Júlia Figueiredo Andrade é uma mulher importante da alta sociedade de Campos dos Goytacazes e se orgulha disso, por tal motivo se empenha bastante em realizar eventos e não é nada modesta quando o assunto é se autopromover, mas ela julga que é apenas ossos do ofício.
Por isso, quando sua amada filhinha compartilhou a ideia do evento para angariar fundos para a construção de uma creche para as funcionárias da Tecelagem Tropical deixarem suas crianças ela sabia que era uma oportunidade perfeita, não apenas seria um evento digno de mais um elogio da primeira dama, mas ajudaria a população local, afinal ela tinha um bom coração, e, de quebra, ela ainda podia matar a saudade da jogatina, mesmo que fosse com um mero bingo.
Contudo, nem mesmo toda a alegria de promover um grande evento para os padrões da pacata cidade a sustentou durante aqueles breves segundos em que ela viu ao longe a melhor amiga de sua filha chegar acompanhada de sua única tia, a famigerada Heloísa Camargo.
Como sempre, a loira se apressou em se ocupar para não ter de se aproximar da mulher de cabelos tão negros quanto ébano, não por seu reconhecido mau-humor ou sarcasmo exacerbado, longe disso.
A verdade é que existe uma razão para que a espalhafatosa Julinha evite interações com a tia da melhor amiga de sua única filha.
É egoísta.
É errado.
É até mesmo um pecado!
Contudo, ela prefere fechar os olhos do que olhar para a mulher, cuja filha ela criou como sua.
A esposa de Constantino Andrade se lembra muito bem daquela noite há tantos anos...
Fique-e-e-e
Longe-e-e, longe e-e
Chovia muito quando Constantino saiu de casa, mas Julinha não ligava, sua filhinha, sua tão amada e esperada Arminda, com apenas dois dias de vida havia falecido há poucos dias e ela se sentia destruída, seu coração estava dilacerado e ela não tinha vontade nenhuma de viver em um mundo em que seu tão aguardado bebê não existia, nem a presença de sua mãe ou as visitas do padre eram capazes de tranquilizar sua mente e seu coração, porém naquela noite o marido havia lhe prometido que concertaria tudo, tendo ela sequer prestado atenção nas palavras do homem abalado com a perspectiva de perder a esposa também.
Dessa forma, o homem tido por muitos como mesquinho não se importou em pagar um motorista de sua companhia para dirigir naquela noite chuvosa e muito menos de se molhar até enfim conseguir adentrar a igreja mal iluminada, onde o padre Romeu estava no banco da primeira fileira segurando um pequeno embrulho.
Constantino fez o nome do pai antes de se dirigir até o pároco e se sentar ao seu lado um tanto quanto nervoso, pois se sentia uma espécie de criminoso.
_Pegue-a. –O servo de Deus que naquele momento sentia o peso de suas ações se viu na necessidade de deixar aquela criança longe de si.
Constantino pegou o bebê com todo o cuidado do mundo, de forma que a recém-nascida sequer se mexeu em seu sono profundo.
_Oi pequenina... –Constantino murmurou enquanto não se continha em acariciar a bochecha rechonchuda da bebê.
_Leve-a depressa, não será bom que o vejam com um bebê aqui a essas horas. –O padre disse na esperança de que quando o empresário saísse pelas portas da casa do senhor, estaria ele ao menos fazendo uma boa ação ao dar um bom lar àquela criança.
Por mais que estivesse ansioso para levar a criança embora e, com sorte, aplacar ao menos um pouco a dor da esposa ao lhe entregar o bebê, o genro de dona Santa indaga com receio:
VOCÊ ESTÁ LENDO
Black out days
FanfictionSe repetirmos uma mentira para nós mesmos durante muito tempo, acabamos por acreditar que é verdade. Contudo, inevitavelmente, há momentos em que a verdade flerta com o mentiroso e, nesses momentos, é quando a mente do enganador entra em colapso com...