A BMW preta desceu pela rua Vila Aurora e trilhou pela mata do sul do Curicica. Ao lado direito de Gerson, Bento o olhava com um calibre 38 apontada para sua barriga, enquanto do outro, o cara novo não segurava nada. Talvez estivesse consciente de que o apagaria com um soco nem tão caprichado, caso Gerson tentasse alguma coisa.
Gerson, o galego, respirou fundo, olhando para o lado. A pressão e o desespero quase cegava as vistas dele. Quando se está apavorado, geralmente a pessoa respira muito pouco, o que faz ter pouco oxigênio no cérebro, e com isso a não consegue pensar direito.
O Galego tentava respirar normal, colocando isso em mente. Respira. Respira. Respira.
"A respiração acalma os nervos e nos faz agir muito menos com a emoção e muito mais com a lógica" Aline vivia falando isso a ele.
— Tá muito nervoso? — Maninho o perguntou, no seu sotaque carioca.
Gerson abriu a boca para tentar falar alguma coisa, mas as palavras lhe faltaram e gaguejou. cacete. Ele estava mesmo nervoso. Maninho, do banco da frente da BMW, virou o corpo e olhou para trás, para Gerson, sorrindo.
— Olha você, se cagando todo! — ele reagiu, vendo a reação do amigo de infância ali, com armas apontadas para ele e dois capangas prestes a apagá-lo, se quisesse.
Gerson ergueu só uma sobrancelha e balançou a cabeça para os lados num movimento meio largado, como se aquilo fosse sua rotina. Ainda não era sua hora de se humilhar. Mas também não estava longe disso acontecer.
A BMW preta parou numa área aberta e desmatada. O sol ardido brilhava no meio do céu do Rio de Janeiro. Maninho foi o primeiro a sair. O motorista o segundo, ganhando por milésimos de Bento. O cara novo ficou encarando Gerson do lado dele.
Gerson o encarou de volta por algum tempo até Bento retornar com o braço para dentro do carro e o puxar pela manga de sua camiseta do ACϟBC para fora do carro. Ele o jogou no chão empoeirado e o homem rolou agora todo sujo.
Quando parou, ficou de quatro, olhando para cima e viu Bento sacando a arma novamente da calça jeans e a apontando para a testa de Gerson. Maninho sorriu numa posição descontraída.
— Eu te avisei o que aconteceria se não me pagasse, não avisei, Gerson?
O homem ajoelhado forçou para se colocar de pé, mas uma fisgada na perna, da surra que levou no morro antes de ser forçado a entrar no carro o fez vacilar e voltar a bater os joelhos no chão.
— Qual é, Maninho! — Ele abriu os braços num jeito amigável, mas Bento se aproximou dele com a arma agora mais ameaçadora. Gerson engoliu em seco, demonstrando o mínimo possível de medo e desviando a cabeça da arma que chegou a se encostar em sua testa. Respira. Respira. — Somos primos, cara. Você não vai matar seu primo, vai?
— Que mané primo, doido! — ele exclamou rindo e ao mesmo tempo transtornado. — Somos primos de quarto grau. Isso nem é considerado família, seu bosta.
Ele suspirou e olhou em volta. O motorista com uma arma apontada para ele de longe o cara novo contando apenas com o punho e Bento bem ao seu lado, com a arma colada em sua testa, acompanhando cada movimento dele.
— A gente era melhores amigos quando a gente era pequeno. — Mudou de tática. — Melhores amigos, Pô! — Maninho abriu a boca para falar alguma coisa, mas Gerson o interrompeu. — Eu que te apelidei de Maninho!
Imediatamente, Maninho apontou o dedo para o primo de quarto grau e explodiu:
— Véi, você parou de ser meu amigo no instante em que enfiou um filho na minha noiva.
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Cheio de Lero-Lero
RomanceVIGARISTA, BOM DE PAPO E CHAVEQUEIRO. A história vai seguir Gerson, um maluco do Morro do Dedéu, se enroscar cada vez mais em situações complicadas para se livrar de uma dívida e acabar se envolvendo com misticismo da forma mais charlatona possível...