carta aberta de número 5 a Jeon Jungkook.

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Eu poderia dizer que gostar de você nunca foi fácil, Jungkook, mas a verdade é outra. Gostar de mim mesmo é que nunca foi simples. Adorar você foi o estopim para que eu me gostasse e, no fim das contas, não foi realmente difícil. A paixão só é complicada porque, adiante dela, há o amor. E o amor não é espinhoso, sabe? O processo de aprendizagem até que teçamos uma coroa de espinhos sem nos machucar, sim, é. Contudo, a partir do momento em que você vive na medida em que pensa suas experiências, manusear a rosa sem margem para sangramento se torna mais fácil. Com menos pressa e descuido... mas sem menos vontade de, brandamente, sentir a textura da calidez exclusiva às pétalas carmesim por entre seus dedos.

Em outras palavras, a priori, gostar de você foi como uma chama flamejante sendo acesa em minh'alma sem o controle do ar. Minha cabeça era um furacão só! E, a cada lufada de ar, era um vendaval que ia e vinha. Na mesma brusquidão em que surgia, desaparecia. Depois, a chuva virou tempestade constante... e, a princípio, eu não tinha ideia de como mergulhar os pés n'água sem me afogar. Eu não sabia nadar, Kook. Mas a vontade — e é aí que está: vontade e desejo se divergem. O desejo nos leva de volta ao nosso instinto primitivo... e, uma vez descontrolado, é passaporte para a oficina do diabo. A vontade, entretanto, é racionalizar esse sentimento; o momento em que ele se torna mais claro, manejável e menos amedrontador. A vontade é sinônimo de liberdade e, então, de amor — de me dedicar à natação, com a sua ajuda, me deu a coragem de enfrentar o pélago. Não que eu não tenha lidado, nessa trajetória, com o desejo de desistir, não: pelo contrário! Entendo, hoje, que faz parte do processo. Todavia, a virada de chave está justamente aí... em como era só um desejo. E a vontade de prosseguir tentando, ainda que dentro das minhas próprias limitações, manteve-se lá...

É engraçado como, na configuração aérea do meu pensar, tudo se conecta. A humanidade é, nitidamente, um reflexo da natureza... e, em cada um, há a influência única dos quatro elementos naturais basilares. Em mim, a terra sempre costumou fazer mais falta. Ainda que eu portasse um lado bem pragmático como a essência terrosa, majoritariamente inserir a mim mesmo em meus pensamentos era como adentrar uma maré alta, cujo curso era, via de regra, dado pela ventania sem fim. Então, ter a areia como base parecia custoso. Nesse meio, despertar sentimentos por você fez com que eu acessasse minha face mais fogosa. O ponto era: como controlar a brasa sem sequer firmar os pés no chão? Ter segurança no mar e não me deixar levar pelo temporal?

Você, por outro lado, é filho da mãe terra. Neto do ar, sim, porque seus pensamentos flutuam até Mercúrio junto ao seu coração, que faz menção de visitar Vênus. Para você, o fogo apaixonado também sempre se fez necessário. "Viver sem paixão é como estar morto" é um dos seus legados. E eu acho isso lindo... é tão bonito como você sente anseio por estar vivo! Como o mundo diante de ti te estimula... ah, Jungkookie! Você é aceso como o Sol. Magnético e estimado como o rei do dia.

Ao mesmo tempo, amor, você continua enraizado em solo fértil. Você tem consciência sobre o que te pertence, e trabalha arduamente para atingir seus objetivos. Você tem seus jeitinhos e manias... dá luz a ideias maravilhosas — que também derivam do ventinho fresco que a plantinha que desabrocha do seu coração recebe — e quer aperfeiçoá-las a todo custo. Por mais realista que você possa ser, diante de tanta autocobrança, você termina se esquecendo de que a perfeição é uma fantasia; que são suas imperfeições que te conectam aonde você sempre quis se encontrar e, por algum tempo, foi mais difícil: sua humanidade — aquilo que te torna mais humano, mais você, mais universo.

Apesar de ser bastante prático, você nunca deixou de ser a pessoa mais genuína que já pisou neste mundo, meu bem. A independer dos seus limites, seus olhos sempre foram cristalinos como água pura. No fim das contas, entender o curso deles, olhando de perto e para além da superfície, é fácil. Ainda que complexo... e intenso. Essa era a ideia... no começo, eu quis me afundar em você sem o costume de pisar em areia. Uma areia densa, que carrega muita bagagem em grãos infinitos e, nem sempre, é macia.

Enquanto eu batalhava para me equilibrar na superfície marítima e me empenhava para respirar regularmente, você se atinha à base. Construía castelos de areia que, muitas vezes, desmoronavam em virtude de você se convencer de que, em suas construções, algo nunca bastava. E, nisso, você se perdia na busca do que realmente precisava achar: a beleza naquilo que já se tinha e, talvez, você precisasse mudar um pouquinho a perspectiva para saber apreciar integralmente.

Sólida como é, mesmo a terra precisa dos demais pilares para se manter. E, inclusive, da água! Não era via de regra que o fluxo oceânico se colocava favorável para suas esculturas com a areia, Jungkook-ssi. Mas... um dia, uma semente foi plantada no fundo do mar. Lá de cima, eu a enxergava, mesmo que turvamente. Você, por sua vez, precisou assisti-la crescer para confiar um pouquinho mais naquela serendipidade. Mas, quando você resolveu tocá-la... essa rosa desabrochou em mim, Jeongguk-ah. Demorou, mas eu soube que, lá embaixo, havia mãos para me puxarem pelos pés e os fixarem no chão. E você o fez.

No início, não nos entendemos perfeitamente nas lições de natação; e é justamente isso que fez da nossa sintonia única no mundo. Mesmo que tivéssemos ritmos diferentes, no fim, nadávamos rumo ao mesmo lugar. Uma ilha só nossa, que conta com a união elementar e, inclusive, um componente a mais: a quintessência que deriva dela — o éter. As forças do ar, do fogo, da terra e da água abraçadas em um só. O transcendental que só se conhece quando se ama e, então, você se entende infinito numa finitude.

Eu atravessei cada uma das minhas fases lunares no tempo em que você, meu Sol, enfrentou muitos céus nublados e anoiteceres que, por certo, foram frios além da conta. A despeito disso, a gente se encontrou neste eclipse tão raro e a nós exclusivo... a gente conquistou este amor. Percorremos, por nós mesmos, o caminho do Eu Divino. E, juntos, desfrutamos dele. Juntos, o transcendental cósmico faz mais sentido... porque, independente dos mecanismos aos quais o metafísico realmente está submetido, meu microcosmo sempre será macrocosmo quando aliado ao seu. Diante de ti, Jungkook, eu abraço e compreendo melhor as minhas subjetividades, e para elas encontro um espaço na Via-Láctea. Amo porque converso com as estrelas, e as ouço porque, existindo em mim, existo você.

Amar você é como flutuar livremente por todas as minhas essências, e me sentir cosmo. Eu te amo, etereamente, meu etéreo.

etéreo - jikookOnde histórias criam vida. Descubra agora