Parte I

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– Ella... Ella...

Rafaella se remexeu na cadeira e lentamente abriu os olhos para logo fechá-los quando a luz forte do cômodo penetrou seus orbes verdes e cansados.

- Senhorita Rafaella... – novamente escutou aquela voz que a acordara, mas agora conseguia distinguir as palavras com mais clareza.

Coçando o olho, levantou o rosto levemente marcado por dormir com a cabeça na mesa usando apenas seu braço esquerdo como um travesseiro improvisado. Piscou algumas e finalmente focou na pessoa parada à frente de sua mesa.

- Senhorita Rafaella, já são sete horas. Não tem mais ninguém no escritório - comentou Alicia, sua secretária.

- Obrigada, Alicia – limpou a garganta, tentando tirar aquela rouquidão típica de pós acordar – Mas ainda tenho alguns casos para rever... – disse e então percebeu alguns papéis espalhados pelo chão, provavelmente que caíram enquanto ela dormia pela mesa, e se abaixou para pegar.

- É véspera de Natal, senhorita Rafaella – a secretária comentou como se fosse a coisa mais óbvia do mundo, o que fez Rafaella deixar escapar uma risada sem humor. Alicia estava trabalhando com ela fazia apenas quatro meses, e não sabia que a sua tradição de Natal era justamente não comemorar o Natal e passá-lo trancafiada no escritório com uma bela garrafa de merlot. Afinal de contas, não havia ninguém a esperando em sua casa fria e escura.

- Eu sei, mas ainda há uns casos importantes que preciso dar uma olhada. Você pode ir, eu fecho o escritório – colocou os papéis de volta a mesa, e apoiou-se na estante, com os braços cruzados vendo a incredulidade de Alicia – Feliz Natal, Alicia. Para você e para sua família – continuou, esperando que a secretaria entendesse que gostaria de ficar a sós.

- Feliz Natal – Alicia respondeu franzindo a testa, mas sentindo que não teria mais conversa com sua chefe, apenas acenou e deixou o escritório.

Assim que viu sua secretária se perder de vista, Rafaella se desencostou da estante e caminhou até uma pequena adega que mantinha em sua sala, mas para sua decepção, ela a encontrou praticamente vazia. Apenas o restinho de um chardonnay.

Esfregou o rosto, sabendo que não teria outra alternativa a não ser se aventurar no mercado mais próximo, que provavelmente estaria lotado devido à capacidade do brasileiro de deixar tudo para a última hora.

Pegou sua bolsa e caminhou pelo agora escritório vazio em direção ao elevador. O que normalmente demorava alguns minutos para chegar ao térreo do vigésimo segundo andar, por conta de não ter nenhuma parada no caminho, Rafaella desceu em tempo recorde.

Atravessou a rua, grata por trabalhar no centro da cidade onde não precisava procurar muito pelas coisas que desejava.

Sem passear pelo mercado, seguiu direto para a sua sessão favorita, especialmente nesta época do ano. E ali, com grandes letras garrafais vermelhas, uma placa marcava o que seria sua grande companhia nos próximos dois dias.

Olhou alguns rótulos, antes de se decidir pelo seu vinho preferido. Merlot. Pegou três garrafas, sem se importar com o preço, e seguiu para o caixa. Mas antes que saísse da sessão de bebidas, em um impulso, parou em frente aos vinhos rosé e, sem pensar, pegou uma garrafa, as colocando junto às outras na cesta do mercado. Havia anos que não sabia o que era tomar uma taça de vinho rosé. Pensou em devolver, mas algo a impedia.

Suspirou e voltou a caminhar para o caixa, mas então mais uma vez foi impedida de continuar, dessa vez por algo no chão que chutara sem perceber. Franzindo a testa, olhou para o chão. Era um pequeno globo de neve. Um pequeno globo de neve que fez o coração de Rafaella acelerar. Não era possível.

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⏰ Última atualização: May 17, 2022 ⏰

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