Passado atual

Epígrafre

      Eu me encontrava  totalmente alheio ao que as pessoas ao meu redor conversavam. Seo-Jun contava de maneira completamente exagerada sobre um acontecimento que deveria ficar apenas entre nós dois, mas que ainda assim não acreditei ser possível, já que segredos não costumavam ser o seu forte. Minhas mãos se encontravam apoiadas sobre o teclado, enquanto eu me perdia por segundos arrastados em uma estranha sensação de dejavu que havia vivenciado na noite anterior, mas tratei de afogar minhas preocupações no momento em que ouvi a voz de Irene ecoar sobre o escritório composto por madeiras maciças, enquanto o bico de seu salto rasgava sem dó o chão coberto por verniz recém aplicado.

— Preciso muito desestressar hoje. Já é a segunda vez que aquele maldito me chama e não aceita nenhum de meus projetos. — bufou irritadiça, jogando-se á cadeira de rodinhas ao meu lado.

— É porque você não está sabendo convence-lo. — respondi, recebendo seus pés que se apoiavam de maneira apressada sobre meu colo. Sua saia era preta e social, e Irene vestia uma blusinha branca de gola bebê que a deixava extremamente graciosa. Agarrei com ambas as mãos sua tíbia direita, alcançando com os dedões a parte lateral da sua panturrilha completamente malhada.

    Eu não sabia dizer ao certo o que Irene significava pra mim, e muito menos responder com clareza o que tínhamos realmente, mas já fazia algumas semanas que obtivemos grandes avanços e hoje posso chama-la com liberdade para meu apartamento minúsculo sem que aparentasse um pervertido que só pensa em seu corpo. Entretanto, era isso que estava começando a aparentar, já que eu corria de relacionamento tanto quanto o diabo corre da cruz. E por mais que ela e outros tentassem engatar o assunto, havia sempre uma maneira de fugir logo após.

— Eu estou exausta, Koo. Já faz dias que trabalho nesse projeto. — suspirou profundo, agarrando a entrada dos fios de sua cabeça enquanto fechava seus olhos com um biquinho macio em seus lábios — Aish!

— Jungkook deveria falar com ele, já que são tão amigos. — Seo-jun intrometeu-se na conversa após rir o suficiente de todas as desgraças que sabia ao meu respeito — Não é a primeira vez que ele consegue desmotivar a equipe em tão pouco tempo. Daqui a pouco vamos preferir trabalhar debaixo de pontes ao ter que lidar com o mal humor de Min Yoongi.

— Vocês apenas me parecem muito preguiçosos. — bufei — Yoongi batalhou muito pra erguer essa empresa. Nunca vão compreender se quiserem sempre uma vida boa.

— Você só pode estar brincando. — Irene fitou-me irritadiça, retirando de forma furiosa suas pernas de cima do meu colo, puxando sua bolsa da mesa ao mesmo tempo em que se levantava — Koo, você mais do que ninguém sabe quantas noites em claros eu passei pra finalizar esse projeto. Como você... arght, você me frustra! 

— Irene ! — chamei seu nome ao mesmo tempo em que tentava segui-la para fora da sala entre passos ligeiros, mas ela parecia certa em ir adiante e me deixar para trás — Irene, não faça isso aqui... — pedi quase como uma súplica, fazendo-a paralisar poucos metros em minha frente a contra gosto. Sua expressão era um misto de furor e desapontamento.

— Você sempre está do lado de outras pessoas. O que está te dando, Jungkook? Eu sou o que pra você?

— Eu... — tentei pensar em inúmeras desculpas, mas já havia se passado tempo demais e Irene me conhecia o bastante pra entender que eu não me importava tanto quanto deveria — Irene...

— Retire esse disco do seu vinil, Jeon. Te ouvir falar meu nome, está me trazendo náuseas. — fitou-me com sua expressão movida por profunda tristeza — Me dê um pouco de valor, apenas. Isso parece completamente dificultoso pra você.

— Não dá para misturar trabalho e nossa vida pessoal. Isso parece completamente injusto. — tentei me explicar — Como chefe do departamento, o que você quer que eu diga? Não estamos na fase de brincar de boneca, Irene. Yoongi não está errado em ser exigente. Eu sinto que você exagera as vezes, não há necessidade de...

— Exagero? — encarou-me, desviando seu rosto para baixo enquanto ponderava sobre o que diria — Então está certo, Jeon — fitou-me mordaz — eu me demito. — e rumou sem hesitar para fora do estabelecimento, me fazendo querer segui-la rua adiante.

     O que não aconteceu, já que me encontrava completamente exausto das mesmas discussões, ainda que no fundo me preocupasse genuinamente