Capítulo 8

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Benjamin's pov:

No dia seguinte, não vi meu pai em casa pela manhã, devia estar jogado no chão de algum bar bêbado. O dia na escola não foi dos piores, conversei com Anne no intervalo e a companhia dela não é das piores.

__Cheguei pai __gritei assim que cheguei e casa, na esperança do meu pai já estar em casa.

__Se você quiser comida, vai precisar fazer você mesmo __falou jogado no sofá enquanto estava concentrado no programa que passava na televisão.

__Tô sem fome __coloquei a mochila na cadeira e sentei ao seu lado. Não é algo comum, sempre evito ter muito contato com ele.

__ Precisamos conversar __meu tom de voz era baixo porém firme.

__Fala logo o que você quer e me deixa em paz logo, não sei se você percebeu mas eu estou querendo assistir televisão __disse ríspido. Será que ele não pode se esforçar nem um pouco?

__Primeiro, tenta ser um pouco menos grosso pelo menos uma vez na vida, eu só quero conversar com você... uma conversa de pai e filho...__ ele se virou para mim tirando a atenção da televisão e focando no que eu estava falando __Segundo, você sabe que está se matando lentamente se você continuar se afogando nas bebidas dessa maneira, não sabe?

__ De novo essas baboseiras, eu sei muito bem o que eu faço da minha vida __disse revirando os olhos.

__Pai, eu estou falando sério, deixa eu continuar? __perguntei e ele apenas assentiu.

Continuou quieto só prestando atenção em cada palavra que eu dizia, eu espero pelo menos. Ele sabe que eu tenho razão, mas ele acha que essa é a única forma de lidar com as coisas. Nem parece o homem que eu criança admirava.

__Você sabe que se entupir de bebida alcoólica não vai trazer a minha mãe e a minha irmã de volta, e isso só vai acabar te matando também. __continuou só escutando tudo aquilo.

__ME RESPONDE! VOCÊ SABE DISSO, NÃO SABE? __ acabei me alterando, estressando ele também e pronto, o que deveria ser uma conversa virou uma briga em poucos minutos.

__SIM, EU SEI, MAS ESSA É A ÚNICA MANEIRA DE EU CONSEGUIR ESQUECER A SUA MÃE, A SUA IRMÃ E A PORCARIA DO ACIDENTE QUE MATOU AS DUAS. __nessa hora eu senti algumas lagrimas teimosas querendo cair e tenho a impressão que os deles também se encheram delas.

__POR QUE VOCÊ QUER ESQUECER ELAS? SE VOCÊ AMAVA E AMA AS DUAS DO JEITO QUE DIZIA, DEVERIA VIVER POR ELAS, REVIVER A MEMÓRIA DAS DUAS, E VAI POR MIM, DESCONTAR A SUA DOR NA ÚNICA PESSOA DA SUA FAMÍLIA QUE TE RESTOU E BEBER CERVEJA, CACHAÇA, VODKA OU SEI LÁ MAIS O QUE ATÉ NÃO AGUENTAR MAIS NÃO VAI FAZER AS DUAS SE ORGULHAREM DE VOCÊ, MUITO PELO CONTRÁRIO.

Desde criança, aquela foi a única vez que eu vi meu pai chorar depois de ter superado o luto. Quer dizer, ele nunca superou, acho que está tentando aceitar e falhando miseravelmente nisso até hoje.

__Eu tenho certeza que se a minha mãe olhasse pra você hoje, ela sentiria vergonha de dizer que amou e se casou com o ser desprezível que você se tornou__ disse na lata, com um nó na garganta e desgosto na voz. Pode ter machucado, mas ele precisava ouvir isso, mesmo que seja duro, tanto para ele quanto pra mim.

- Quer saber? Eu não fico mais nem um segundo nessa casa discutindo com um pirralho que nem sabe o que está fazendo da vida – falou irritado indo em direção à porta. Aqui vemos que ele não aguentou ouvir a verdade entalada na minha garganta a tanto tempo.

__Acontece que o pirralho aqui já vai fazer 18 anos e pelo visto eu não sou o único que não sabe o que está fazendo da vida __disse em um tom firme com um leve ar de deboche e, limpando as lágrimas que haviam descido pelo meu rosto involuntariamente, acrescentei __eu tenho certeza que a minha mãe NUNCA, tá ouvindo? NUNCA SE ORGULHARIA DE VOCÊ

__VAI LÁ, FOGE DE CASA IGUAL VOCÊ SEMPRE FAZ, PENSA EM TODAS AS BESTEIRAS QUE VOCÊ FAZ DESDE QUE A MINHA MÃE MORREU, PORQUE É SÓ ISSO QUE VOCÊ SABE FAZER –continuei dizendo mesmo depois do meu pai já ter cruzado a porta saindo de casa indo pra sabe-se Deus  onde.

Ok, brigas com meu pai são comuns, mas essa ultrapassou as demais. Isso é um tópico muito difícil para ambos comentarem sobre, mas a questão aqui é que não é justo ele culpar e descontar a única pessoa da família que sobrou pra ficar com ele. 

Nunca fomos próximos, sempre gostei mais da companhia da minha mãe, meu pai vivia trabalhando então nunca tinha tempo pra família direito, minha mãe claramente ficava chateada com isso, sempre se perguntando se não tinha algo melhor esperando por ele e que permitisse mais tempo com a própria família e por isso vivia pedindo meu pai para que arrumasse um emprego melhor em questão de carga horária. Talvez, justamente por nunca ter a ouvido, agora o coitado se culpa por não ter se dedicado tanto à esposa e à filha, e agora (sem emprego) não consegue compensar esse tempo perdido.

É, realmente a vida é muito curta.

Como meu pai está sem emprego, o que é igual a sem dinheiro, minha tia Angeline nos ajuda como pode. Ela era a única irmã da minha mãe e não sei se é por isso mas as duas eram muito próximas, então ambas viviam uma na casa da outra (obviamente quando minha mãe ia na casa dela, nós íamos juntos já que não ia ter ninguém em casa para cuidar das "crianças"). Depois do que aconteceu ela ficou extremamente arrasada, e virou a única pessoa que eu posso confiar e que entende minha dor, sempre tentando me ajudar de todas as formas.

Tia Angel já tentou nos chamar para morar com ela mas o rabugento do meu pai não quis aceitar. Em parte eu até entendo ele não querer sair dessa casa pois aqui tem parte do que nossa família era, ou deveria ser. Acredito que ele não tenha muitas lembranças com os filhos nessa casa, diferente de antes da minha mãe engravidar, época em que meu pai ainda não havia sido tomado pela maldição da rotina de se matar de trabalhar para sustentar a casa. 


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⏰ Última atualização: Jul 30 ⏰

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