Capítulo 1

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 Com um balançar suave em meu ombro, desperto assustada tentando assimilar onde estou. Percebo que acabei adormecendo no banco da barca.

- Senhora? Já chegamos, precisa desembarcar...  - Diz o rapaz franzino da tripulação meio sem jeito .

- Ah, sim, desculpa...- Murmuro envergonhada, pegando minha mochila e casaco.

Indo  em  direção a saída vejo que provavelmente sou a última passageira a sair. Assim que piso em terra a primeira coisa que procuro é uma lanchonete, ou algo do tipo, porque nem lembro a última vez que comi alguma coisa que não saísse de uma máquina.

 Não importa se são de delegacias, hospitais ou hotéis baratos, todas tem o mesmo sabor de plástico e papelão. Tenho saudades da minha cozinha... Não, não posso pensar nisso agora. Tenho que me manter viva primeiro, depor no julgamento e recuperar a minha vida. Uma coisa de cada vez, tento pensar...

Primeiro passo para a sobrevivência café da manha, segundo passo encontrar a senhora Mila e descobri qual será a casa que o  programa de proteção a testemunha designou para mim. E é claro, achar um trabalho.

 Só de pensar nisso estremeço por dentro, afinal terei que começar tudo do zero, "adeus" anos de dedicação na faculdade e incontáveis horas no programa de residência e "olá" senhorita Amélia Rose Dantas, sim  esse é meu novo nome, acho que dei sorte, é melhor que o nome que meus pais escolheram....

Ao sair do terminal das barcas vejo a pitoresca cidadezinha que me aguarda. Com pescadores lidando  com seus barcos, crianças brincando, pessoas indo para o trabalho, gaivotas  gritando ao longe, esse seria meu novo lar por tempo indefinido...

 Um pouco mais a frente aninhado entre um loja de presentes e um centro imobiliário, estava o  " Jorge bar e restaurante  ". De onde vinha um revigorante cheiro de café, ao entrar vi que todas as mesas estavam cheias e me encaminhei ao balcão. Conforme ia andando pude sentir os olhares das pessoas a minha volta, acho que é padrão em cidades com menos de três mil habitantes.

Quando sentei em um dos banquinhos vagos do balcão deixei minhas coisas no chão e fui ler o cardápio, logo fui saudada por um simpático, e devo acrescentar, bonito garçom.

- Bem vinda ao Jorge bar e restaurante, qual o seu pedido?

- Bom dia, um café completo para uma pessoa. Por favor.

- Saindo querida. - Disse se afastando.

Aproveitei para deixar meu olhar vagar ao redor, e perdida em pensamentos me surpreendi quando uma caneca fumegante de café foi empurrada a minha frente.

- Querida você parece distraída. - Disse o garçom.

- Estou, eu acho. Você chama todas as mulheres de querida?

-  Só as que eu não sei o nome.

- Amélia, muito prazer.  -Disse estendendo minha mão por cima do balcão.

- Bom Amélia, eu sou o Pedro. Está na cidade de passagem?

- Não, vim morar. Por acaso conhece a senhora Mila? Tenho que me encontrar com ela hoje.

- Interessante... E sim, eu conheço. Vai encontrá-la subindo a rua virando a primeira direita, na praça da cidade. 

- Obrigada.

- A qualquer hora linda.

Antes que eu pudesse reagir ao seu elogio ele já tinha sido chamado por outro cliente. Me concentrei em tomar meu café, depois paguei a conta e tentei seguir as instruções do Pedro sem me perder. Quando cheguei na praça e vi muitas senhoras em um grupo de yoga, surpresa era o mínimo, e também frustração afinal qual delas seria?

Analisando tudo resolvi sentar em um dos bancos e esperar, seria muito mal educado da minha parte interromper a aula. E comecei fazer o inventario de tudo que tinha, um par de roupas, documentos novos, barrinhas de cereal e um pouco de dinheiro que saquei da minha conta. E nem tão cedo eu poderia mexer nas minhas contas, usar cartão de credito, ou Deus me livre, fazer uma ligação a minha família. 

Quase fui morta ao presenciar um terrível crime e o meu único alivio era não ter que falar com meus pais, tive que rir, mas pensando bem não tenho muito para quem ligar além dos meus pacientes, ou melhor ex-pacientes. Sempre fui viciada no  meu trabalho e agora estava passando por uma desintoxicação forçada.

A pior coisa que ouvi nos últimos dias foi que não poderiam criar uma nova licença médica para mim. A única coisa na qual eu tinha apego. Vivi e respirei medicina desde meu ensino médio, sempre focada e agora isso.

- Ei! Imagino que você seja a adorável Amélia certo ? Eu sou a Mila, sua senhoria.- Diz uma senhora de idade se aproximando de mim. Com um sorriso gentil no rosto.

-Isso mesmo. Eu fico feliz em encontrar a senhora, estava esperando a aula acabar, mas me distrai.

- Ah, minha jovem não precisa de formalidades, me chame apenas de Mila. Logo iremos ser grande amigas, junte-se a mim, a casa é bem perto daqui como lhe disse por ligação. Uma caminhada rápida de cinco minutos.

- Claro senh....Mila.- Digo sorrindo sem graça e a seguindo pelas ruas da cidade.

Logo chegamos a casa estilo vitoriano com lindas rosas no jardim da frente. Fico admirada com o lugar de cara.

- Entre, o loft é nos fundos, vai indo, vou entrar e pegar seu conjunto de chaves. 

Sigo a instrução e vou andando pela lateral da casa ate chegar no loft dos fundos, que basicamente é um garagem reaproveitada. Embora seja modesto, para dizer o mínimo, é  o que a policia vai pagar. 

Tento a porta e ela abre, vejo que é limpo e muito fofo. Com uma cozinha pequena, uma sala e o banheiro, logo acima vejo uma escada que imagino levar para cama. Ao menos era o que dizia na descrição do lugar, mas a melhor parte é que esta mobilhado.

Esse será meu lar, meu tempo em espera até tudo se resolver em casa. 


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⏰ Última atualização: Apr 17, 2022 ⏰

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A TRANSFORMAÇÃO PARA AMÉLIAOnde histórias criam vida. Descubra agora