Caroline era minha melhor amiga.
Não daquele tipinho que vemos por aí, na qual, em duas semanas de aula, a pessoa esquece seu nome e te esquece no Instagram. Não mesmo. Caroline era minha amiga de verdade — quando eu digo "de verdade", é realmente verdade. Éramos do tipo que uma pensa, mas a outra completa; um quebra-cabeças que se qualificava entre inteligência e esperteza, beleza e inteligência.
Ela tinha apenas um ano por diferença, mais velha que eu somente em números; se fossemos irmãs, ninguém poderia acreditar. Tínhamos a mesma altura e cor dos olhos. Não éramos tão parecidas assim nós traços, mas é verdade que eu esperei meu cabelo crescer e o pintei de loiro só para ficarmos mais semelhantes.
Caroline tinha dessa. Ela dizia que poderíamos ser irmãs, e eu dizia: "Já não somos?". E ela sempre rebatia com um atrevido: "Você me entendeu".
E com a nossa partida pro ensino médio, eu meio que entendi mesmo.
Fazíamos tudo juntas, éramos começo, meio e fim uma da outra. Isso não me preocupava nenhum pouco, afinal, tinha minha vida social garantida graças a ela. Não que eu fosse alguém legalmente sociável, mas as pessoas falavam comigo, e o melhor, falavam principalmente pelo fato de Caroline ser minha amiga. Caroline era minha melhor amiga, e todos a achavam legal, descolada e bonita. E enquanto ela me visse como igual, eu estava salva.
No geral, funcionava assim, se Caroline era convidada para algo, eu encolhia os ombros e desviava os olhos, ignorando o fato de que estava sendo ignorada. Até que escutava um: "Sua amiga pode ir".
Sua amiga. Sem nome.
Isso se tornou comum. Ser apenas "A amiga de Caroline".
O primeiro ano veio e passou. Consegui manter minhas notas altas e chamar a atenção de alguns professores. Eu estudava o máximo de tempo que podia, me concentrando na única coisa que podia ser minha salvação: o vestibular.
Não que eu odiasse minha vida. Morávamos numa cidade comum como metrópole. Meus pais tinham bons empregos e eu só precisava me preocupar em estudar e não me meter em problemas. Caroline morava há apenas algumas casas de mim, na mesma rua, uma vizinhança pacata, comum na medida do possível.
A casa dela era a mais bonita. Os pais a compraram e reformaram usando uma herança deixada por um tal tio, que Caroline insistia em dizer que assombrava os corredores a noite, em busca da herança que ele para sempre zelaria. Ela sempre ria, levando a mão com unhas cor de rosa para cobrir os lábios de gloss. Caroline não conhecia o tio, por isso também inventava muitas histórias sobre ele, algumas tão aterrorizantes que me deixava com um medo descomunal. Ela era uma ótima contadora de histórias. Os pais dela diziam que talvez fosse a vocação dela: livros. Ou reportagem. Mas acho que ela poderia ser muito mais.
Quanto a casa, eles fizeram os melhores investimentos na reconstrução de boa parte da estrutura. Os quartos eram amplos e bem iluminados, as paredes revestidas por cores de um bom gosto sem igual, as janelas tão grandes e bem arejadas. Por dentro, o local mais parecia um sótão — os pais de Caroline não eram bons adeptos da organização —, porém, isso só deixava o lugar mais estranhamente confortável.
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Letícia (conto)
Mystery / ThrillerA falta de Caroline na escola passa a ser mais que um leve desconforto para sua melhor amiga. Interligando isso a uma narradora que não revela seu nome, uma amizade deformada pela inveja e a insegurança, duas garotas distintas e um nome..."Letícia"...