Capítulo 11 - Sangue, Suor e Desespero

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Os garotos 2, 15 e 20 ainda se mantinham na arena. Também, depois de serem arrastados ao centro do coliseu por monstros, qualquer um faria o mesmo. Inclusive se suas calças estivessem molhadas.

As trombetas então ressoaram, rugindo o início da luta. O rival 15, de cabelos raspados, mancava; o duro baque de ser atirado contra o solo por um Guardião — soldado do monstro-mor. Já as bestas, persistiam em círculo, ao redor dos miseráveis. Só de pensar que estaria na mesma posição, meu corpo sacudia. Eu tentava me manter firme, o máximo que podia, mas a carne é fraca.

O desespero para sair dali falava mais alto, e assim, os três trocavam socos e chutes exasperadamente. A quantia em jogo dava um empurrãozinho a mais, porém, esse dinheiro seria meu no final das contas. Eu contava com isso, eu precisava. Passar era meu objetivo; não queria ficar ao relento. Sangue espirrou violentamente pela areia e grãos saltaram no ar de forma abrupta.

Um murro potente alcançou a face desprotegida do 15, e assim, seu corpo tombou, zonzo no chão. Vermelho brotava de seu nariz, ferido pela agressividade do número 2. O garoto pelejava para se pôr de pé, ainda bambeando, não tinha desistido. Mas subitamente, seu corpo se desligou, estatelando-se de vez contravontade. O barulho tomou conta da arena; um misto de palmas e berros. Os sanguessugas não faziam questão de se controlar, a felicidade era aparente. Mesmo sobre tantas camadas dos mais finos tecidos, nunca esconderiam sua natureza, puramente monstruosa.

As bandeiras das casas vampíricas se estendiam ao alto, dominando, mais do que nunca, o local completamente; vermelho, preto, azul esverdeado, azul escuro, verde jade, amarelo-bege e roxo. A bandeira vermelha dos Țepeș era impossível de ser ignorada. O dragão estendia as garras para o alto, cuspindo sua língua feroz, emoldurado por uma íris vampiresca; eles estavam de olho.

Senti-me pequena, como se não valesse de nada. Apenas um pedaço de carne, um animal de estimação que pudesse ser jogado fora. Tentei manter os sentimentos ruins longe de mim, já bastava aquele medo, suficiente para me fazer mijar nas calças. Foi aí que encarei o bico de meus tênis usados, completamente enojada da cena. A ansiedade e medo me fazia querer vomitar.

Um duelo — ou deveria dizer, trielo — era um caos. Mas era isso que os monstrengos insuportáveis queriam: ver desespero, sangue e suor em troca de uma quantia "insignificante"; de uns míseros trocados. Mas eu necessitava daquele dinheiro; a humilhação doeria, mas valeria a pena. Pobres não tinham o luxo de escolher, muito menos de manter o orgulho acima das decisões.

Eu sabia que se mostrasse fraqueza, as bestas se divertiriam ainda mais. Porém, é mais fácil falar do que fazer. Eu tentava não desviar os olhos da cena, manter um rosto plácido e muito menos desabar em choro no processo. Mas eram muitas coisas para se focar, e eu não conseguia; jamais fui uma insensível. O cheiro fétido de sangue no ar me tonteava. Cerrei os punhos.

Ouvi mais uma pancada na areia e berros brutais, comemorando outro golpe bem sucedido. Eu estava prestes a desmoronar, reprimindo o choro o máximo que podia... até que uma voz familiar tomou conta da arena.

— Participante 20 é vencedor da primeira rodada masculina!

— Apresentem-se números 6 e 7 — gritou o mesmo homem.

Meu corpo ficou estático, e assim, gelei de completo medo e pavor. Eu não sabia o que fazer; não que isso fosse muito difícil. Aterrorizada e sem reação, o repulsivo Guardião me empurrou para o centro, sem se importar com meu equilíbrio. Caí por terra, sustentada apenas pelos braços e joelhos.

Sem mais nem menos, a aberração mascarada me encurralou dentro do círculo. O vermelho então ficou em evidência; seja pelo sangue que escorria na areia ou as capas dos bestiais. Era apenas eu e a número 6.

Jogada na areia, tentei me erguer, bambeando. Minhas mãos estavam fracas, e minha cabeça, doía de tanto segurar choro. Ouvi as trombetas ressoarem ao longe, e de súbito, relembrei de meu dever. Eu estava ali por um motivo; pela família e dinheiro.

Eu não era tão inútil assim. Certo... eu não era uma exímia costureira, como tanto queriam que eu fosse, mas lutaria da minha maneira. Medo não nos daria dinheiro, e eu iria arriscar. Agarrei a areia e me forcei a levantar, apesar da fraqueza e medo constante. Vacilante, cerrei os punhos a frente do rosto; em guarda, como o pai de Alis — meu treinador — ensinara. Assim como qualquer pessoa em choque, esperei que a oponente viesse até mim.

A garota andou rápido, não perdendo tempo; desesperada. Socou logo meu rosto, e eu, desviei em pêndulo para lhe dar outro. Dobrei a perna, com as mãos ainda altas, e atravessei por baixo do ataque, esmurrando seu queixo durante a passada. Atenta, a oponente jogou a face para trás, e assim, o ataque passou de raspão na ponta de seu nariz.

A adrenalina proporcionada pela luta me fazia esquecer do medo, das preocupações; das consequências de uma briga. Assim, aproveitei um dos únicos momentos que minha mente estava em branco, moldada apenas por instintos. Usufrui do balanço de suas pernas para enganchar o tornozelo esquerdo com um pé. Caiu, mas me agarrou junto pelos braços; girando o corpo para que eu tombasse sobre a areia e recebesse todo o impacto.

O movimento acelerado me impediu de agir, e assim, minhas costas golpearam o chão sem dó. Inibi um gemido e desvencilhei meu braço na marra, arranhando se fosse preciso. Segurei então, afobada, os antebraços da concorrente, evitando seus golpes. Rodei o corpo, ainda tentando lhe imobilizar, me mantendo por cima de sua barriga em clara vantagem.

Durante o ato, a número 6 conseguiu desatar uma mão, e no susto, elevei o punho livre sobre a face. Optou por socar minha parte desprotegida: as costelas, e assim, urrei mais uma vez de dor. Golpeei sua têmpora como reflexo; felizmente, o desmaio foi instantâneo.

— Participante 7, vencedora da primeira rodada feminina! — a voz tomou conta da arena, mais uma vez.

Uma série de berros e gritos ecoaram pela extensa arena. Monstros sugadores de sangue batiam palmas e rugiam, eufóricos pela violência. O torpor da briga sumiu, sem deixar restos. Pousei as mãos na testa, descendo os dedos pelos cabelos. Aos poucos, minha ficha foi caindo, notando a ação horrenda que cometi.

"Não vou ter que fazer isso de novo, né?"; não pude evitar de ponderar, com a mente em frangalhos. Até que ponto o dinheiro valeria à pena?

Eu não pretendia descobrir.

Distopia RomenaOnde histórias criam vida. Descubra agora