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GABRIEL


Não é sobre amor.

Tampouco prazer.

É sobre vingança.

Se existe algo mais verdadeiro do que isso em tudo o que Antony Carson me ensinou enquanto destruía lentamente a minha família, desconheço. Embora eu fosse apenas uma criança na época, é impossível esquecer essa lição.

Ainda mais quando sou um aluno tão voraz.

E sempre busco colocar em prática o que aprendo.

Não esperava, entretanto, que fosse tão prazeroso fazer isso agora.

Minha presa é uma coisinha pequena de cabelos longos, pretos.

Mesmo distante, consigo ver seu nariz arrebitado e os óculos que usa, grandes demais para o rosto delicado. Também gostaria de enxergar a cor dos seus olhos daqui, mas não é necessário. Já conheço muito bem o tom esverdeado e cada um dos pontinhos castanhos salpicados em torno de suas pupilas.

Já vi sua foto tantas vezes que decorei até os mínimos detalhes.

A vista real, no entanto, é melhor. Diz coisas que a imagem e as poucas folhas do relatório sobre ela não conseguem.

Sua postura e todos os seus gestos, por exemplo, gritam polidez e suavidade.

Aurora é uma princesa fora dos contos de fada.

Pequena. Bonita. E delicada.

Eu descartaria sua existência da minha mente com facilidade.

Isso, se ela não fosse uma Carson.

Tão traiçoeira quanto todos os que compartilham seu sobrenome, aposto. A garota pode parecer inocente e doce, mas é falso. Não tenho dúvidas de que seja o tipo de pessoa que só revela suas intenções e seu verdadeiro caráter quando seus inimigos já estão na palma de sua mão. Não serei hipócrita para dizer que é uma característica ruim, no entanto.

Não tenho nada contra a garota, não diretamente. Entretanto, ela é a principal peça do meu jogo.

Com um sorriso se desenhando em meus lábios, observo cada um de seus movimentos enquanto a princesa se sente segura em sua torre... o majestoso Carson House de Boston. Ela mora nesse hotel desde criança, onde parece ter encantado todos que conhece. O hotel, uma das primeiras propriedades do império de sua família, já viu dias melhores. Do lado de fora, na entrada, o toldo verde-escuro que guarda seu nome está com uma aparência desbotada e o contorno das letras perdeu a nitidez.

Não é o único problema do prédio, nem de longe.

A arquitetura repleta de elementos clássicos, com colunas e ornamentações simétricas de mármore, parece malcuidada. Sei que seus singelos quinze andares, assim como os quartos que abrigam, estão sendo insuficientes para a clientela. Antigos demais.

No hall de entrada do hotel, porém, não é essa a impressão que prevalece. O lobby é parcialmente inspirado na antiguidade clássica, com colunas gregas e mosaicos no piso de mármore. O restante, em um contraste perfeito, possui características que combinam glamour e rusticidade — parede de tijolos e acessórios metálicos na recepção, madeira preta polida no corredor dos elevadores. Posso dizer que os móveis são novos e a estrutura está preservada.

À direita, escadas com corrimãos de ferro levam a um andar subterrâneo que contém o salão de jantar e bar — onde, em um dos cantos mais afastados, estou assistindo a princesa tomar um drink atrás do outro. Ela não está sozinha. A ruiva ao seu lado no balcão é uma amiga antiga, conforme as informações que recebi.

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