O Escultor

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Uma carta de desafio. A mesma carta de sempre. Eric Castle sentia-se em um maldito ciclo vicioso, uma espécie de punição dantesca. Uma xícara de café fria repousava sobre mesa, a brancura da porcelana contrastava com a sujeira sobre o tampo de madeira. No cinzeiro um cigarro queimava lentamente. Sentia um frio na espinha enquanto encarava aquela carta. A caligrafia fina, bem trabalhada, os arabescos contornando o papel delicado já desbotado pelo tempo... seria tão lindo, exceto pelo tom escarlate que acompanhava aquelas linhas. Na nota de rodapé, o número um se destacava.

Ele se levantou e caminhou até a porta de madeira lascada que escondia a escada até o porão e encarou a escuridão enquanto seus olhos se adaptavam. Uma melodia suave tocava em sua cabeça. You are my sunshine, my only sunshine. A cada passo, sentia a dor em seu peito crescer. Todo desespero, todas aquelas mortes girando em um turbilhão sem fim em sua mente cansada. Ele ainda se lembrava de cada uma das vítimas, mantendo-as em um mantra ao acordar e antes de dormir, culpava-se por cada falha, como se fosse ele a empunhar a faca ao dar o golpe de misericórdia. Finalmente o desfecho. Eric sentia-se em seu próprio réquiem. Seus olhos ardiam ao tentar conter as lagrimas que marejavam os seus olhos verdes, e essas insistentemente rolavam por seu rosto outrora bonito, deixando marcas ao passar pela poeira em sua barba por fazer.

Detetive Eric Castle, divisão de homicídios. Durante anos, ele caçara o terror de Ontario, conhecido como O Escultor. Afastado, acusado de obsessão, sua própria equipe apontando dedos e dizendo que ele, antes um dos melhores, era um risco para a investigação, mas o que eles esperavam? Quatorze vítimas, quatorze fracassos. Em seus piores momentos, Eric levava sua arma até sua têmpora, e sempre terminava por desistir, repetindo seu mantra como uma oração.

"Helena Rose Parkins

Anna Arankopva

Ash Aredes

Carol Mullins

Bernadett Williams

Julia Hawkins..."

Os nomes passavam por sua cabeça em um looping a cada degrau que ele descia rumo àquele subsolo fétido. Estava na hora de colocar um fim. You make me happy when the skies are grey.

A fraca luz incandescente iluminava um corpo caído no chão. Mesmo na metade da escadaria, Eric podia visualiza-lo como um marco de passagem. Estava torcido em um ângulo estranho. Uma poça de sangue havia se espalhado pelo linóleo. Uma pistola cromada estava caída ao lado do corpo.

- Foi rápido demais. Eu sinto muito. – Disse parando próximo ao cadáver, como se pudesse ouvi-lo.

O maldito Escultor estava morto aos seus pés. Conhecido por selecionar suas vítimas arbitrariamente, sem seguir um padrão, o que dificultava o trabalho dos detetives. A figura amedrontadora agora assemelhava-se a uma boneca de trapos. Pequeno demais. Quase frágil. Como pude teme-lo durante todos esses anos? Sempre que alguém desaparecia, a primeira suspeita era direcionada a ele. Enquanto equipes de buscas eram direcionadas, a divisão de homicídios corria contra o tempo para tentar localiza-lo. Em quinze dias, sempre no mesmo horário e em algum lugar histórico, encontravam a vítima posicionada como uma escultura. Uma escultura bizarra.

Noite passada, Eric recebera uma dica quente de um detetive que lhe devia um favor, ainda tinha suas fontes, mesmo que os escrotos do departamento o tivessem isolado. Uma garota de dezessete anos havia sido sequestrada dias antes. Testemunhas disseram que fora abordada por um estranho de aproximadamente um metro e setenta de altura. As histórias eram desconexas, mas com essa dica ele finalmente chegara a algo concreto. Um andarilho presenciara o momento em que o homem empurrara a garota para dentro de um velho Chevy. Com um pouco de café, dialogo e alguns hematomas produzidos por um bastão tático, o andarilho entregara a placa para Eric.

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⏰ Última atualização: Jun 17, 2022 ⏰

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