E eu sempre ouvia desculpas, por cem mil vezes, as mesmas porras das desculpas. E eu sempre voltava para o mesmo dia sombrio e negro. Nem sempre temos dias bons, tenho consciência disso, mas como fugir desse ciclo sem fim que se tornou minha vida? Uma armadilha do amor que não cansa de se afastar de mim. Quanto mais feliz achava que ficaria, mais distante o amor parecia ficar. Por um longo tempo desejei ter um lugarzinho meu, um café onde as pessoas viriam antes de trabalhar ou depois de um longo e cansativo dia de trabalho, tomar um café acompanhado da especialidade da casa, o rolinho de creme e canela. A única decisão certa que havia tomado era o curso de doces gourmet que tinha feito. Havia vencido na vida, mas não no amor.
Steven havia me feito perder longos cinco anos e para quê? Cinco anos de namoro jogados fora. Como fui cega esse tempo todo? É engraçado como não percebemos o óbvio bem debaixo de nosso nariz. Me sinto enganada e traída pela confiança. É um sentimento tão louco que ao invés de eu estar feliz com minha conquista, estou triste e sentindo um vazio dentro de mim.
Enquanto olhava meu passado com tristeza senti alguns pingos de chuva tocarem meu braço. Olhei para o céu e vi que muitas nuvens negras começavam a se formar. A velha Boston, berço da liberdade, parecia que estava prestes a ser inundada por um dilúvio. Entrei e encontrei Lana, minha única funcionária, me aguardando em frente do balcão e alguns poucos clientes que pareciam ter percebido o mesmo que eu e estavam apressados para irem embora antes da tempestade.
- Beatrice! Hoje preciso sair mais cedo para ajudar minha mãe na mudança. Depois posso repor essas horas... Posso ir?
- Claro, Lana. O movimento tá fraco hoje. Depois combinamos o dia para você repor.
- Obrigada.
- E se eu fosse você me apressaria, pois vai cair uma tempestade.
- Sério? Eu nem trouxe guarda-chuvas. Bom. Vou correr. Até amanhã, Beatrice.
- Até amanhã, Lana.
Enquanto ia arrumando as mesas continuava pensando no meu passado e nas coisas que deixei por fazer. O som dos trovões do lado de fora faziam-me voltar à realidade, mas como estava sozinha e sem clientes, não me importava em voltar para o mundo fantasioso da minha mente cheia de problemas. Enquanto lamentava tudo aquilo que deixei de fazer por Steven, escutei a porta abrir, virei-me para olhar e vi que eram clientes. Dois homens usando um sobretudo. Ambos estavam um pouco molhados e assim que entraram a chuva começou a cair forte.
- Boa tarde! - Um deles disse a mim.
- Boa tarde - respondi simpaticamente.
- Demos sorte, hein Butler.
- Sim. Mais um minuto lá fora e estaríamos totalmente encharcados. - Ele olhou ao redor e viu que não havia ninguém além deles. - Você está fechando?
- Não. É que o pessoal fugiu, a chuva espantou todo mundo - respondi com um leve sorriso. - Tome o menu e fiquem a vontade.
- Obrigado.
- Se precisarem de algo podem me chamar, estarei ali.
Fui para trás do balcão enquanto os dois homens olhavam para o menu. Percebi que um deles não parava de me olhar desde que entrou. Parecia que ele não fazia a mínima questão de disfarçar. De certo modo isso me deixava um pouco sem graça e excitada, pois ele era bonito e atraente. Aparentava ter mais de 30 anos e tinha uma barba bem grossa. Seus cabelos eram castanhos escuros e ele tinha lindos olhos verdes que pareciam me hipnotizar caso olhasse por muito tempo, o que fazia invariavelmente eu desviar seu olhar que a todo momento me procurava. O outro homem era mais contido e sério. Era um negro alto e de cabelo bem curto. Ele não tinha barba e aparentava ser mais novo que seu amigo.
![](https://img.wattpad.com/cover/318834756-288-k522624.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
CACHOS & CAFÉ - [One-Shot]
Short StoryBeatrice é uma mulher divorciada que conseguiu realizar seu sonho de abrir um café. Após anos presa num relacionamento onde se sentia sozinha, ela de repente se vê em uma situação inimaginável, a possibilidade de realizar um de seus fetiches. E voc...