Nós precisamos conversar

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Lá estava ele, sozinho, sentado em sua cama e encarando a porta, ansioso. Seus olhos azuis perderam o brilho nas últimas semanas e Luka precisava que alguém específico entrasse por aquela porta para recuperá-lo.  Ele esperava todos os dias, naquele mesmo horário. Não sabia o por quê, mas em sua cabeça fazia sentido que Esteban voltasse para a escola no turno da manhã e não em qualquer outra hora do dia.

Olhou para o relógio, que com certeza era mais caro que todos os móveis daquele quarto, e suspirou ao perceber que estava atrasado para a primeira aula do dia. Então calçou os sapatos, pegou a mochila e, de maneira preguiçosa, caminhou até a porta, encostou na maçaneta e sentiu ela girando, mesmo sem ter feito esforço para isso. Luka se deu conta que alguém estava entrando. Nesse momento, seu coração acelerou e, após ver quem tinha chegado, suas pupilas dobraram de tamanho

— Estéban! — exclamou e abraçou o garoto logo em seguida — Você voltou... — ele falou aliviado, com os olhos fechados, aproveitando cada segundo daquele abraço.

— Parece que alguém sentiu minha falta — Estéban respondeu, com seus braços ainda ao redor da cintura de Luka. Ele não demonstrou, mas esperava aquele abraço tanto quanto o colega de quarto.

— Você tá brincando? Eu não só "senti sua falta". Eu fiquei preocupado de verdade, seu caipira! — Luka rebateu, um tanto quanto estressado, como de costume.

— Ih... já voltou ao normal — disse Estéban, enquanto colocava suas malas em um canto do quarto.

Estéban havia passado três semanas na casa do pai, no meio do ano letivo. Não respondia mensagens, não usava suas redes sociais e tampouco atendia ligações. Apesar do comportamento imaturo, Luka entendia o motivo do "amigo" agir assim. Depois de descobrir que
Marcelo Colucci era seu pai, Estéban levou um tempo para digerir a situação. Tarefa nada fácil, já que Marcelo negava copiosamente a paternidade. Obviamente, um dos homens mais ricos do México, pediria um teste de DNA e foi exatamente o que aconteceu.

Nas vésperas do resultado, há cerca de um mês, Luka e Esteban se aproximaram muito e, mesmo com as implicâncias de sempre, ambos serviram de apoio um para o outro. No dia em que o resultado saiu, os supostos irmãos tiveram uma longa conversa. Confiavam um no outro e se sentiam seguros para revelar pensamentos antigos:

— Sabe algo engraçado? — falou Esteban, quebrando o silêncio na sala de estudos do colégio, local em que esperavam a chegada de Marcelo Colucci com o envelope.

— Hmmm, deixa eu pensar... o seu cabelo quando você passa gel demais, aquele seu short xadrez ou esse tênis surrado que você tá usando . Acertei? — provocou Luka

— Não! — Estéban revirou os olhos — Era um pergunta retórica. É que... — estava envergonhado, então fez uma pausa

— O que? Fala — pressionou Luka

— Quando eu descobri que nós somos irmãos achei estranho porque... — ele olhou para Luka, que o escutava com atenção — eu era meio a fim de você. Tipo... que loucura, né? — riu, nervoso

— Não! — Luka respondeu levemente impressionado, ao mesmo tempo em que gargalhava — Agora tá explicado a obsessão que você tinha por mim.

— Calma aí, não era por isso, era pela minha mãe e... ah, é complicado.

— Claro, claro. — Luka  ironizou —  Olha, caipira, eu não julgo você. Eu também seria obcecado por mim. Mas eu te confesso que talvez tivesse sido interessante um romance entre classes sociais tão diferentes — finalizou, com um sorriso sarcástico.

Os dois foram interrompidos por Marcelo, o homem que poderia ser pai dos dois, com um envelope aberto em mãos e uma expressão facial que não demonstrava nada. "Eu disse que você não era meu filho, garoto. Espero que espalhe essa notícia assim como você espalhou que eu era seu pai." foi o que, rudemente, saiu da boca de Colucci naquele dia.

Pode-se imaginar o clima tenso que se instalou naquela sala. Não só pela notícia inesperada, mas também porque Esteban revelara ter algum interesse em Luka, apenas por achar que eram irmãos e que aquilo não importava mais.

Os dias que se seguiram foram confusos. Por trás de toda a arrogância de Luka, existia um garoto apreensivo e compassivo com o "quase irmão". Queria estar perto dele, ajudar da maneira que fosse e, principalmente, terminar a conversa que Esteban começou. Já Estéban, precisava lidar com as reviravoltas em sua vida, ao mesmo tempo em que tentava não surtar com o fato de praticamente ter se declarado para o seu colega de quarto... e de banda. Talvez isso pareça dramático, aquilo não tinha sido bem uma declaração, mas ainda assim virou um problema para o garoto.

É verdade que esse impasse só poderia ser resolvido de duas formas: com uma conversa, a coisa mais madura a se fazer, ou com uma proposta, a opção mais passional e arriscada. Apesar de ser um dos integrantes mais contidos da banda, Estéban ainda era um "rebelde" e deixou seu coração falar, quando em uma noite após um ensaio, onde estavam só ele e Luka, lançou olhares maliciosos e investidas nada discretas. O resultado disso foi uma longa noite de pegação entre os dois.

O que eles não imaginavam era que esse "pseudo relacionamento" teria uma pausa. A mãe de Esteban havia desaparecido. Não sabiam o que tinha acontecido. Por isso, Estéban passou semanas longe da escola, em busca de sua mãe ou pelo menos tentando achar uma resposta.

Mas ali estava ele, de volta ao Elite Way e bem de frente para a pessoa que ele considerava ser a maior surpresa de sua vida. Ele sentiu o carinho de Luka ao ser recepcionado com tanta emoção, mas ainda não sabia o que aquela relação era.

— Eu tô tão emocionado com a sua volta que eu poderia tranquilamente matar aula pra ficar aqui com você. — disse Luka, segurando a mão de Estéban. Se sentia diferente, pois nunca em sua vida demonstrou tanto afeto por alguém. Era diferente com ele.

— Não precisa... a gente pode conversar depois da aula — Estéban afastou a mão rapidamente — Aliás, a gente precisa muito conversar — falou, sério.

Ouviram passos rápidos de salto alto no corredor. Era Jana. Ela entrou no quarto e pulou no pescoço de Estéban. Estava muito animada em vê-lo. Luka achou que era uma felicidade exagerada, maior do que seria considerado aceitável para ex-namorados. Mas o pior ainda viria. Luka franziu a testa ao ver Jana dando um selinho em Esteban. "É... nós realmente precisamos muito conversar", pensou.

Entrelaçados (Luka & Estéban)Onde histórias criam vida. Descubra agora