Capítulo II

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Quinze dias se passaram depois de minha aventura.


Durante este tempo é escusado dizer-lhe as extravagâncias que fiz.


Fui todos os dias a Andaraí no ônibus das sete horas, para ver se encontrava a minha


desconhecida; indaguei de todos os passageiros se a conheciam, e não obtive a menor


informação.


Estava a braços com uma paixão, minha prima, e com uma paixão de primeira força e de


alta pressão, capaz de fazer vinte milhas por hora.


Quando saía, não via ao longe um vestido de seda preta e um chapéu de palha que não


lhe desse caça, até fazê-lo chegar à abordagem.


No fim descobria alguma velha ou alguma costureira desjeitosa, e continuava tristemente


o meu caminho, atrás dessa sombra impalpável, que eu procurava havia quinze longos dias, isto


é, um século para o pensamento de um amante.


Um dia estava em um baile, triste e pensativo, como um homem que ama uma mulher e


que não conhece a mulher que ama.
Recostei-me a uma porta, e daí via passar diante de mim uma miríade brilhante e


esplêndida, pedindo a todos aqueles rostos indiferentes um olhar, um sorriso, que me desse a


conhecer aquela que eu procurava.


Assim preocupado, quase não dava fé do que se passava junto de mim, quando senti um


leque tocar meu braço, e uma voz que vivia no meu coração, uma voz que cantava dentro de


minha alma, murmurou :


- Non ti scordar di me!...


Voltei-me.


Corri um olhar pelas pessoas que estavam junto de mim, e apenas vi uma velha que


passeava pelo braço de seu cavalheiro, abanando-se com um leque.


- Será ela, meu Deus? pensei eu horrorizado.


E, por mais que fizesse, os meus olhos não se podiam destacar daquele rosto cheio de


rugas.


A velha tinha uma expressão de bondade e de sentimento que devia atrair a simpatia; mas


naquele momento essa beleza moral, que iluminava aquela fisionomia inteligente, pareceu-me


horrível e até repugnante.


Amar quinze dias uma sombra, sonhá-la bela como um anjo, e por fim encontrar uma


velha de cabelos brancos, uma velha coquette e namoradeira!


Não, era impossível! Naturalmente a minha desconhecida tinha fugido antes que eu


tivesse tempo de vê-la.


Essa esperança consolou-me; mas durou apenas um segundo.


A velha falou, e na sua voz eu reconheci, apesar de tudo, apesar de mim mesmo, o timbre


doce e aveludado que ouvira duas vezes.


Em face da evidência não havia mais que duvidar. Eu tinha amado uma velha, tinha

Cinco minutos- José de AlencarOnde histórias criam vida. Descubra agora