PRÓLOGO

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–Alguma notícia do Jie, Yoohyeon? –Minha voz ecoou pela sala decorada com arquitetura moderna.

Na minha frente eu observava uma miniatura da obra de Antonio Canova, Eros e Psique, retrata uma história que desde criança me cativou. A escultura ali obviamente não era uma réplica, mas sim uma versão menor, e de desconhecimento do mundo, que o autor havia feito antes de consolidar a original que hoje está no Louvre.

–Ainda não, JiU. Você sabe que não devia estar se preocupando com isso, certo? –O sapato da mulher fazia um som contra o chão conforme se aproximava de mim. –Estão todos procurando por ele, talvez seja melhor que você não saiba quando for encontrado.

Minhas mãos estavam repousadas nos bolsos da calça do terno como uma forma de evitar o frio gerado pelo ar condicionado. Elas sempre foram geladas demais. "Mãos geladas, coração quente" meu pai me dizia quando eu ainda era pequena, mas acho que todos me veem como uma pedra de gelo, principalmente meu coração. Menos a garota ao meu lado.

–Eu quero saber primeiro. –Retirei o estojo de cigarros da parte interna do blazer e acendi um deles na minha boca. –Eu preciso encontrá-lo antes de todos, você sabe.

–Foi decidido pelo concílio a pena de morte, ele tem muitos segredos a revelar, não vão deixar ele sair vivo assim. –Seu tom de voz era calmo. –Me diga por favor que você não está pensando em ajudá-lo a escapar.

Como esperado dela. Sempre vendo o melhor de mim, até quando nem eu mesma via. A mulher usava roupa social, mas um pouco despojada, o equilíbrio perfeito. Seu cabelo, que apelidei carinhosamente de óreo por conta do biscoito, pendia sobre a camisa social branca com ondas loiras e algumas mechas escuras da cor da franja. Essa combinação poderia dar certo apenas nela.

Kim Yoohyeon cresceu ao meu lado e do meu irmão e hoje é meu braço direito nesta instituição chamada K-In, que nada mais passa de uma facção criminosa especializada no tráfico. Bem, seria comum se não contássemos com um segredo quase sobrenatural, que agora meu irmão tolo colocava em risco por puro orgulho. Talvez por estar sempre presente na minha vida ela consiga enxergar no fundo quem eu sou, essa poderia ser a razão pela qual sequer cogitou que eu o mataria com minhas próprias mãos.

–Não vou fazer nenhuma besteira, Yooh. –Dei uma tragada lenta no cigarro esperando que a nicotina me acalmasse. Apesar de nunca transparecer, o caos vivia dentro de mim como se fosse parte do meu ser. –Não colocarei essa instituição em risco, eu sou bem diferente dele como você já deve saber. –Deixei com que a fumaça escapasse.

–Eu sei. É por isso que está aqui hoje. –Claro que era por isso, eu era uma pessoa precavida demais para me permitir cometer riscos. –Mas eu não vim falar sobre o Jie, e sim porque recebi uma informação de que o FBI está com uma nova força tarefa focada em uma coisa: pegar você.

Olhei para a garota sem dar muita importância para o que foi dito, mas percebi alguns documentos em sua mão e estendi a minha livre para pegá-los enquanto dava outra tragada no cigarro.

–São dados dos agentes responsáveis pelas investigações. –Ela disse. –Pensei que talvez gostaria de ficar a par da situação.

Folheei pacientemente a ficha de 10 agentes, talvez os mais competentes dentre o FBI, assim eu esperava, não sou qualquer uma. Nenhum dos nomes me chamou atenção, a não ser o de três recrutas novatas que provavelmente desistiriam da carreira diante da frustração que teriam ao tentar me capturar.

–Não acho que exista nada para se preocupar aqui. –Disse entregando de volta os papéis.

–Se você acha... –Ela pareceu hesitar. –Vou ficar de olho de qualquer forma.

Os olhos de Yoohyeon de repente se desviaram dos meus e começaram a acompanhar uma borboleta de asas transparentes que pousou no meu ombro. Então diversas outras começaram a surgir inundando toda aquela enorme sala com o bater compassado de suas asas. Da minha boca apenas saíram as palavras "On aga naya in maya sowaka" e de repente não estávamos numa sala no centro de Los Angeles, mas sim em uma salina cujo solo refletia o azul e as nuvens acima de nós, causando a sensação de que estávamos pisando no próprio céu.

A garota sequer esboçou reação, apenas desviou os olhos para minhas mãos que não contiam mais o cigarro que eu fumava antes, agora faziam um dos nove gestos do Kuji-Kiri, passados de geração para geração na nossa família, e aquele era o selo Jin. Graças a ele eu pude entrar na mente de Yoohyeon criando uma ilusão realista de estarmos em um lugar onde não estávamos necessariamente.

–Você não precisa usar isso em mim. –Ela pareceu desconfortável, por isso rapidamente desfiz o selo para que voltássemos ao meu escritório novamente.

–Claro que não. É só pra você se lembrar de que não existe chance alguma de um ser humano comum me capturar já que ele teria que lidar com isso. –Ela apenas deu um sorriso educado. Eu não precisava mostrar para que ela soubesse. –Deixe os documentos em cima da minha mesa, vou dar uma olhada novamente mais tarde. Por hoje você está dispensada.

Coloquei as mãos nos bolsos novamente e me virando para a parede de vidro que mostrava o quão alto estávamos, dali eu podia ver os prédios abaixo de nós e o pôr do sol deixando um rasto laranja e se despedindo como um gato preguiçoso. "Uma bela obra de arte." Pensei. 

Vigilante Shit - Jibo FanficOnde histórias criam vida. Descubra agora