Estrela cadente

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   — Estrela cadente?
   — Não era bem estrela cadente. Quer dizer, não sei! Como vou saber? Fez um cabum! O céu tinha escurecido antes disso, caiu como um meteoro. Tem certeza que não passou nada na TV, pai?
    Ele nega.
    — Isso é fome. Pega — mamãe põe a garrafa de café e as xícaras na mesa — Coloca leite, beber sem isso com bolinho dá azia.
    — A senhora não acredita em mim, né? — pressiono a xícara — será que meus poderes espirituais...
     — Lá vem ela com esse negócio. Vai chegar com esse negócio de espírito para lá, menina.
     — Faz tempo que eu não ouvia nem sentia nada. Posso estar tendo visões agora? — Arregalo os olhos, assim como mamãe o faz também, fazendo sinal de repreenda.
    — José...
    — Sua filha.
    — Mais sua.
    — Marina é sua versão jovem, Raimunda.
    — Tsc.
      Meu pai vira para minha mãe e a observa, antes de olhar para mim e apontar sem fazer esforço de levantar o braço da parte de encosto do sofá.
    — Ainda bem que faz psicologia.
    — Ela não pode consultar familiar.
    — Estou falando dela se auto tratare sorri.
      Dessa vez, eu estalo a língua.
    — Calma aí — minha mãe intercede por mim — Quem começou com esse negócio de se dizer sensitivo porque via vulto e depois descobriu que tinha problema de vista, foi você. A menina ouviu criança e ficou com isso na cabeça até hoje. Se ela pudesse, a primeira pessoa que ela deveria tratar seria você, Zé.
      O que eu vi poderia ser fruto de um problema de vista? Não. Claramente eu vi algo sendo despejado pelo céu. E isso estava nítido. Não era vulto.
    — Será que foi alucinação mesmo? — pergunto, e embora tenha saído mais como um sussurro por ter sido uma auto- reflexão, minha mãe ouviu e respondeu:
    — Provavelmente. Mas...
    — Mas, o que?
    — Eu lembrei daquela história de que Lucinda era filha do boto cor-de-rosa.
    — Lucinda, sua tia-avó que morava na colônia que você ia na infância? — meu pai abaixa o volume da TV.
      Minha mãe assente.
    — E a senhora acredita nisso? Eu pensava que era a única da família que não acreditava.
    — Ela falava com tanta convicção, e aparentava ter tantas provas... — mãe da de ombros e faz um bico de descaso — eu acredito.
    — Acredita que a tia-avó era filha de um boto mas não acredita que a filha viu algo caindo do céu.
    — É que você sonha demais. Mas eu acredito. Só não penso que seja do tamanho que você disse, Marina. Se tivesse sido algo importante, já estaria em todos os cantos de noticias.
        Assinto. Certo, é verdade.
        O som de rápidas passadas dadas por pés pequenos calçados de algum salto adequado para criança que provavelmente tem uma flor de enfeite na frente se é ouvido.
     — Você já está pronta? É só sete horas, Alice. Isso para nós. A festa deve começar só lá para as oito...
     — São cinco horas, mamãe disse — minha irmã caçula me responde — e papai me disse que poderíamos ir uma hora antes.
    Olho para nosso pai, ele concorda.
    — Lyan ligou para ela mais cedo. Queria que ela fosse para lá brincar, mas sua mãe disse que você estava lá ajudando e que crianças brincando poderiam atrapalhar a arrumação.
    — Valha como está linda, princesa. Dá uma voltinha aí para mamãe ver — nossa mãe faz um movimento giratório com o dedo indicador, como um controle que fez minha irmã girar também.
        Olho para o celular.
    — Vamos às seis horas mesmo?
    — Sim. Se for se arrumar, vá logo. Você demora mais. Depois seu pai vai, depois eu. Alice já está arrumada.
      Tomo com mais rapidez o café e termino com as bolachas. Não vai dar tempo de arrumar o cabelo. Nem de me maquiar direito.
    — Qualquer coisa, vá de roupa normal e chinela para Augusta. Você se troca lá.
    — É. Farei isso. Ah, mãe, minha sandália quebrou.
    — Pega essa outra aqui. Quando formos na rua, compraremos outro. Ou vá lá em Bia.
    — Vai tomar banho, Marina! — Alice me empurra até o banheiro — Desse jeito não vamos sair daqui hoje.
      Apenas ergo a sobrancelha.
      Até parece que não vê o aniversariante todos os dias desde a creche.
      Apesar de saber o exagero no adiantamento da hora, faço o planejado. Tomo meu banho e separo minhas roupas — certamente uma festa de criança não me cobra muita formalidade. Ainda assim...
   — Mãe! Com que roupa a senhora vai?

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⏰ Última atualização: Dec 30, 2021 ⏰

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