📚 3. Personagens e Características✒

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Olá Wattpadianos! 🧡🧡🧡

“Caracterização é a soma de todas as qualidades observáveis de um ser humano, tudo o que pode ser descoberto através de um escrutínio cuidadoso: idade e QI; sexo e sexualidade; escolhas de casa, carro e vestido; educação e trabalho; personalidade e nervosismo; valores e atitudes — todos os aspectos da humanidade que podem ser conhecidos quando tomamos notas sobre alguém todo dia. A totalidade desses traços faz uma pessoa única porque cada um de nós é uma combinação única de genes recebidos e experiência acumulada. Esse amontoado singular de traços é a caracterização, mas não a personagem.”

- Story, Robert Mckee

Caracterização é uma dessas técnicas que a dramaturgia herdou da literatura e por isso mesmo, talvez seja tão esquecida nos estudos de roteiro.

A caracterização se refere ao processo de introduzir, descrever e revelar um personagem. Quando falamos em personagens esféricos pensamos em três dimensões, uma física, uma sociológica e uma psicológica. Muita coisa faz parte da caracterização de um personagem, sua etnia, sua idade, seu porte físico, sua altura, como se veste, como fala, como pensa, como age. Mas sem dúvida, o caráter mais importante da caracterização é revelar a personalidade e o psicológico de um personagem.

“"Ser alto, baixo, gordo, magro, careca ou selvagem é apenas uma característica que não revela mais da vida interior do personagem do que a cor de um carro revela o poder de seu motor. O ingrediente essencial que essas características carecem é a atitude do personagem em relação ao atributo. Um personagem pode ser descrito como tendo um nariz grande , e não nos diz nada de sua vida interior. Mas em Cyrano de Bergerac, o enorme nariz do protagonista faz parte de sua caracterização pela simples razão de que é crucial para sua atitude em relação a si mesmo. O nariz dele é a fonte de seu senso de inferioridade e de seu senso de superioridade; é uma força motriz por trás do que tem o destacado, e por trás de seus medos.[...] Esta é a essência da caracterização, a revelação da vida interior do personagem. Suas ações, que são baseadas em seus desejos ou objetivos, conduzem nossa compreensão da vida interior personagens."

-Teoria e Prática do Roteiro , David Howard e Edward Mabley

Na literatura, tem-se muito bem definida duas formas de caracterização: a direta e a indireta. A caracterização direta é quando alguém verbaliza as características do personagem, às vezes ele próprio, às vezes um outro personagem e no caso da literatura, o caso mais comum, quando o narrador faz a caracterização através de adjetivos e indicação de traços.

“Mr. Bennet era um misto tão curioso de vivacidade, humor sarcástico, reserva e capricho, que a experiência de 23 anos tinha sido insuficiente para que a sua esposa lhe conhecesse o caráter. O espírito de sua mulher era menos difícil de compreender; tratava-se de uma senhora dotada de inteligência medíocre, pouca cultura e gênio instável. Quando se aborrecia imaginava que estava nervosa. A única preocupação da sua vida era casar as filhas”

-Orgulho e Preconceito, Jane Austen

Em A Hora da Estrela, o narrador Rodrigo S.M. descreve sua protagonista, Macabéa, mas não a descreve apenas fisicamente- com seus ombros curvos- mas também psicologicamente. Ele nos conta que ela é infeliz, sua ignorância sobre a própria felicidade e sobre sua capacidade de acreditar.

“A moça tinha ombros curvos como os de uma cerzideira. Aprendera em pequena a cerzir. Ela se realizaria muito mais se se desse ao delicado labor de restaurar fios, quem sabe se de seda. Ou de luxo: cetim bem brilhoso, um beijo de almas. Cerzideirinha mosquito. Carregar em costas de formiga um grão de açúcar. Ela era de leve como uma idiota, só que não o era. Não sabia que era infeliz. É porque ela acredita. Em quê? Em vós, mas não é preciso acreditar em alguém ou em alguma coisa – basta acreditar. Isso lhe dava às vezes estado de graça. Nunca perdera a fé.”

- A Hora da Estrela, Clarice Lispector

O narrador não cria cenas para mostrar como Macabéa é infeliz, ele simplesmente diz que ela era infeliz. A abordagem pode ser floreada e até poetizada, mas a intenção é clara, caracterizar de forma direta a personagem. Esse uso parece excessivamente literário, mas também pode ser utilizado no cinema.

No cinema não costuma ser muito eficaz a abordagem de caracterização direta, pois como estamos lidando com a dramaticidade encenada o artifício da verbalização sobre os personagens pode soar pesado e falso. Mas não é impossível.

A utilização mais óbvia seria uma Narração Voice Over que descreve o personagem e seus pensamentos e eu sei, parece uma ideia horrível, mas para provar que até essa possibilidade pode ser utilizada com 1) Elegância- recomendo assistir Os Excêntricos Tenenbaums e 2) Humor - é impossível não citar Arrested Development.

Mas a utilização mais recorrente no cinema da caracterização direta é a feita diegeticamente, por um personagem em cena. Muitas vezes, ela é feita pelo próprio personagem, porém para que não soe artificial ela precisa ser feita com um contexto que justifique e naturalize a situação.

A série Insecure (HBO, 2016) começa com Issa, uma jovem que trabalha em uma instituição de assistência social, apresentando o programa da instituição para alunos adolescentes de uma sala de aula. Ela se apresenta como Conselheira deles no programa e abre espaço para perguntas. Para surpresa dela e do professor na sala, os alunos não tem perguntas sobre o programa, mas sim sobre ela. Por que ela fala daquele jeito, por que o cabelo é estranho ou se ela é solteira são algumas das perguntas alternadas entre a pura curiosidade e a provocação dos alunos. E Issa responde assim:

Fosse descontextualizada, a fala seria completamente forçada deixando explícita a intenção de caracterizar o personagem de forma rápida e direta.

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