De Olhos Bem Fechados
"Feche os olhos, Jungkook. Feche os olhos e conte até 10. Pense em um lugar bom e não ouça nada do que a mamãe e o papai disseram. Promete?"
"Prometo mamãe."
E logo meus pais tinham mais uma discussão feroz e inútil na sala. Pude apenas me encolher no meu quarto, fechando os olhos com força, pondo a mão sobre eles para garantir, enquanto contava em voz baixa os números recém aprendidos na escola. Pensei em um lugar bom, qual seria a melhor fantasia na época? Pensei em nós três juntos, sentados na sala, só que com sorrisos nos rostos – ao invés de palavras amargas estampadas em nossas expressões, uma cena que se tornou cada vez mais comum com os anos. E nesses anos, minha fantasia de lugar bom mudou lentamente para um quarto vazio, onde eu apenas pudesse me encolher e fugir de tudo e todos.
Talvez eu tenha levado a promessa a sério demais, mãe.
***
Um, dois, três e lá nos vamos outra vez.
O som da porta do quarto dos meus pais batendo com força era um grande indicativo de que minha mãe chegara estressada do plantão noturno. Não era uma novidade, e ela sempre chegava a tempo de pegar meu pai se arrumando para o dia no escritório, então eu apenas congelei na cozinha, enquanto procurava algo para comer. Enfiei o primeiro pacote que vi na frente dentro da mochila, no automático, apressando para sair de casa antes das discussões se iniciarem e se tornarem altas demais para fechar os olhos e ignorá-las.
Todas as manhãs, de certa forma, eram iguais. Taehyung me enchia durante todas as aulas, comentando coisas aleatórias, imerso em sua personalidade naturalmente extrovertida e gentil para perceber que eu não ligava a mínima. Ele era novato no colégio, e creio que havia algum parafuso a menos em sua cabeça para continuar insistindo em conversar comigo, quando eu claramente não dava atenção. Mas ele apenas sorria para mim e perguntava se o clima não estava uma droga. Taehyung era um dos mistérios da vida, diferente do padrão de pessoas que enchiam as salas e corredores do colégio, tornando difícil eu entendê-lo e o que queria comigo. Mas, se eu sobrevivi ao ambiente hostil familiar, Taehyung apenas me fazia revirar os olhos e morder a língua para não sorrir.
Ele insistia toda semana para que eu pudesse largar meu caderno e as arquibancadas e corresse com todos os outros pela quadra. Mesmo que eu já tivesse um acordo implícito com a professora de educação física, em que eu fazia alguns trabalhos e ajudava na organização após as aulas, para ganhar a nota que eu não preocupava muito em ganhar correndo. Eu não iria desperdiçar meu momento de observar Jimin, nosso colega, em seu estado pleno. Ele era o completo oposto de mim, começando pelos cabelos descoloridos e terminando no seu sorriso constante, enquanto eu sempre permanecia sério e emburrado, como Taehyung comentava. Aquele papo de nos atrairmos pelos nossos opostos parecia bastante real, enquanto eu desenhava ele no uniforme da aula, rindo e correndo feito um desvairado com o resto da sala, pela quadra descoberta. Ele era da outra turma do primeiro ano, mas como nossa educação física era conjunta, era o momento ideal para memorizá-lo e eternizá-lo nas páginas do meu caderno.
Eu gostava de desenhar, era minha grande válvula de escape. Mas, principalmente desenhar pessoas. Eu as analisava cuidadosamente. Ao longo dos anos deixei de desenhar aleatórios, para escolher aquelas que pareciam ser as mais agradáveis ou que fugiam dos padrões. Já desenhara inclusive Taehyung sorrindo e entregara para ele, que ficou o resto da aula me enchendo de elogios e encarando a folha o tempo todo. Depois daquilo eu fiquei mais restrito aos desenhos com ele, já que o mesmo só sabia debruçar sobre mim e perguntar quem eu tava fazendo. Por enquanto eu conseguira esconder os desenhos de Jimin dele, mas a medida que eles se acumulavam nas páginas, foi ficando mais difícil.
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De Olhos Bem Fechados | jjk + pjm
RomanceEm que Jungkook decide pegar uma carona no trem da vida. Jikook | Menção de Vhope | ComingOfAgeAU! Repostagem - sou a autora original, mas em outra conta.