3 - Muros

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 Muros

A dor lancinante me cegava, era tanta dor que não sobrava espaço nem sequer para gritar. Senti um toque macio no meu ombro e tive que parar para sorrir, King estava com as patas dianteiras apoiadas na cama e uma delas sobre o meu ombro, com um olhar de pura simpatia, por um segundo eu pude esquecer a dor e começar a pensar praticamente, antes eu tinha que tomar um banho e avaliar os estragos, caso necessário ir a um hospital (o que seria uma experiência maravilhosa e educativa, visto a explicação que teria que dar), e por fim procurar o invasor, o homem alto, lindo e dotado como um cavalo.

E confuso, ele parecia confuso.

Ou tudo isso não passou de um sonho muito real e meu corpo teve alguma reação ao sonho. Olhei para King, o cachorro com certeza teria me alarmado caso alguém entrasse na casa, e pela manhã ele estava na mesma posição da noite anterior, o quarto aparentemente continuava na mesma condição da noite anterior. Uma pontada me acordou para a realidade e reuni forças em minhas pernas para ir até o banheiro, meu corpo todo doía, eu estava cheio de marcas, se tudo foi mesmo um sonho eu devo ter me debatido muito, ou alguém entrou em minha casa e me espancou e minha mente cansada imaginou outra coisa, seria Pablo capaz de fazer isso? Com certeza não.

Quando sai do banheiro escutei a porta da sala se abrir com força, Tom entrou como um furacão, latindo ordens ao que parecia um batalhão junto com ele, ordenando que removessem isso ou aquilo.

Eu ainda estava apoiado no portal do banheiro quando ele irrompeu pelo quarto.

"Até que enfim você se livrou daquele retardado, vou tirar as coisas dele daqui agora mesmo e colocar em um depósito, depois ele pode ir lá buscar."

Eu respirei fundo e me preparei para bater cabeça com meu irmão, autoritário por natureza, talvez por causa do tempo que permaneceu no exercito, onde atingiu em curtíssimo tempo altas patentes, mas se retirou para assumir os negócios da família. Seu pai era dono de uma rede de hipermercados e com a morte do mesmo era inevitável que Tom assumisse o posto, mas o feitio do exercito nunca o deixou, e eu sabia que ninguém me amava mais nesse mundo do que meu irmão Tom, aos trinta e um anos ele era um convicto solteirão, cobiçado por todas as mulheres da cidade, rico, lindo e pegador, uma combinação fatal. Tom tinha cerca de um metro e oitenta e cinco, músculos não feitos para serem grandes, mas para serem fortes e altivos, sua pele tinha um tom saudável, parecia que ele havia acabado de sair do da praia todo santo dia, mesmo sabendo que ele não era fã do sol, como seus óculos de aviador denunciavam. Seus cabelos permaneciam sempre rentes no corte militar tradicional, e seus passos eram determinados e seguros, era como se ele estivesse marchando sempre.

"E como você sabe o que é meu e o que não é?"

"Não seja idiota, claro que eu sei tudo o que você tem." E certamente ele sabia, visto que já estava no guarda roupas separando minhas roupas das que Pablo havia deixado, que eram jogados sem cerimonia nenhuma no chão. Eu olhei para cama e vi que a mancha de sangue era visível, eu havia constatado que o sangramento já havia parado no chuveiro e não havia nada além de um corte, a dor já desaparecia, lentamente, mas melhorava, mas se Tom visse aquilo se alarmaria e eu queria paz nesse sábado.

"E quem te avisou?" perguntei caminhando em direção a cozinha, Tom me seguiu como esperado.

"Hey, você ai, ensaque aqueles trapos no chão do quarto, agora!"

"A casa estava lotada de homens carregando os moveis que Pablo havia comprado ao longo dos anos, nada que fosse me fazer falta.

"Não se preocupe, a tarde os entregadores vem entregar os substitutos, presente pessoal meu."

"Quem te avisou, Tom?" insisti na pergunta, registrei que teria que anotar isso no meu caderno "Coisas Que Devo a Tom." Não queria dever nada a ninguém, mesmo de alguém que me amava tanto quanto meu meio irmão.

Evan e o Rei- 1° LivroOnde histórias criam vida. Descubra agora