prólogo

227 23 16
                                    

Mimado, inconsequente e delinquente teen em potencial.

Eu aperto o celular com força, quero destruir ele em mil pedaços. Não. Quero destruir a pessoa desprezível que escreveu esse título ridículo nessa postagem ainda mais ridícula. Meu rosto esquenta enquanto leio o post, as veias do meu pescoço pulsando.

Só uma pessoa sem ter algo útil para fazer da própria vida distorceria a verdade desse jeito. A situação tomou um rumo perigoso e destrutivo para mim, agora minha imagem, que já não estava lá muito boa, está completamente enterrada na lama.

Dante? Dante, você ainda tá aí? A voz de Martin, meu empresário, ecoa no viva voz. Eu tinha esquecido que estava em ligação com ele antes de entrar no link que ele mesmo me enviou por mensagem. Dante? Você tá me ouvindo? Já chegou em...

— ME DEIXA PENSAR — eu o interrompo, a voz dele zumbe nos meus ouvidos e me deixa a beira da loucura, o som do rádio do carro também não me ajuda.

— E você pensa? — Eloísa, minha assessora, fala do banco da frente, claramente entediada e talvez tão estressada quanto Martin.

Tony, meu motorista, olha para mim através do retrovisor e um sorriso amigável surge em seus lábios, uma tentativa sem sucesso de me acalmar. Pelo menos ele baixa o rádio e isso deixa minha cabeça ferrada um pouco menos barulhenta e eu consigo organizar um pouco meus pensamentos.

Tudo aconteceu tão rápido que eu ainda não tive tempo para conseguir realmente pensar ou sequer respirar. Numa hora eu estava dando uma entrevista e autografando e na outra eu estava em todos os sites de fofoca de Cidade do México, pessoas falando de mim — e não de um jeito bom — por toda parte.

Eu respiro fundo, saio da página aberta no instagram e levo o celular ao ouvido.

— Foi mal, Martin — minha mandíbula apertada. — Eu te ligo depois.

Desligo antes que ele fale alguma coisa e passo as mãos pelo meu cabelo, puxando os fios compridos, minha perna tremendo. Não sou o primeiro famoso a se envolver em uma polêmica, mas ainda parece que o mundo vai ruir debaixo dos meus pés e me arrastar para baixo.

— Você tem algum doce aí? — choramingo.

— Você vai voltar a fazer terapia. — Elô me ignora completamente, enquanto arruma o cabelo ruivo cortado recentemente na altura dos ombros, ela parece mais velha e profissional assim. — E isso não é negociável.

— Eu não preciso de terapia — franzo as sobrancelhas.

Gosto de pensar que posso lidar com minha própria mente sozinho, não quero pessoas tentando me ler.

— Eu não diria isso depois dos últimos acontecimentos — ela abre a bolsa e tira uma barra de chocolate. — Sua mãe já marcou as sessões — joga a barra de chocolate para mim. — A partir de agora você é total responsabilidade dos seus pais. Finalmente vou ter meus tão sonhados dias de glória.

— Espero que você seja muito infeliz nos seus dias de glória.

Elô faz por mim mais do que o trabalho dela exige, ela cuida da minha alimentação, garante que eu tenha minhas sagradas oito horas de sono, organiza minha agenda e ainda aguenta minhas tendências autodestrutivas. Acho que ela precisa mesmo de dias de glória.

Ela limpa a garganta e me lança um olhar sugestivo quando o carro passa por uma placa muito familiar, a ficha começa a cair aos poucos.

BEM VINDO A SAN PIEDAL

A cidade onde eu morei por cinco anos antes de me mudar para a capital, o meu pior pesadelo e inferno na terra.

Quando minha mãe ligou para Eloísa, quando elas passaram mais tempo que o normal conversando, quando me disseram que eu devia passar um tempo longe dos holofotes, eu achei que seria uma boa idéia. Mas agora, tudo que eu quero é voltar para a poluição atmosférica da capital, me enfiar no meu quarto e assistir Man of Vengeance pela terceira vez.

Não acredito em lei da atração, mas me agarro a toda força do meu pensamento, desejando reaparecer magicamente na banheira do meu apartamento de luxo em Polanco, ou em um restaurante internacional sofisticado na Avenida Presidente Masaryk.

Aperto os olhos e cruzo os dedos e...

— Você está com dor de barriga? — a voz rouca de Elô me interrompe, me fazendo abrir os olhos. — Parece que sim.

Olho em volta, nada de banheira quente, nada de restaurante sofisticado. Bufo e jogo meu corpo para trás, apoiando minhas costas no banco e afundando nele como uma pedra enquanto abro a barra de chocolate.

Pessoas desesperadas acreditam mesmo em qualquer coisa.

Olhares QuebradosOnde histórias criam vida. Descubra agora