Fazer a mesma coisa todo o dia era entediante: As mesmas histórias, os mesmos caminhos, as mesmas pessoas.
Lary sentia isso. Tudo bem que sua vida era ótima, com pais presentes e uma amiga legal. Só a achava muito... Muito parada. Da casa para escola e da escola para casa. Sem mudanças. Todos os dias. Não saía, não fazia amizades e nem causava problemas na escola.
As primeiras reflexões vieram com as conversas, conhecidos contavam de aventuras e acidentes engraçados que rendiam boas risadas. Começou a pensar do porquê não se recordar de nenhuma lembrança desse tipo, já que em 17 anos alguma história deveria ter se desenrolado. O que não aconteceu.
Até aquele maldito dia.
Apertando a alça da mochila preta com a mão esquerda e tendo a direita posta na maçaneta, girou e a empurrou, tentando moderar sua força por causa da madeira fina e leve. A primeira visão que teve foi do céu branco, algumas nuvens escuras preenchiam todo o espaço, anunciando a possível chuva que ocorreria mais tarde. Assim que abaixou o olhar, teve o deslumbre da segunda visão.
Na casa da frente, um garoto com o mesmo uniforme escolar que si, também fechava sua porta, para, logo em seguida, erguer seus lindos olhos castanhos para Lary.
Lucas tinha se mudado a pouco tempo, por ser um descendente sul-africano negro em uma escola em que a maioria tinha a pele clara, sofria de piadas sobre sua cor, seu povo e seu cabelo, algumas chegando a gerar agressão. Perdeu a conta de quantas vezes havia sido transferido, e na grande maioria, era por um pedido da escola, alegando que o garoto estaria incomodando os alunos.
Naquela manhã, havia se encorajado em frente ao espelho, dizendo a si mesmo que iria enfrentar qualquer abordagem racista, porém, lá no fundo sabia que não era verdade, já que sua timidez extrema não permitia.
E foi ela que o fez quebrar o breve contado com a garota do outro lado da rua.
Ela poderia ser como eles.
Decidido, caminhou rumo a sua mais nova escola, ato que acordou a menina - até então encantada com sua beleza - fazendo-a andar na mesma direção que Lucas.
O caminho não era muito longo, mas o suficiente para causar um clima tenso entre os adolescentes. De vez em quando, eles se olhavam rapidamente e logo desviavam, ambos um pouco tímidos e receosos. Por motivos diferentes, claro.
[...]
- É sério! - Lary tentava explicar para a sua melhor amiga, que não queria acreditar em nenhuma palavra que dissera.
- Impossível alguém ser tão bonito assim, tem certeza que tá acordada? Doente, talvez? - Alice colocou a mão sobre a testa da menina, checando sua temperatura.
- Por que não acredita em mim?! Eu tô falando a verdade! Ele tinha uma pele escurinha tão linda, o cabelinho parecia ser tão macio, e nem se fala nos olhos, poderia olhar pra eles o dia todo. - diz suspirando, apoiando o rosto nas duas mãos, colocando os cotovelos em cima da mesa.
- Ninguém bonito entrou nessa miséria de escola nos últimos seis anos, tenho motivos pra dúvidar, só acredito vendo. Ah, já vou adiantando, só vai namorar com a minha permissão. - aponta o indicador na cara da acastanhada, como se estivesse julgando-a.
- Sai fora! Só achei o garoto bonito, ok? Não tem nada de mais nisso. - empurra o dedo com sua destra, se endireitando novamente na cadeira e olhando a posição da sua amiga. Ela tinha a costa do assento colada no peito, com os braços cruzados e o rosto apoiado neles. Os cabelos cacheados com mechas loiras permaneciam soltos, e como se o frio não a incomodasse, estava somente com a camiseta de mangas longas, puxadas até metade do antebraço.
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Palavras
Romance[ONESHOT] Onde uma vida entediante se encontra com a que nem pode se chamar de vida. Ou onde duas pessoas se apaixonam sem ao menos trocarem palavras. Lary não gostava do jeito repetitivo que vivia, achava tudo muito sem graça. Porém, toda vez que c...