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    Mamãe sempre dizia que: rico é rico, e pobre é pobre, mas quando eu o via, meu coração esquecia.

    Cansado. Tal palavra é a atual definição dos profundos sentimentos a qual Gabriel Martinelli se vê perdido por mais um dia.

    Deitado sob os lençóis de seda, molhados e manchados por suas recentes frustrações formadas em gotas, estava beirando o fundo do oceano. Oceano esse que mantém seus medos e receios naufragados, presos em uma ancora. 

— Gabriel, eu e sua mãe vamos sair. – João, seu pai, ditou fraco enquanto caminhava até próximo ao corpo de seu filho jogado sem conforto.

— Tudo bem, papai. – respondeu trêmulo, vermelho como as pétalas de rosas jogadas em seu quarto.

    Sua genitora havia as dado como um pedido de desculpas, mas após outra discussão, fez questão de jogar o buquê contra o rosto do filho, e gritar aos quatro cantos que o menino era imprestável, péssimo e um sem futuro, no sentido literal da frase.

— Ainda chateado com sua mãe? Filho, vai mesmo discutir com ela por conta de um garoto qualquer? – parou de falar por segundos, pensando em formas de animar seu pequeno garoto. O dói vê-lo assim. — Se quiser, dou uma festa, tipo aquela que o pai do príncipe deu, só pra você conhecer os caras mais bonitos da cidade.

    Ele riu. Pela primeira vez ao dia, Gabriel sorriu verdadeiramente. A preocupação de seu pai era algo que admirava e amava no mais velho. Era realmente um pai, enquanto sua mãe, bom, não passava da mulher que o colocou no mundo.

— De oque adianta? Nenhum deles será Lucas. – respondeu o mais novo, virando seu corpo para pegar um pedaço do lençol e levar até seu rosto, a fim de secar as lágrimas grossas e teimosas que insistiam em se livrar de Gabriel.

— Droga... Eu sinto muito. – seu pai tomou o corpo do filho nos braços, o dando o mais forte abraço que podia, a fim de retirar a dor que seu único filho estava sentindo.

    Queria mudar. João nunca entendeu como uma mulher que veio do mesmo lugar que o amor de seu filho, o proibisse de amar.

    A noite se fez presente, e com ela, a melancolia noturna. Vinho se encontrava derramado pelo chão, assim como peças de roupa do garoto, que foram substituídas por um pijama confortável. A final, para chorar, necessitava de conforto.

    A campainha soou em seuus ouvidos, queria enfiar-se debaixo das cobertas e ignorar quem quer que fosse o intrometido que não o deixava curtir a companhia da melancolia, no canto de seu quarto, o dizendo coisas e coisas. No fim das contas, quem seria? Seus pais não retornariam tão cedo de suas saídas malucas para a 'farra.

    Andou o mais lento que conseguiu porta, querendo apenas que a pessoa desistisse e fosse embora por conta própria, no entanto se fosse um assassino, psicopata ou amigo, ainda estaria no lucro.
    Abriu uma pequena fresta da - exageradamente grande - porta, vendo um corpo masculino próximo ao seu portão. Não era um de seus amigos, não usava roupas chiques ou acessórios que brilhavam de longe em seus olhos, talvez tenha acertado e fosse a primeira das opções dada. Seja quem for, como havia passado pelo segurança do condomínio?

    Gabriel, sentindo a curiosidade, resolveu escutar a voz de sua cabeça que o mandava para lá. Se fosse um filme de terror, seria o primeiro a morrer por sua estúpida coragem. Em um pequeno surto de adrenalina, correu para perto do portão, reconhecendo o inconfundível.

    O corpo dourado estava parado a sua frente, com as mãos nos bolsos e um olhar cabisbaixo. Ainda sim, belo como sempre.

— Lucas! – gritou em êxtase. Suas lágrimas marcaram presença, porém não eram tristes, agora era tomado pela esperança.

— Baixinho... – disse em um sussurro, esperando as mãos trêmulas de Gabriel conseguirem abrir o enorme portão.

    Assim fez. O moreno correu para dentro, agarrando o corpo de seu garoto em um forte abraço, o erguendo para o alto como um um pequeno gatinho, em seguida o devolvendo para o chão após os protestos do menor. Como sentiu saudades disso.

— Como passou pelos seguranças? – Lucas sorriu amarelo, passando sua palma na própria nuca, ponderando o que poderia ou não falar.

— Seu pai meio que me ligou pedindo pra eu vir pra cá.

    Os olhos do menor se arregalaram, e quase saltaram para fora em surpresa. Não imaginaria uma atitude assim, esperava um conforto, claro, mas não que ele passaria pelas ordens de sua mãe e traria o pivô das discussões para sua casa.

— Caralho eu amo meu pai. – fora oque conseguiu dizer antes de correr com Lucas para dentro de sua casa.

    De mãos dadas, como dois fugitivos, corriam em direções opostas onde sabiam existir câmeras ou empregados intrometidos que ficavam mais que o necessário. Esses que foderam a vida de Martinelli, entregando com nomes e detalhes horrivelmente claros de o que aconteceu no jardim do lugar, na noite fria no primeiro dia em agosto.

    Gabriel, ainda preocupado, foi até a sala das câmeras, checando que não fossem pegar tal loucura orquestrada por seu pai; a presença alheia. Mas quando viu, tudo estava desligado, até mesmo os sensores de movimento.

— Papai pensou em tudo. – ele riu, sendo puxado por Tolentino, que repousou a cabeça em seu ombro de forma manhosa, querendo apenas tocar e estar com o menor.

— Sinto muito por não ser um dos caras ricos que sua mãe deve querer pro seu futuro, mas eu tô tentando, eu... – suspirou — Eu fui convidado pra jogar no flamengo, eles querem me contratar 'pro profissional e se tudo der certo, você promete me esperar? Promete que serei o único? Minha vida, eu quero te dar o futuro que você merece, uma casa como essa, ou até maior, luxo, roupas caras como as que você usa... Você sabe.

    Gabriel quis chorar novamente, porém sentia seus olhos arderem de forma absurda, como se estivesse prestes a sangrar pelo lugar. Seu coração que antes estava em pedaços, parecia se reconstruir, sentindo finalmente o que era ser amado. Não pelas promessas caras, isso nunca, a final, ele largaria tudo aqui e agora, caso ele pedisse.

— Você será o melhor do time, meu amor. – o moreno deixou suas palmas nas bochechas magras de Tolentino, olhando no fundo de seus olhos bobos e brilhantes como a bela Via Láctea. — Porém não quero luxo, quero apenas você, seu amor, carinho, e espero estar um dia lhe vendo jogar, vibrando por você e o beijando no fim de cada partida.

     Entre lágrimas finalmente derramadas, ambos selaram um contrato silencioso de paixão e amor eterno.

— Prometo lhe esperar... – decretou.

— Preciso ir.

— Tão cedo?

— Eu vim para me despedir... – a última fala fora dita por Lucas, pois nada saia da mente de Gabriel, foi como se sua boca travasse e não o deixasse mais protestar, não haviam ficado juntos tempo o suficiente para matarem a saudade e iria ver seu grande amor ir embora assim, como espumas ao vento. Novamente.

    Então... Até breve?

— Até breve, senhor Martinelli.

Quando o via - Paquetá x MartinelliOnde histórias criam vida. Descubra agora