Primeiros Dias

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Isso eu me lembro muito bem!

Fiz tudo que me acusaram, fiz porque gostava. Gostava de sentir a vida das pessoas sendo extirpada, vendo o olhar de desespero, de confusão. Me considerava um Deus, um ser poderoso, acima dessas pessoas de mentira, que criam um avatar para andar na rua, para se comportar. Eu ceifava suas vidas, permitia que vivessem suas vidinhas falsas enquanto quisesse.

Lembro da minha primeira vítima. Será que posso chamar de vítima? Foi sem querer, um golpe do destino, uma coincidência talvez! Era minha cachorrinha, uma vira-lata comum, e minha família adorava ela, pois era muito treinada e engraçada. Naquele dia, ela estava latindo muito, e então minha mãe pediu para eu passear com ela.

Coloquei sua coleira e saí pelo portão. Passeamos por uns 10 minutos até um parque no centro de nossa cidade. Como era um parque grande, soltei ela para que ela brincasse a vontade e corresse um pouco. Sentei embaixo de uma árvore e fiquei ali descansando, sabia que ela não fugiria. Então comecei a notar as pessoas que estavam próximas, passeando pelo parque, com seus sorrisos falsos, suas atitudes ensaiadas, um teatro que naquela época me aborrecia, mas ao mesmo tempo chamava minha atenção.

Acho que me desliguei completamente, pois quando ouvi ganidos, levantei sobressaltado. Sabia que era a minha cachorrinha, procurei ela pelo parque e a encontrei presa por sua coleira numa cerca, um pouco longe da pista de caminhada.

Percebi que ela tentava se soltar, mas seu pescoço estava trancado e quanto mais se mexia, mais ela se trancava, e sua dor aumentava, pois seus ganidos ficavam cada vez mais agudos. Olhei essa cena e não tive nenhuma reação, não quis salvá-la, só queria ver ela, ver ela sofrer, até onde ela aguentaria.

Passados 30 minutos, vi que ela não aguentava mais, me aproximei dela, e percebi que ela abanou fracamente seu rabinho, provavelmente pensando que eu a salvaria. Porém apertei seu pescocinho e acabei com o sofrimento dela. Observei a vida dela sumindo, e uma sensação ótima percorreu meu corpo. Joguei ela num matagal e voltei pra casa.

Minha mãe me perguntou onde estava a cadelinha, e por um instante, lembrei do ocorrido e fiquei com vergonha, comecei a chorar imediatamente. Mas ao cair a primeira lágrima, lembrei do poder, da sensação em minha alma, de que eu tinha feito a coisa certa. Minha mãe me abraçou, pois pensou que eu estava chorando por causa do sumiço da cachorrinha. Mas com o rosto colado em seu corpo, o mais fraco dos sorrisos se formou.

Ajudei a procurar ela por uns dois dias, mas eu sabia que ela nunca iria voltar, da mesma forma que eu percebi o qual fácil era simular meus sentimentos. Lágrimas corriam em meu rosto, mas eu não sentia nada.

E o mais engraçado. Eu consigo lembrar disso claramente, consigo lembrar das roupas das pessoas que caminhavam no parque, que fazia um dia de calor, e que a tarde uma chuva rápida caiu. Mas de nenhuma forma eu consigo me lembrar do nome da cadela.

- É um absurdo! Meritíssimo... - Fecho os olhos e consigo imaginar com clareza a cena que deve estar se passando ao meu redor. Meu advogado, o Dr. Carlos Mendonça e Mendes, está gritando, fingindo olhar o juri, mas sei que ele está procurando a câmera de TV mais próxima.

Minhas mãos apertam a mesa com força, mas é graças a essas algemas, não é o pescoço dele que estou apertando. Gostaria de saber o que ele ofereceria em troca da sua vidinha fútil. Provavelmente venderia até a mãe para continuar vivendo. Queria ver sua cara de surpresa quando eu fingisse que dava uma chance a ele, que realmente deixaria sair ele ileso. E quando ele tivesse agradecendo ao Deus que ele acreditava, eu acabaria com a vida dele, do jeito que eu gosto, removendo mais um fantoche da face da Terra. Um sorriso se forma em meu rosto, e eu não faço o mínimo esforço para escondê-lo.

Mas eu sei bem onde eu fui me meter.

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⏰ Última atualização: Jun 15, 2015 ⏰

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