Viagem

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   Para meu eu prisioneiro sem grilhões, em um marasmo interminável e sufocante, dedico esta intrigante e revigorante viagem. É possível uma jornada de autoconhecimento ausente de deslocamento? "Sim" é a resposta, sem dúvida nenhuma, pois é o caso que ocorreu consigo mesmo, não moveu um músculo sequer além do que foi necessário, ele que atualmente sou eu, usou apenas o puro exercício do pensamento racional e lógico em detrimento das emoções e sentimentos mais exaustivos, agora posso olhar para ele e analisar tudo e resolver, não existe problema que a razão não possa desvendar.

   Irei construir meu barco, feito inteiramente de pensamento racional, que navegará nas vastas e turbulentas correntes marítimas dos sentidos, minha vela utilizará dos ventos lúcidos da consciência esclarecida, vindos de norte a sul, para desbravar um mundo repleto de ilusões e injustiças. Superarei as necessidades de meu corpo pobre e finito, meu espírito rico e eterno se elevará igualando-se ao ser supremo infinito, pois eu o criei, através do meu pensamento manifestei minhas melhores qualidades e as projetei em um ser, criando-o, Deus será nada mais do que meu ajudante nessa longa e exaustiva viagem, um coadjuvante, muito interessante para falar a verdade, mas ainda assim deixado em segundo plano.

   Nessa viagem hipotética, o espírito, a alma, é a verdade que me guia em meio à névoa espessa, a essência daquilo que se apresenta à mim, busco incessantemente, para me unir com um sentido e, por consequência, amenizar as exigências que a posse da consciência esclarecida traz consigo. Mas como pode uma viagem sem emoção alguma ser interessante? Negando características principais que fazem o humano, o ser mais incrível e complexo. Meu barco construído cuidadosamente se desmorona por completo ao menor sinal de amor ou medo, remendo-o mais uma vez, e mais uma vez, quantas vezes for necessária, a negação do corpo finito, a negação da humanidade, a negação de Deus. Uma triste viagem devo admitir, no final me alimentei de Sol, o consumi covardemente, derrotado mais uma vez, o ciclo se repete, interminável, tentasse de novo à fuga inútil, abraço o corpo.

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