Sempre pensei que eu estava no meio deles, ou melhor, entre eles.
Por muito tempo, ela me fez acreditar que eu era um erro naquela relação.
Afinal, não fui idealizada.
Claro que ela nunca falou as palavras em voz alta.
Talvez eu saiba ler corações ou entender o significado de um olhar.
Eu disse, "um erro naquela relação"? Não sei se esse é o termo correto para ilustrar o que eles eram. O erro existia, mas a relação não.
Eu era pequena, então tudo parecia ser maior para mim, assim eram eles, gigantes.
Grandes o suficiente para eu me assustar e correr para debaixo da cama com medo das guerras malfadadas entre eles.
O vencedor de cada batalha sempre saia mais machucado, nunca entendi isso.
Até eu crescer.
"O que leva duas pessoas decidirem casar-se?"
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Eu que sempre passei por enfermidades, finalmente consegui encontrar algo que gostava, passei a sentir o ar em meus pulmões e tudo foi fazendo sentido dentro de mim enquanto aprendia a praticar o talento.
Ela gostava mais ainda, é o que parecia, pois eu sabia fazer bem-feito o que nós gostávamos, ser uma pessoa com problemas na saúde passava desapercebido comparado ao talento.
Entre as guerras repentinas, houve um momento de paz entre os gigantes, pois algo novo chamou mais atenção, como uma luz no final da estrada diante da escuridão.
Os gigantes gostavam do espetáculo, aplaudiam de pé, sentiam orgulho da criação, por um momento não fui um problema de saúde, eu tinha um talento.
E por um tempo, assim ficou, eu parecia ser a bandeira branca que todos precisavam. Mas que ninguém teve coragem de erguer.
Um problema novo sempre aparecia, mas o talento se responsabilizava por mim.
Era o que eu pensava.
"O que leva duas pessoas, decidirem ficar juntas inseparavelmente, para sempre?"
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Parece ingratidão, mas eu nunca pedi tanto.
Por causa do meu talento, os gigantes apostaram alto em mim.
Uma soma que, somente um prodígio pode devolver em lucro.
Gastaram mais do que eu precisava, gastaram muito, para alguém que vivia se escondendo embaixo da cama.
Sim, eles não mediam esforços, afinal, eu era um prodígio! Era o que pensavam.
Por causa do meu talento, entre os novos problemas que iam surgindo, a saúde fragilizada, passou a ser o problema menor.
Foi quando descobri, a raiz de todos os problemas.
"Como um casal consegue continuar a ficar juntos?"
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Passei a observar mais, não só olhares, mas, re(ações), passei a ler mais corações e permanecer em silêncio o suficiente, para entender o que um eco vazio significa para palavras sem fundamento.
Passei a anotar tudo.
Tudo o que resistia por detrás do cenário, tudo o que assistia como espectador e tudo o que eu vivia e sentia em segredo, longe das peças.
Escrevi tanto que me perdi em mim mesma.
Por um longo tempo, me fechei para todos. Pois os diários eram eu e eu era cada palavra escrita do diário.
O que eu escrevia era sobre o meu mundo e o mundo no qual eu existia.
Eram mundos diferentes, mas acomodam-se ao mesmo mundo.
Sim, ninguém, nem eu mesmo, poderia ler tanto e tudo. Por isso, os grampeei, e nos perdi de vista na imensidão das quatro paredes do meu quarto.
Não sei se voltei a nos abrirmos.
Mas se eu li por uma última vez, foi muito tempo depois, no dia que decidi que nada mais fazia sentido ser mantido. Nem mesmo eu.
"Por que um casal insiste em continuar a ficar juntos?"
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Surgiram novas guerras.
Novas porque, a causa delas mudavam conforme o tempo avançava.
Os gigantes não se aguentavam mais. Não aguentavam mais a si mesmos.
Eu não cabia mais embaixo da cama, eu não cabia mais em mim, então me escondi fugindo da realidade.
Não importava como, eu só dava um jeito de sumir, mesmo estando ali, entre as duas linhas de trincheiras inimigas.
Mas foi lá que descobri novos talentos, que sempre foram ocultos aos demais.
Sim, me sentia feliz assim, somente eu me conhecia, somente eu.
Eu que vivia entre batalhas sem fim, parecia deixar pedaços de mim, uma morte lenta, mesmo havendo tanto talento assim.
Mas não morri.
Não morri para mim.
"Por que um casal insiste em um relacionamento que não dá certo?"
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O que uma menina talentosa pode fazer em uma guerra entre gigantes? "Escolher um lado e brigar", foi o que aprendi em algum lugar.
Sim, eu cresci.
Mas não gosto de extremos, por isso, escolhi ficar ali, bem ali. Onde é meu lugar.
Como uma flor observando a lua, lamentando pelo que o dia assumirá.
Ela, certa vez me disse que, faz tudo por mim. Mas eu nunca entendi o porquê que ela nunca me entendeu, não era sobre fazer tudo, era sobre não falar e principalmente não agir como um gigante. Afinal, eu não era um gigante, nem mesmo hoje eu sou.
E agora que tudo acabou, só a lamento e dor. Um erro no meio do caos.
Não houve um dia sem temor, sem tristeza, sem o caos da guerra deles.
Gigantes, não sei do que são feitos, mas certamente, são agressores da paz.
As consequências se perpetuam, ficando enferma, não desenvolvi, enterraram meus talentos, excederam o ar em meus pulmões e me perdi, não resta muito por aqui.
Se foi culpa deles ou minha, parei de tentar descobrir. Mesmo hoje, eu não sei o que é paz.
Se os gigantes são mortais, deveriam parar de errar demais, suas guerras exaltam o caos.
"O que faz um casal se separar?"
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Um erro no meio do caos
Short StoryUma narrativa de ficção com sabor de realidade. Sim! Um conto com duplo significado e ironias da vida caótica entre duas linhas de trincheiras inimigas. A obra "Um erro no meio do caos", foi escrita em reflexão das façanhas da vida do ser humano...