"Meu amor..."

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Talvez o que eu vá contar me faça chorar, mas alguém me contou que...

"Amar, é tão bom quanto morrer, se abandona todos os pensamentos e as lógicas, deixa-se dominar pela inumana sensação de paz. Como eu o amei, amei até que meu ar fosse arrancado com brutalidade de meu coração, que minhas entranhas se contorcessem em desespero, que meus olhos se revirassem em um êxtase que não era prazer, mas sim intensa dor de paixão.

Não tenho medo de dizer meu nome, pois no futuro, todos o saberão quem sou. Não pois queira gabar-me por me tornar uma grande assassina, não! Apenas desejo que meu amado conte a todos as loucuras de amor que fiz. Bom, sou Carrie, tipo Carrie a estranha, mas com um namorado e um coração ao invés de superpoderes. Já faz 3 anos que estamos juntos, o conheci caminhando pelo meu bairro, como em romances clichê, ele era meu, eu era dele. Tudo mudou quando eu morri, ele dizia que eu era gelada, inconsequente e mórbida, o nosso clímax era lento, eu nunca chegava lá, pois me perdia tentando esquentar meu corpo gélido e não o fazer se tremer ao me tocar.

Ele me recusava, dizia que eu continuava tão fria, eu não entendia, dês de que eu morri, não lhe causo mais desejo?

Antes e até depois de minha morte, ele não dormia em minha casa, dizia que era escura e apertada. Ficava em um lugar estranho da cidade, todos visitavam seus parentes frequentemente, alguns até ficavam por lá e moravam. Eu moro aqui dês de sempre, é aconchegante. Mesmo depois de morrer fiquei nesta casa, me adaptei a falta de luz todas as noites, afinal é um bairro pobre, minha cama também era escassa, mas eu o amava, e já bastava para mim dormir ao seu lado mesmo que desconfortável.

O jeito que eu morri foi tão estranho, mas ele estava lá comigo, pelo menos assim para me confortar. Era um dia lindo, ele vinha para minha casa passar o dia todo e ir embora a noite como de costume. Chegou apaixonado, me desejando perdidamente, e sem nem me beijar ou dizer que me ama, jogou-me aos lençóis e nos amamos. Após, eu adormeci, mas ele não. Vagou para fora da cama e acabou por descobrir que meu nome completo era tão chato, sempre preferi meu apelido, então imaginei que ele também iria preferir Carrie, ao invés de Caroline Hills. Entretanto, ele encontrou a inscrição de meu nome completo da porta do quarto, achei tão atencioso o proprietário colocá-lo ali. Nunca entendi como ele sabia, talvez meus pais o tenham dito antes de me abandonar quando bebê aos cuidados e umas babás incompetentes. Elas só limpavam a casa e me vigiavam, por sorte sempre fui autossuficiente e não sentia fome, estava muito ocupada me cuidando. Acordei após o bom sono de prazer normalmente, e ele fingindo estar horrorizado, lançou-me um tapa, depois disse que eu havia morrido enquanto dormia, e de forma misteriosa, continuava ali. Estava tudo como sempre, como se fosse apenas um sonho. Nesse dia voltamos a nos amar a cada hora, até chegar à noite, assim ele partiu.

No dia seguinte, Ale, voltou para me ver, mas dessa vez se despedir. Não falou nada romântico ou amoroso, não disse me amar, apenas me entregou um folheto estranho, parecia um jornal velho, fiquei chocada e joguei o papel velho na cama, desferindo um tapa na face do homem, como ele poderia me usar todos esses anos dizendo que me "amava" e agora não me amar?

Ele apenas saiu sem dizer nada, e eu sucumbi. Depois de horas chorando sem parar, consegui respirar melhor, o que hoje sei que é um ironia bem cruel na verdade. Entendi que ele havia terminado comigo pois eu era muito gelada, mas sempre fui tão doce e carinhosa, só queria seu amor, não fui fria.

Aquele papel parecia gritar meu nome, e não tendo mais escolhas contra todo o desejo que eu tinha daquilo ser uma carta de amor, comecei a ler:

'Jornal informa: bebê, filha do prefeito, morre logo ao nascer, seus pais, chocados com a notícia, se recusam a fazer algum tipo de velório ou presenciar a morte sem vida de sua filha, parecem ter enlouquecido, preferindo então entregar nas mãos de um coveiro qualquer do cemitério da cidade, para que levasse a garota a ser enterrada em qualquer lugar.'

Aquela notícia me deixou tão chocada, quem poderia fazer isso com uma pobre criança? Minha atenção fora pregada á carta que estava anexada. Fiquei em êxtase de alegria, jurando que seria de Alexander, mas não, meu brilho de alegria abandonou-me novamente, acendido apenas por ler na primeira linha o nome de meu amado, talvez fosse algo sobre ele.

'Olá senhor Alexander, serei breve, sei que não irá ler essa carta...Nunca se importou com ela.'

E bom, de fato não leu, guardou todos esses anos, até que tivesse coragem de abrir a carta.

'Sua filha é uma graça, mesmo morta, não serei capaz de enterrá-la juntos aos outros, deixei-a em um caixão de vidro, grande para adultos mesmo. Me simpatizei por ela, paguei todos os gastos, então lhe dando o nome de Caroline. Quando ler esta carta, venha visitá-la, pode achar ela pelo seu próprio sobrenome "Hills", me certifiquei que neste cemitério não há mais nenhuma garotinha em um trono de vidro, enclausurada com este nome, se você ler, saberá onde encontrá-la.'

Endereçada a Alexander Hills. Foi esta parte que me derrubou, todos esses anos, eu amava um homem, eu me deitava com ele, era dele, e ele era meu, meu pai. Talvez fosse por isso que o mundo dos mortos não me aceitavam, por isso o cheiro ruim, a solidão daquele lugar, os parentes todos tristes visitando seus entes queridos, mortos, todos. Por isso ele partiu, houvera de ter visto meu nome na porta do quarto, na porta de meu enclausuro de vidro, se assustando, pois, além de cometer necrofilia, cometia com sua própria querida filha, e sem mais nem menos, a abandonou pela segunda vez. Eu sabia que minha casa era apertada, era apenas a cama, apenas o caixão, mas como os outros a minha volta também assim eram, nunca pensei que houvesse outra forma de viver. Até Ale, meu pai e amante, me contar que haviam outros lugares enormes para se viver, onde ele vivia, me ensinar tudo que sei e de onde vem os bebês, e que agora me faz ver que não sou apenas parte daquele bairro de alguns eram pobres, como ele chamava nós que moramos aqui. Nestes caixões, eu não sabia o que eram caixões, então ele me contava histórias, descrevendo estes "caixões para os mortos", eu não via semelhança com minha "casa", e quando eu via, ele dava risada como se eu fosse idiota, e então falava que eram diferentes, só. Me fez aceitar e acreditar que todas essas pessoas mortas, eram apenas pobres, por isso moram em algo tão apertado. E eu apenas querendo o beijar, mudava de assunto e o amava. Quando tudo se encaixou, desfiz no ar de meus falsos pulmões, eu nunca posso ser amada, pois nunca existi. Quando ele percebeu que se tratava de sua filhinha a qual ele usava, disse-me que eu morri, ironia não? Fez acreditar a morta que tinha morrido...Então partiu deixando-me a dor. Não há como se morrer, se nunca esteve viva. Não fui morta, sou morta..."

Terminei esta história em prantos, amar é tão bom, mas a dor é a parte mais escura do coração dos amantes, que morrem nesta escuridão...

P.s: Esse alguém que me contou, deixou junto uma notícia estranha, contando que o prefeito Hill, recém chegado em minha cidade, havia morrido, assassinado misteriosamente, sendo enterrado vivo em um caixão de vidro. Fiquei assustada, se eu acreditasse em contos que me contam, poderia jurar que Carrie voltou para buscar seu pai e amado. 

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