ATO I

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East Harlem, Nova Iorque. 9:16 da manhã.

- e então, o que você acha? - perguntou Roy abraçando a esposa por trás. Anne observou com um olhar analítico a casa com fachada amarela e o jardim bem cuidado, e então respondeu:

- é pequena e não tem garagem. Mas é bonitinha.

- têm isolamento térmico, três cômodos grandes no andar de baixo, mais outros três em cima e um porão. E o melhor de tudo; ela é nossa! - declarou Roy animado. Anne se virou para ele, passou os longos braços em volta do seu pescoço e disse:

- eu adorei Roy! Mal posso esperar para conferir o interior.

- então vamos conferir - propôs ele logo após beijá-la - o caminhão trazendo o restante das nossas coisas, deve chegar até a hora do almoço.

- enquanto isso, podemos fazer um tour pela casa, e quem sabe, conferir se a nossa nova cama é mesmo confortável - falou Anne dando uma piscadinha de olho. Antes mesmo que Roy pudesse dizer mais alguma coisa, ela já estava o arrastando pelo caminho de pedra rumo á entrada. Os dois subiram os degraus da escada de tijolinho e adentraram á residência...

Lá pelas tantas depois, quando o sol ia sumindo no horizonte, Anne e Roy estavam na cozinha, terminando de jantar e planejando o que fariam naquela primeira noite na nova casa.

- hoje é dia de Halloween! - se lembrou Roy limpando os cantos da boca com o guardanapo. Roy Winters que acabara de completar 27 anos, três semanas antes, trabalha como analista de sistemas. É um homem baixo e franzino, de temperamento gentil e de olhos de cor escura, escondidos atrás das lentes dos óculos de grau.

- nossa Roy, é verdade! - concordou Anne se levantando e começando a recolher os pratos sobre á mesa. Anne que ganha a vida como atendente de telemarketing, é três anos mais velha que o marido. Uma mulher magra e alta, com grandes olhos azuis claros e longos cabelos castanhos, sempre presos num coque.

- sabe - disse Roy colocando seu prato sobre á bancada, e depois abrindo a geladeira - acho que devíamos dar um pulinho no mercado e comprar alguns doces. Certamente a criançada da vizinhança vai bater á nossa porta mais á noite, procurando algumas guloseimas.

- acho uma ótima ideia - concordou Anne despejando os restos de comida na lixeira - poderíamos até comprar algumas abóboras para colocarmos enfeitando a entrada na varanda da frente.

- pode ser - respondeu Roy pegando uma garrafa de cerveja na porta da geladeira.

- vai ser uma boa maneira de começarmos a nos apresentar aos novos vizinhos - comentou Anne colocando os talheres e pratos na lava-louças.

DUAS HORAS DEPOIS, 8:33 da noite.

- vai Roy... com mais força... isso... - falou Anne com as unhas enterradas no lençol. Passado um instante, o marido retirou às mãos dos seus quadris estreitos, rolou para o lado da cama, ficando de barriga para cima, então com a respiração ofegante admitiu:

- não consigo... me desculpe Anne. Achei que aqueles comprimidos que o doutor Charlton receitou estavam resolvendo esse "problema". Mas, pelo visto, estava enganado.

- mais cedo você conseguiu. Podemos tentar de novo mais tarde. Quem sabe com a ajuda de um outro tipo de estimulante. Uns "filminhos" quem sabe - sugeriu ela deitada ao seu lado, acariciando seu peito desnudo.

- falando nisso - disse Roy tateando a mesinha lateral procurando seus óculos - a gente poderia dar uma conferida no catálogo da Netflix e escolher um filme de terror pra assistirmos nesta noite. O que você acha dessa ideia? Tá afim?

- o que acho, é que a gente deveria seriamente assinar um outro canal de streaming - argumentou Annie enquanto vestia uma velha camiseta rosa desbotada sem mangas.

Naquele momento o som da campainha soou no andar de baixo.

- os primeiros visitantes! - anunciou Roy procurando o controle remoto da TV - aposto que são os monstrinhos devoradores de açúcar.

- Roy! - repreendeu Anne enquanto prendia seus cabelos na frente do espelho.

- a sacola de doces está em cima da mesa de jantar - disse Roy se virando e interrompendo sua busca por um momento. Ficou observando enquanto sua mulher se enfiava dentro dum short jeans apertado e calçava os sapatos de salto baixo. Estavam casados há dois anos e, reparou com surpresa, que Anne parecia ainda mais bela do que na primeira noite em que se conheceram numa festa na faculdade onde ambos estudavam juntos.

- que foi? - perguntou ela notando o olhar fixo do marido através do reflexo no espelho.

- nada... não é nada.

- você vem? - indagou ela se encaminhando na direção da porta.

- daqui a pouco eu desço - respondeu ele retomando sua busca pelo controle desaparecido.

- vai escolhendo o filme até eu voltar então. Apesar de que, acharia melhor a gente assistir na televisão da sala de estar. Ela é bem maior. Te amo - falou Anne saindo apressada do quarto.

- também te amo - respondeu Roy para a esposa, mas Anne já havia saído naquele momento. Quando fechou a porta deixada aberta pela esposa, Roy avistou o controle remoto caído caído atrás da porta. Se inclinou para pegá-lo, soltando um leve gemido de dor quando às costas estalaram. Problemas de coluna e de vista, pressão alta e impotência sexual, é campeão, o negócio tá ficando feio pro seu lado, pensou Roy apontado o controle remoto para a TV.

Dez minutos depois, Roy pausou o filme. Precisava esvaziar a bexiga e pegar uma outra cerveja na geladeira.
Se levantou e foi até a janela, afastando a cortina para dar uma espiada na rua. Passando em frente ao gramado iluminado de duas casas geminadas do outro lado, uma fila de pequenas silhuetas seguia pela calçada na sua perigrinação atrás dos santos doces. Um dos garotos, usando uma fantasia com capa vermelha e longas presas, parou um instante, lançando um olhar na direção da janela de onde Roy os observava. Ergueu o dedo do meio, depois voltou a seguir os demais no breu da noite.

Roy desceu o lance de escadas e, de maneira abrupta, parou no pequeno corredor que interligava a cozinha com a sala de estar.

- Anne? - chamou ele olhando para a porta da sala de estar que estava escancarada.

Silêncio.

Andou até a metade do corredor e, antes de entrar no banheiro, voltou a chamar pela mulher. Dessa vez elevando o tom de voz.

Silêncio.

- onde diabos ela terá ido? - se perguntou Roy entrando no banheiro.

Meio minuto depois ele saiu. Seguiu direto para a cozinha e abriu a porta da geladeira, sendo recepcionado pelo ar frio que saiu do seu interior. Pegou e abriu a ultima lata de Blue Moon: TSSSSSS!!!

Após dar um longo gole na sua cerveja e limpar o canto da boca com o dorso da mão, Roy olhou às horas no relógio de parede ao seu lado; o mostrador digital marcava 9:05 da noite.

- Anne! - gritou Roy depois de voltar até o pé da escada que conduzia ao segundo andar. Tomou outro gole da cerveja enquanto mirava os olhos na direção da porta aberta. Começou a sentir um sentimento de irritação se alastrando pelos nervos quando o silêncio continuou a ser sua única reposta.

Atravessou o corredor á passos largos, adentrou o aposento da sala de estar, e imediatamente viu Anne sentada no sofá de três lugares. Estava com às costas viradas para ele, e tinha o olhar fixo no retângulo escuro que era a TV desligada no painel á sua frente.
Roy soltou a lata de cerveja que tinha em mãos. O barulho da queda, fez Anne ter um sobressalto. Ao lado dela, acomodado no sofá menor, havia um outro homem. Um homem que fez Roy - que era totalmente cético com relação á fantasmas e aparições, e até mesmo zumbis - se afastar jurando que, naquele instante estava na presença de um ser sobrenatural. Mas, passado o susto momentâneo, Roy percebeu que não se tratava de um ser espiritual, mais sim, de um homem fantasiado com uma máscara do dia das bruxas.

Um homem com o rosto de caveira... e com uma espingarda calibre doze de cano curto...

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