Capítulo 5

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Mellyane

Meu corpo parecia ter sido atropelado por um caminhão de laranja, tentei abrir os olhos e uma luz forte me atingiu obrigando-me a semicerrá-los, depois de um tempo consegui enxergar paredes brancas com desenhos de flores, à minha esquerda uma enorme janela mostrava um céu escuro com pequenos flocos de neve caindo. Já à minha direita uma porta, também branca, estava fechada. Mexi a cabeça sentindo a maciez do travesseiro, e agora mais desperta, também pude identificar o roçar de pelos nas pontas dos meus dedos indicando que uma coberta grossa envolvia meu corpo, aquecendo-me.

-Minha filha, como você está se sentindo? - assustei, pois não havia percebido que mais alguém estava no quarto, mas quando reconheci a voz meu coração se acalmou e assim que meu cérebro decodificou as palavras proferidas meus olhos marejaram com o carinho no tom e as palavras escolhidas.

Janete me acolheu há muito tempo como sua filha, me protegeu, me ajudou, se preocupou, com ela pude entender o que é ter alguém que 'está presente para o que der e vier'. Mesmo que tenhamos entrado uma na vida da outra de forma intensa, ela nunca demonstrava seus sentimentos com palavras, eram mais ações e serviços, então sua fala carinhosa e a escolha das palavras apertou meu coração, acho que estamos nos tornando duas velhas carentes.

Antes que eu pudesse responde-la ouvi o som de uma porta se abrindo, meus olhos acompanharam o barulho. Dois homens atravessaram a porta branca, o primeiro usava um óculos de armação fina na cor dourada que escondia seus olhos pretos, os cabelos eram crespos e bem curtos, sua pele negra contrastava com a parede ao seu redor, tornando-se impossível desviar o olhar, aos poucos ele se aproximou da cama, e o andar calmo e sereno tinham uma presença avassaladora. O segundo eu já conhecia, ele trazia em seu rosto uma carranca que o deixava sombrio, nitidamente estava com raiva, será que era por eu ter causado problemas demais?

-Como está se sentindo Mellyane? - a voz grossa e firme me causou um arrepio.

-Onde estamos? - respondi com outra pergunta.

-Estamos no St. Peter's Hospital, você lembra o que aconteceu?

Arregalei os olhos ao ouvir o nome do lugar em que estávamos, olhei rapidamente para Janete procurando uma explicação, mas ela apenas balançou os ombros

-Ele insistiu para que lhe trouxéssemos aqui - foi tudo o que disse.

Olhei para onde o homem de braços cruzados me encarava intensamente, então ele havia pedido para que me trouxessem aqui, isso só pode significar que ele sente alguma culpa pelo meu estado deplorável. Que bom, afinal, se ele tivesse me deixado com o sobretudo eu não estaria doente.

Continuei a encarar o homem, quis que ele visse meu olhar de satisfação por ele se sentir culpado, mas seus olhos não se abalaram. Senti a curiosidade crescer em meu peito, agora no ambiente claro e vendo ele em roupas limpas, meus olhos começaram a pesquisar.

Desci o olhar por aquele corpo grande, comecei estudando o tecido da calça jeans escura que escondiam pernas claramente musculosas, subi o olhar pela cintura e o peitoral bem marcado em uma camiseta branca justa, cuja manga curta se agarrava nos músculos do bíceps, seu antebraço grosso exibia veias saltadas sob diversas tatuagens e seu pescoço era grosso e forte, adornado por uma corrente prata com um pingente. Deixei seu rosto por último, o queixo era firme e quadrado, dando a ele um ar sério, sua boca era carnuda e o canto direito estava levemente repuxado para cima num sorriso sacana, sua barba por fazer deixava tudo mais convidativo. 

Seus cabelos pretos estavam bagunçados de um jeito sexy, quando finalmente encontrei seus olhos percebi que havia um levíssimo traço de olho puxado, o dourado que outrora parecia o raiar de meio-dia deu lugar à um dourado escuro, cujo brilho predatório fez um tremor percorrer minha espinha.

Entre o mar e amarOnde histórias criam vida. Descubra agora