Parte I

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Semântica.

Choi Yeonjun precisou vasculhar um dicionário que lhe expusesse o conceito: Na linguística, "um estudo sincrônico ou diacrônico da significação como parte dos sistemas das línguas naturais", ou, num sistema linguístico, "o componente do sentido das palavras e da interpretação das sentenças e dos enunciados".

Em horas como esta sentia-se iletrado, mal acreditava que aquilo estava em coreano. Dane-se a semântica!

Quando questionavam sua matéria predileta, não havia imediatismo, uma resposta pronta; sempre ponderava. Tinha boa disposição para os esportes no geral, e um talento particular para basquete. Gostava de educação física só porque não lhe exigia nada além de habilidades inatas.

Números passaram a confundi-lo após a adição do alfabeto — eles nunca deviam tê-los misturado, Yeonjun era a favor desse tipo de segregação. Breaking Bad lhe ensinou tudo o que precisava saber sobre química. Quanto à física, bastava lembrar que uma maçã descobrira a gravidade.

A geografia lhe parecia muito concreta, já a filosofia, abstrata demais. História era apenas história. E só possuía interesse num único corpo humano, ou parcialmente humano, mas não de forma acadêmica. Contanto que encontrasse o caminho até aquela boca de lábios finos e bem delineados, era indiferente aos demais órgãos ou seu funcionamento.

Qual a sua matéria preferida? — em suma, não sabia responder à essa pergunta. Todavia, caso perguntassem o oposto, a resposta estava na ponta da língua.

Nunca tivera afinidade por linguagens. Recusava-se a tombar perante o colonialismo estado-unidense e era uma negação em idiomas românicos, contudo, seu pior pesadelo era a língua materna.

Em constante pé de guerra com sua professora de coreano e as infindáveis regras da escrita, aos dezoito anos, Choi Yeonjun era ativista da simplicidade gramatical. Possuía a seguinte opinião: Todo aluno que demonstrasse capacidade de comunicação satisfatória devia garantir nota azul ao fim do trimestre. Afinal, não é a compreensão da mensagem o principal objetivo da linguagem?

De que servia especificar a morfologia de uma palavra no dia a dia? Ou a sintaxe de uma frase? A flexibilização correta de um verbo? Termos acessórios que não fossem uma bolsa da Prada? Determinar o agente da passiva senão numa relação sexual? A coordenação e subordinação fora do cenário BDSM?

Certamente ninguém além de Yoda utilizava hipérbato, e qualquer aluno do Ensino Médio era mais inteligível que o mestre Jedi — o treinamento de Luke Skywalker reduziria à metade do tempo caso Yoda fosse retilíneo em seus ensinamentos.

Dane-se a semântica! Nada disso surtiria alteração prática em sua vida pós-formatura, e ele poderia viver conforme as próprias convicções linguísticas. Uma era regida de paz e liberdade para os alunos do Centro Educacional Naeil.

— Guarde suas conspirações para si mesmo hoje, Yeonjun. Ou a sra. Lee vai escutá-lo e colocá-lo na detenção novamente — disse Soobin, na voz tipicamente impassível.

Yeonjun enfitou seus olhos castanho-avermelhados, esfumaçados por olheiras claras, feito uma sombra contínua na pele branquíssima.

Estralou a língua.

Choi Soobin era a antítese da gramática coloquial, sempre empregando o coreano perfeito em suas orações, mesmo numa prosa amigável. Soava mecânico, como um dicionário ambulante. O equivalente orgânico do C-3PO, embora fosse mais antigo que o robô.

— Não são conspirações, a anarquia linguística é o próximo passo para a evolução humana! Mas não espero que 'cê me entenda, cresceu ouvindo coreano da Dinastia Joseon, ou sei lá.

Uma Vírgula Faz Toda Diferença • YeonBinOnde histórias criam vida. Descubra agora