Capítulo 1

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Quão intensos podem ser os sonhos de uma garota de 19 anos? O suficiente para fazer com que algo consiga atravessar de uma dimensão a outra sem ser dilacerado?

Meus sonhos certamente eram incomuns, eu já havia percebido isso há um bom tempo... nas primeiras noites, tudo era estranho. Eu costumava acordar assustada e com medo. Recorri a algumas pesquisas na internet, e até mesmo alguns livros. Tudo me levava ao mesmo resultado: sonhos lúcidos. Sempre pareceu ser algo mais, no entanto.

Conforme o tempo foi passando, eu me acostumei. Aprendi a controlar o impulso de gritar, o que evitava certos conflitos com meu pai. Ele jamais compreenderia algo daquela natureza. E o melhor que pude fazer, foi criar um diário de sonhos. Ali eu poderia desabafar sobre tudo. Contar minhas aventuras, minha insanidade lúcida.

Anos se passaram e todas as noites, ir dormir vinha acompanhado de um ritual. Eu tomava banho, penteava os cabelos, escovava os dentes e escolhia um pijama que se adequasse ao que eu esperava do sonho que viria a seguir. Delicado, se eu imaginava ser a princesa salva de uma torre, mais sério se esperava ser quem salvava a tal princesa. E daí em diante.

Mas, na noite do dia 23 de dezembro daquele ano, tudo parecia estar diferente. Eu me lembrei de pendurar minhas meias na esperança de um presente de Natal que provavelmente não viria, meu pai nunca se atentava àqueles pequenos detalhes. Em sua concepção, o Papai Noel era alguma entidade Maligna... Eu sentia falta de minha mãe nas datas comemorativas, ela sempre as deixava mais alegres de alguma forma.

Afastei o pensamento e me voltei ao meu ritual noturno. Primeiro o banho, depois escovar os cabelos e os dentes e por fim, o pijama. Minha intuição me fez escolher um verdadeiramente sério naquela noite, como se previsse que algo estranho estava por vir.

Neve cobria minha janela, havia uma sombra assustadora no parapeito. Considerei por muitas vezes colocar cortinas ali, mas meu pai afirmava que era besteira. Minha mãe, dizia que se eu me assustasse com um pesadelo, deveria "guardá-lo" embaixo da cama. Eu também sentia falta das metáforas dela.

Adormeci em alguns minutos imaginando o que me aguardava do outro lado. No mundo dos sonhos. Espadas, coroas, reis, rainhas. Era incrível pensar que minha mente podia criar tudo isso só para mim, enquanto eu dormia.

Antes de abrir os olhos para descobrir o que havia adiante, inspirei profundamente. Era minha parte favorita. Sentir o cheiro dos lugares, eram sempre tão distintos e únicos... flores, areia... ar puro.

Abri os olhos. E era um mundo incrivelmente diferente da realidade. Tudo era tão colorido, cheio de vida. Não havia tecnologia ali, apenas o contato pessoal de cada indivíduo. Eles cantavam e dançavam uma música que parecia inacabável. Crianças brincavam ao redor de uma fonte de água limpa.

Aquele lugar era intocado pela maldade humana, e a julgar pelas orelhas pontudas, e caudas que alguns tinham, não eram humanos.

Estava tão distraída absorvendo tudo, que tropecei em uma pedra, e isso chamou a atenção de um homem que estava sentado em um tronco bebendo de um líquido viscoso. Parecia cerveja, mas eu não tinha certeza.

Ele aparentava ter não mais que 25 anos, era bonito, suas roupas eram de linho e couro. Não eram apertadas, mas mostravam que ele era forte. Portava uma espada curva presa em um cinto, mas o mais chamativo, era uma grande cicatriz em seu olho esquerdo, que o tornava esbranquiçado, não pude deixar de encará-lo. Talvez seja cego, pensei.

Ele me encarou. Se levantou e caminhou em minha direção. Eu recuei. Considerei se deveria fugir correndo ou não. O que ele poderia fazer? Me causar um pesadelo? Eu poderia, e ia, arriscar aquilo, decidi.

- O que uma forasteira faz por essas terras? - Perguntou sorrindo maliciosamente. - Ninguém nunca chega tão longe.

- Apenas, conhecendo. - Respondi com firmeza. - Que lugar é esse?

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