Capítulo 3

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E a minha tão aclamada "liberdade" durou menos que 8 horas de sono.

Acordei um pouco eufórica e ligeiramente ofegante, porque a última coisa que eu lembrava era Daisy por cima de mim, se aproximando do meu rosto e murmurando algo no meu ouvido.

O alarme abafou o que ela ia dizer e nunca odiei tanto a tecnologia em toda a minha vida. Mas então agradeci ao celular berrante assim que lembrei da minha decisão do dia anterior.

Seguir em frente, pensar mais em mim e essas coisas. Era isso que eu deveria fazer. Estava decidido e eu não podia voltar atrás.

Desliguei o alarme de 7:30 da manhã e refiz todo o cronograma do meu dia na minha cabeça. Meus dias geralmente envolviam acordar cedo para chegar a tempo de ver Daisy chegando na Elysion, lhe oferecer café e então passar o dia intercalando entre trabalhar e delirar por ela. Não podia ser mais assim.

A primeira coisa a mudar foi meu horário. Então não saí de casa às oito como de costume. Eu só entrava às nove de qualquer forma, e dediquei o ganho de minutos fazendo skincare e maquiagem, assim como escolhendo uma roupa caprichada para trabalhar. Eu adorava montar looks, com certeza era sequela de trabalhar com figurinos de personagens.

A minha autoestima costumava ser forte, mas a conversa de ontem tinha me abalado bastante e eu precisava reforçar um pouco a confiança em mim.

— Bom dia, mamãe! Bom dia, vovó! — Desci do quarto quase tão sorridente quanto qualquer dia.

— Desceu um pouco tarde hoje. Não vai se atrasar? — Vovó Lucy foi a primeira a me cumprimentar e, como sempre, não era com um bom dia.

— Não vou não, vó. Na verdade, vou até tomar café em casa.

Mamãe parou o que estava fazendo e me encarou como se eu tivesse acabado de dizer que os quatro cavaleiros do apocalipse estavam vindo pra tomar café conosco também.

— Essa garota está estranha hoje, Gisele. O que ela tem? — foi vovó quem comentou e cutucou a mamãe para perguntar.

— O que há de errado em tomar café com vocês? Até parece que eu disse que estou morrendo — brinquei inocentemente sem saber que o comentário provocaria um sobressalto colossal.

Mamãe estava de pé na frente do fogão, mexendo com uma colher algo na frigideira, mas seu susto foi tão grande que antes que eu pudesse terminar o movimento de me sentar à mesa redonda a frente de vovó, senti que ia ter um mini infarto.

— E você está? Ah, meu Deus. Minha filhota, é isso que está acontecendo? Conta pra mamãe, por favor. — Ela largou a colher na pia e me agarrou em um abraço dramático.

Dei batidinhas em seu braço que apertava meu pescoço com força demais. Eu quis rir, mas talvez não fosse uma boa hora, já que ela parecia acreditar naquilo, e também porque o fato de cogitarem que a minha saúde definhava por sentar com elas durante o café me assombrou.

— Por que vocês são tão barulhentas?

Merline apareceu ainda com roupas de dormir e pela primeira vez eu quis pular de alegria por mamãe desviar sua atenção para olhar de cara feia para ela.

Merline era seis anos mais nova que eu e costumava levar a maioria das broncas por ser "dissimulada" e "preguiçosa", nas palavras da minha vó. Eu não gostava dos sermões que ela ganhava de forma gratuita, por isso sempre intercedia a favor dela. Nós não tínhamos tanto em comum quanto eu gostaria, mas gostava de pensar que eu era uma boa irmã mais velha.

— Sua irmã está com os dias contados — vovó disparou como se aquela não fosse uma afirmação absurda. Mas quando a encarei parecia que ela estava dizendo uma frase qualquer em uma conversa matinal comum, enquanto cortava metodicamente um abacate.

[DEGUSTAÇÃO] Talvez em DezembroOnde histórias criam vida. Descubra agora