Capítulo 1

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Depois daquela luz brilhante Yasmim não se lembrava de nada do que aconteceu após ouvir aquela buzina. Sem saber a onde estava e ainda meio inconsciente olhou ao redor, estava supostamente num leito de hospital, assim que se virou engoliu a seco. Viu a si mesma deitada na cama com uma máscara de oxigênio no nariz e alguns fios ligados em seu corpo.

Na bancada da janela era possível identificar os restos de uma flor e alguns bilhetinhos de encorajamento do tipo "eu sei que vai conseguir, não desista". Voltou os olhos a cama e disse a si mesma "só pode ser um engano". Meio confusa se dirigiu à porta e deu de cara com uma enfermeira, ela nem pareceu notar alguém ali e foi direto para sua paciente. Calada, Yasmim saiu do quarto e se viu num corredor movimentado. Com um passo mais apertado foi até a saída do hospital.

O dia estava nublado, com uma garoa fraca. Ela ainda se perguntava o que estava fazendo ali. A casa dos pais não era muito longe dali, resolveu ir de a pé. Quando chegou na frente de casa e tentou abrir a porta sentiu um arrepio percorrer lhe o corpo.

Ao girar a maçaneta sua mão atravessou totalmente para o outro lado. Seus olhos arregalaram. Tentou mais uma vez e aconteceu a mesma coisa. Ela cerrou os dentes, fechou os olhos e atravessou a porta sem nenhuma dificuldade. Quando abriu os olhos se viu de frente para o corredor. Por um momento pensou estar sonhando, tentou até se dar alguns beliscões, mas nada adiantou. Devagar foi andando até a sala onde seus pais estavam abraçados no sofá.

- Oi gente! - ela gritou chegando mais perto.

Nenhum dos dois se virou. Estavam chorando por algum motivo. A foto de Yasmim estava pendurada na parede, com algumas rosas abaixo, em cima da estante.

- Pessoal! - ela gritou mais alto.

De novo ninguém reagiu. Uma sensação estranha tomou conta de seu corpo. Com os dois braços estendidos tentou sacudir sua mãe, mas de nada adiantava tentar tocar alguma coisa, as mãos sempre atravessavam. Ela se afastou lentamente e foi até a cozinha, olhou para o calendário que fizera na primeira série e sorriu. Em cima da geladeira estava o calendário certo. 28 de Agosto. "como assim 28 de agosto?". Perguntou-se, o último dia que havia saído de casa era 19 de fevereiro. Com uma certa pressa saiu de casa rumo à casa do seu melhor amigo, Lorenzo.

Enquanto caminhava pela praça via as pessoas todas bem agasalhadas, com mantas e casacos grossos. Não entendia, estava de manga curta, jeans e tênis. Não sentia calor nem frio, nem mesmo o vento. Assim que chegou, atravessou a porta e logo avistou Enzo. Ele ergueu a cabeça e saltou da cadeira.

- Ai meu Deus! Não acredito que você tá bem! - ele soltou o livro em cima da mesa e veio correndo, sorrindo.

Quando saltou para abraça-la seu corpo atravessou-a e foi direto pro chão. Ele olhou para ela sem entender levantando-se rapidamente.

- Pera aí, você consegue me ver?

- Sim - concordou confuso.

- Ai meu Deus, você tem que me ajudar não sei o que tem de errado comigo! - falou Yasmim com ar de preocupação.

- Vamos lá pra cima.

Os dois subiram até o quarto dele e se sentaram na cama.

- Ainda não entendo, como pode estar aqui se estava em coma até hoje de manhã?

- Coma?

- Você não lembra? Do acidente?

- Que acidente?

- Yasmim! 19 de fevereiro. Você estava atravessando a rua e POW! - ele fez um gesto com as mãos - foi atropelada.

- Eu? - arregalou os olhos.

- É, você - diz depois de um minuto de hesitação.

A porta do quarto se abre.

- Com quem você está falando querido? - perguntou sua mãe encostada na porta.

- Com a Yasmim - ele disse seriamente apontando para seu lado.

- Eu sei que você ainda está sofrendo com isso, mesmo que já faça sete meses.

O pai percebeu a conversa e se juntou à eles.

- O que está havendo?

- Mãe é sério, como você não consegue enxergar?

- Enxergar o quê? - perguntou o pai confuso.

- A Yasmim pai, ela está aqui do meu lado! - disse aumentando um pouco a voz.

O pai e mãe se entreolharam.

- Você precisa descansar um pouco meu filho, tente dormir alguns minutos.

Eles fecham a porta. Yasmim se perguntava por que só ele conseguia vê-la? Enzo deixou uma lágrima escorrer e a enxugou com as costas da mão antes que pudesse ser percebida.

- Vamos para outro lugar - ele foi até a porta - Mãe! - gritou - Estou indo pra praça esfriar a cabeça.

Os dois saíram pela porta dos fundos.

- Bom tenho uma lista de livros legais pra você ler - disse o garoto enquanto caminhavam.

As pessoas olhavam estranho para ele.

- Ei, você pode me ver, mas acho que as outras pessoas não - disse Yasmim.

- Ah sim, sim. Tá certo.

Eles seguiram o resto do caminho calados.

Promessa de um AnjoOnde histórias criam vida. Descubra agora