chão ao meu lado. O sorriso de cada uma era largo e seus olhinhos brilhavam ao observar o que eu fazia. Cada uma delas era especial do seu jeito, mas essas crianças tinham algo em comum.

Hoje aos 27 anos, sou hematologista. E se você tiver uma noção básica do que significa ser um profissional nessa área, saberá o diagnóstico de cada criança nesta sala. O hematologista é o médico que estuda, pesquisa e que trata de pessoas com doenças no sangue e nos órgãos hematopoiéticos - medula óssea, linfonodos, baço e fígado.

- Doutor Zhang, cante também, por favor!

Sorrio para a pequena que chama minha atenção e assinto. Penso em uma canção específica e ganho fôlego.

- I believe I can fly...

Canto esse simples verso, ao passar os dedos pelas teclas e escuto algumas palminhas animadas. Continuo a canção em tom baixo, evitando elevar o tom da voz. Quando termino a mesma, volto o meu olhar para as crianças e uma vergonha me consome ao ver que eu estava sendo observado por mais pessoas. Levanto do pequeno banco que eu me encontrava sentado e faço uma reverência por causa dos aplausos - que não eram um absurdo de alto - que viam de todos que estavam naquela sala.

Esse pequeno espaço cultural que havia no hospital, era para que os pacientes pudessem ter uma distração, algo para que não ficassem preso a uma cama de hospital dia e noite. Era confortante tocar naquele piano e ver o quanto esse pequeno ato animava algumas pessoas. Geralmente, eu fazia isso no meu horário de almoço, mas ultimamente ando tocando em qualquer oportunidade que tenho. Essa sala especial - pelo menos para mim - ficava no terceiro andar do prédio. O hospital era enorme e um dos mais caros da Coreia do Sul. Também era muito bem recomendado, tendo tecnologia avançada e uma equipe médica bem capacitada.

Antes de sair, cubro o teclado do piano preto e saio. Ando pelos corredores sem ter muito o que fazer - porque hoje eu estava de plantão - e entro em alguns quartos para observar os pacientes que estavam sobre os meus cuidados, porém isso não durou muito. Quando cheguei ao refeitório, fui chamado por uma enfermeira que dizia ser uma emergência. A mesma diz que o paciente estava com dores fortes no abdômen e também muita falta de ar. Corremos até o quarto e ao entrar, vejo outra enfermeira o ajudando. Rapidamente dou as instruções para ambas e o seguro para que parasse com aquela agitação.

- Por...favor ...

O paciente pede desesperado e logo a enfermeira trás a máscara de oxigênio.

- Aplique o remédio para ajudar a baixar a febre e as dores no abdômen.

A mesma assente indo atrás do remédio, junto da outra enfermeira. Volto o meu olhar ao paciente, que já se encontrava um pouco mais calmo, a medida que a sua respiração começa a normalizar. O homem a minha frente estava com seus olhos fechados, aparentava ter a mesma idade que eu, seu cabelo era tão negro quanto a noite, sedosos e estavam levemente oleosos. As mechas curtas, grudavam em sua testa por conta do suor e sua pele pálida, dava um contraste lindo em seus olhos cor de mel, que eram bem claros. Só consegui apreciar eles, depois que o mesmo abre seus olhos novamente.

- Se sente melhor?

Pergunto num tom suave e gentil. Ele assente com um sorriso fraco e percebo que sua mão ainda segurava a minha, então com cuidado a deixo em cima da cama. As enfermeiras aplicam o remédio - num tubinho que estava ligado a veia do paciente - enquanto eu pegava o prontuário do mesmo. Olho para ele com um sorriso fraco nos lábios.

- Senhor Kim. Você só deu entrada no hospital apenas nesta semana?

O mesmo assente novamente e arqueio uma das sobrancelhas, porque não era a primeira vez que eu o via no hospital. Olho sério para uma das enfermeiras, que me dá total atenção.

- Quem está tratando do caso dele?

Mesmo sério, eu não demonstrava grosseira na voz quando ela suspira com pesar.

- O doutor Choi

Dessa vez, quem solta o ar com pesar sou eu. Concluo que este paciente, não estava sendo bem tratado nas mãos do meu colega. Eu não era do tipo de ficar julgando ou discutindo com outros médicos, mas esse comportamento me deixava irritado. O pensamento "esse paciente não tem mais salvação" não me caia bem. Eu estudei medicina para dar o melhor de mim, até a última hipótese, mesmo ela sendo a mais absurda. Porém, para os outros parecia tão fácil e simples desistir antes mesmo de tentar.

- Doutor...

Me viro quando o paciente - com o sobrenome Kim - me chama. Numa voz fraca e abafada pela máscara. Ando até o mesmo e quando paro ao seu lado, vejo seus olhos marejados.

- Me ajuda... eu não quero morrer

Escutar aquilo partiu meu coração. Sabia que a minha profissão exigia que às vezes eu fosse frio, mas eu não conseguia desistir dos meus pacientes e o meu maior desgosto, era saber que nem todos eram assim. Meu olhar se prende ao dele - que demonstrava desespero e uma grande vontade de viver - que não penso ao pegar sua mão com cuidado.

- Você não vai morrer. Eu vou cuida de você e logo ficará tudo bem. Mas se isso não acontecer, saiba que eu fiz tudo o que estava ao meu alcance.

Sou sincero e também surpreendido com um sorriso esperançoso vindo do mesmo.

- Obrigado, doutor...

Sorrio para ele e nego com a cabeça.

- Só estou fazendo o meu trabalho e prefiro que os meus pacientes me chamem pelo nome. Me chamo Yixing. E você?

O homem de cabelos negros aperta minha mão - provavelmente com toda a força que tinha, que era mínima - e mantém o sorriso.

- Kim Junmyeon

Escuto seu nome e aperto - não muito forte - sua mão. Era apenas para dar a ele um leve conforto de que não estava sozinho, porém eu senti algo naquele toque. Poderia ser loucura da minha cabeça, mas era como se o Junmyeon não estivesse naquele lugar por um à caso. Porque foi naquele instante, fitando aqueles olhos cor de mel, alguém como eu, que apenas acredita em coisas concretas, que possam ser vistas e tocadas. Comecei a crer, que o nosso destino estava ligado a uma linha invisível.

Notas da autora:Comentem o que acharampara que eu possa continuar 🙈

Tempo (Sulay)Onde histórias criam vida. Descubra agora