Aos que corroem a minha alma.

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A minha escolha foi escolhida a um tempo atrás. Mas quem falou? Quem escolheu e quem disse sim? Eu não disse.

Quem me prende aqui? A natureza? A linha? A seleção natural? Onde eu acho as opções, as escolhas? As minhas e as tomadas de mim.

Será que não está claro para ele que o ar que ele respira é dividido comigo? Que as poucas comidas que ele come, eu como junto? Como um parasita se alimentando das sobras, dos restos e das merdas. Vivendo preso sem ver o sol por mais de minutos num momento cego de nascimento. Que destino me foi traçado por essas finas linhas de costura? Qual a figura final que a vida tanto quer bordar em mim?

Não posso viver nessa escuridão, me enrolando num enrolado de carne oca comprida que já nem sei se é minha continuidade ou saída. Quanto mais cresço, mais me sufoco. Mais me armadilho.

A fraqueza me fortalece, mas me beira a loucura.

Eu mereço mais que essa cadeia que o destino me aprisionou. Mereço? Sou ladrão do que? Fui jogado nesse fogo, queimo por minha espécie e seu nível trófico. Por minha carne ser fácil. Por ser dependente, como as orquídeas são do sol, como eu sou da carne.

Queimo ao fogo, mas também o desejo ardentemente. Desejo a liberdade que ele me promete, a liberdade dessa caverna escura e vivida, que me mantem viva com um tambor sempre tocando no encalço do ouvido.

Pois desejo que pare.

Obrigo que pare.

Me enrolo ao meu redor, lhe sufoco, me sufoco.

E assim percebo que ele sou eu. que eu desejo o exterior, o pleno. O sol ardente que me queima e desidrata, me destila e me faz morrer agonizado no chão duro e arenoso, ele também deseja. Ele também vê. Mas vê vivido, sem mim.

Mate-me ou aceite-me. Eu romantizo a prisão com todas as suas curvas, com meus desejos e vitimismos, mesmo sabendo que sou livre nela. A liberdade é a vida que tenho. A prisão é a tentação de fugir dela a cada sangue saído das artérias e dos tambores que cantam na minha cabeça.

A liberdade é a morte que me cerca com seus remédios de olhos brancos anti-eu-. Esses silenciosos que absorvo a procura da vida que anseio. As ervas daninhas queimam. Viro fogo por dentro e navego negando fugir da prisão que agora me expulsa. E dói. Dói tanto que um sol parece crescer e tentar me explodir. E eu não consigo gritar, nem me mexer, porque, aos poucos, tudo parece se fechar em mim. Tudo ao meu redor que sempre foi tão meu, tão eu, parece querer me fazer minúsculo. E ninguém me escuta gritar, nem esbarrar nas paredes, nem tentar rasgar a pele que queima áspera e desconhecida de mim. Quando foi que eu sumi? O que tu fez pra me deixar assim? O que eu fiz pra me deixar assim? Pois me arrependo mesmo sem saber.

Sem saber o momento que foi dito sim por minha boca, que jurava conhecer, mas agora não parece mais minha.

Mas, no fim, eu decidi ou foi ele? Eu, ao menos aceitei?

Ele, ao menos, existe?

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⏰ Última atualização: Sep 10, 2022 ⏰

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