Eu lembro de um ditado que diz:
"Nenhuma flor sequer escapa de nascer, desabrochar, viver, e morrer. Para isso, ela deve ser cuidada por aqueles em que nela acreditam. Não pode faltar nada. Comida, luz, água, luz, amor... luz..."
A flor deve deixar esse mundo sem carregar lembranças consigo. Não pode ser mal cuidada, nem machucada. Caso contrário... ela jamais descansará."
Vendo isso eu percebi uma coisa... assim como as flores, nós necessitamos da mesma coisa para vivermos, e morrermos felizes. E assim como elas, não podemos morrer trazendo consigo as memórias.
Memórias tanto daqueles que o maltrataram... o torturaram... o mataram...
Você parte em busca de liberdade, mas o rosto daquele que te matou fica em sua visão, mas não claramente. Seu rosto é como uma tela de pintura manchada, ou como um rosto borrado do outro lado de uma janela molhada, castigada pela chuva, impossível de enxergar direito. Você sabe que ele está lá, mas não o vê.
As nossas lembranças são a única coisa que nos liga a nossa vida passada. A sensação é que nós somos livres para ir, mas ainda nos confinamos. Somos presos pelas nossas memórias.
Para aqueles de nós que ficamos, nossa prisão é nunca enxergar. E nessa solidão... preso no purgatório pelas memórias... é como apodrecemos... assim como as flores.
— Eu acho que já está na hora de falar...
Bem... eu me chamo Saffira, e eu tenho 18 anos. Eu cresci num orfanato junto com o meu irmão mais velho, e morri no dia em que ele fez 16. Eu tinha recêm feito 15 anos naquela época. Nós vivíamos numa vila muito longe do mundo, então a nossa tecnologia era limitada, e até eles nos encontrarem... bem, não deu tempo deles fazerem nada...
As memórias da minha morte ainda estão vagas em minha mente. Eu sequer sei quem foi que me matou, muito menos como.
Mas... enquanto eu ainda estava naquele lugar escuro, sendo levada para a luz de uma nova vida... eu ouvia os gritos do meu irmão, me encontrando já sem vida no meio de uma floresta densa. Aqueles gritos ecoam pela minha cabeça sempre que eu penso nele...
...
A escuridão reinava, até que eu abro meus olhos... não totalmente, já que eu estava deitada no chão de frente para o sol. Não demorou muito para o mesmo se esconder atrás de uma nuvem.
Eu me sentia ainda muito atordoada, e não conseguia lembrar de mais nada. Eu também sentia um peso extra nas minhas costas. Quando olhei, vi que eram asas enormes, brancas como algodão. Pode ser estranho alguém que só via esse tipo de coisas em livros ou mangás, e achava que isso não existia, perceber que agora tem asas e nem mesmo se espantar.
E então finalmente eu me levanto e olho em volta.
Um campo imenso de flores azuis me cercava, as mais belas flores que eu jamais tinha visto, funcionava como um grande espelho do céu.
O doce ar daquele lugar acalmava meu coração e minha alma. O céu era bem limpo, mas ainda continha algumas nuvens que eram muito bonitas... e de trás da maioria delas saia um arco-íris que tocava o chão.
Eu andei com cuidado para não machucar as flores, até um caminho de pedras que tinha ali. Olhando para um lado, você não via nada, mas olhando para o outro você via que esse caminho levaria a uma espécie de casarão daqueles antigos.
Andando até ele, eu me deparo com grandes portões dourados, quase como aqueles que guardam os castelos dos contos de fadas. Eles se abriram sozinhos, praticamente me convidando para entrar, e eu segui.
Eu parei em frente aquelas portas enormes e ao tomar coragem, eu bati.
Toc
Toc
Toc...
Não demorou muito para que alguém atendesse...
As portas se abriram e mostraram a figura de um homem, consideravelmente mais alto que eu. Ele usava um sueter cinza por cima de uma camisa de manga comprida branca, uma calça escura e um sapato muito bem engraxado.
Seus cabelos eram escuros, mas dava para notar que mais no fundo, eles possuíam também uma tonalidade avermelhada.
Ele não parecia estar surpreso em me ver. E com uma voz grave e rouca como a de um fumante, ele diz:
— E você, quem seria?
— Eu... não sei nada além de meu nome, senhor... me chamo Saffira. — Eu respondo. E então ele diz:
— Muito bem... entre. Vou te dar uma utilidade.
Ele sai da frente, e eu entro.
Aquele lugar por dentro era ainda mais impressionante. Parecia muito mais um castelo do que o casarão que era por fora.
— Seu quarto fica no final daquele corredor. Lá estarão as suas novas roupas e uniformes. — Ele diz enquanto aponta para um corredor próximo às escadas.
— Va lá, bote seu uniforme e volte, para que assim eu possa lhe passar uma função.
— Ok, senhor. — Eu respondi.
Eu fui lá, troquei meu vestido por um uniforme de empregada, e voltei para a sala principal, e lá ele me deu as minhas funções.
Limpar o chão de todos os cômodos, lavar as roupas, as cortinas... basicamente tudo que uma boa empregada doméstica faz.
Ele também disse que nos dias de semana, eu teria que ir para uma escola com outros anjos, para estudar.
A primeira vez que eu saí pela porta da frente daquele lugar depois que eu cheguei... eu percebi que todo aquele campo de flores já não estava mais lá. Não tenho certeza se foi só ilusão minha, mas todo aquele espaço aberto, agora tinha se transformado em uma pequena vila, habitada por anjos. Provavelmente criações dele.
E assim se passaram os primeiros meses... eu fazia os serviços domésticos e após isso eu iria para a escola, e lá eu conheci alguns amigos que eu os amo até hoje...
Tudo seguia bem nessa minha nova vida, até... aquele dia.
- Fim do capítulo -
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Melancholic Paradise (Cancelado)
FanfictionEssa obra se trata apenas de um teste. O nome oficial ainda não foi decidido, por isso a baixa qualidade das capas.