A noite estava linda, perfeita para um sábado à noite. Seria o dia ideal para uma comemoração, caso Samuel tivesse conseguido o emprego que se encaixava perfeitamente em seu perfil. Mas tudo o que ele recebeu foi um grande Não. Mais um para a sua coleção.
As pessoas não queriam empregar um ex-detento, mesmo que ele já tivesse cumprido a sua pena, e a acusação direcionada a ele tivesse sido por furtar uma loja de conveniências, em uma tentativa desesperada de saciar a sua fome e, principalmente, a fome dos seus irmãos mais novos.
Ele não queria justificar seus erros do passado, de forma alguma. Sabia que fez algo que não devia, e pagou pelo que fez. Ele só não queria que aquele erro o afetasse por toda a sua vida.
Samuel se sentia o responsável pela família, após a morte da mãe. A sua vó cuidava deles muito bem, mas ele tinha plena consciência de que uma mulher com idade já avançada, tem as suas limitações.
O jovem rapaz se sentia bastante culpado por não ter conseguido dar conta dos seus irmãos, muito menos livrá-los das garras do pai, que se entupia de bebidas alcoólicas. A sua intenção era tomar conta de tudo sozinho, mas ele sentia como se tivesse fracassado. E aquele pensamento continuava o perseguindo.
Pelo menos o irmão já estava dando um rumo para a sua vida, mas a irmã, uma criança que apesar da pouca idade, já viveu tantas coisas, ele temia o futuro que a garotinha poderia ter.
Completamente desolado, ele olhava com uma enorme amargura corroendo seu peito, famílias alegres, casais apaixonados, amigos sorrindo e brincando. Em pensar que poderia ser ele comemorando, junto com a sua família.
Samuel decidiu que não era o certo passar tanto tempo ali, se lamentando internamente. Ele iria para casa, e no dia seguinte, procuraria mais vagas de emprego disponíveis. Uma hora ele tinha que conseguir. Mesmo que Santa Esperança fosse uma cidade pequena, onde todos conhecem o seu passado, ele carregava um quase escasso otimismo dentro de si, de que iria conseguir um trabalho.
Ele iria para casa, descansar, após mais um dia exaustivo. Ou pelo menos ele pensou que iria conseguir chegar inteiro em casa, até ser atingido por um carro.
Quer dizer, quase atingido. Por sorte o veículo parou antes que pudesse encostar nele, o que não evitou a bela de uma queda que Samuel tomou. Ele soltou um gemido e segurou a perna direita, que tinha sofrido o impacto da queda. O carro não estava em alta velocidade e um estrago maior não foi feito em seu membro inferior. Seria uma lástima, além de desempregado, sem condições financeiras, ainda estar debilitado de uma perna.
— Ai, minha nossa, me desculpe. — Uma jovem saiu do carro, completamente aflita. Os olhos castanhos da moça estavam quase saltitando da órbita, quando ela se abaixou para tentar socorrer o rapaz que ela tinha acabado de atropelar. — Você está bem?
Ele revirou os olhos com impaciência. Como se já não bastasse o péssimo dia que estava tendo, ele ainda acabara de ser atropelado.
— Uma maluca avançou o sinal vermelho e quase me deixou sem uma perna. — Ele tentava controlar o seu tom de voz, para não se alterar com aquela moça que estava visivelmente abalada. Mas era inútil. Samuel estava com muita raiva. — Você acha mesmo que eu estou bem?
Ele teve a certeza de que havia sido grosso demais, após notar o olhar cabisbaixo da moça. Ela enxugou com a mão, uma lágrima solitária que escorreu pela sua bochecha.
— Desculpa mesmo, eu sou... eu sou... — Samuel viu o momento exato em que os lábios da moça começaram a tremer.
Ela não iria chorar, iria? Ele pensou. Era só o que faltava.
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Tudo Para Você
Romance🎖 Eleita uma das melhores histórias de 2022 pelos Embaixadores da Língua Portuguesa. Após se redimir de alguns erros do passado, tudo o que Samuel deseja é seguir sua vida, sem ser visto como um marginal pelos moradores de Santa Esperança. Virgín...