Chuva

2 0 0
                                    

Alice balançava os pés animadamente sentada no banco próxima ao balcão da padaria, o lugar era pequeno mas muito aconchegante com a decoração de madeira e flores simples, o cheiro de pão saindo quentinho era fantástico e os bolos que decoravam a vitrine eram lindos. Suas amigas sentadas nos bancos a esquerda riam do comentário mais cedo feito sobre uma série em comum:

-E então Alice, quanto tempo mais vai esconder sua casa da gente?-Letícia perguntou bebendo o resto do café

-Não estou escondendo minha casa de vocês-Alice retrucou fazendo uma careta-São bem vindas a qualquer hora!

-Isso é culpa dos trabalhos que arrumamos-Ana respirou fundo-enfermeira,-ela olhou para Letícia-advogada e designer de interiores-ela se virou para Alice-por que isso combina tanto com você?

Leticia e Alice riram. A garota era mesmo excêntrica na melhor das opções para descrever, baixinha de rosto levemente cheio marcado pelas sardas e cabelo cacheado ruivo que ela não domava desde a faculdade, tinha olhos verdes claros, nesse dia estava vestindo uma calça jeans rasgada, uma gorda blusa verde de lã e um colar com pingente de lua. Ela deu de ombros:

-Talvez eu goste de decorar a vidas dos outros

-Mas aposto que mesmo morando naquele apartamento a semanas não desempacotou tudo-falou Leticia

Alice riu concordando:

-Bem, vamos arrumar um dia para ir ate lá e fazer um churrasco certo Ana?-Leticia desceu do banco enquanto falava

-Eu moro num apartamento-Alice lembrou virando-se no lugar

-Fazemos na varanda

-Não vai caber

-Na área

-Minha casa vai cheirar a churrasco uma semana

-Desista de tentar faze-la desistir Alice-falou Ana procurando o dinheiro na bolsa-E depois com sorte irei levar algumas bebidas, então você nem vai se preocupar depois de tomar uma ou duas

-Eu não bebo Ana-a a garota falou pulando pro chão e acompanhando as amigas ao caixa

-Apenas socialmente não vai mata-la-disse Leticia enquanto pagava a conta

As três saíram do lugar para o vento gelado da rua, estavam no fim do outono e andava tendo muitas chuvas:

-Bem Alice, se cuida. Nos vemos de novo qualquer dia-falou Ana

-Lembre-se de ligar pra saber se ainda estamos vivas-falou Leticia acenando e partindo junto com a amiga pela rua

-Hum-Alice concordou acenando

Ela olhou para o céu, estava nublado e era fim de tarde. Estava como as pessoas costumavam dizer, triste e mesmo assim suas amigas quiseram sair depois do expediente pois não faziam isso a tempos. Ela tinha visto na previsão do tempo que ia chover por isso não tinha levado nenhum guarda chuva, agora se debatia internamente se devia correr pra casa ou andar bem devagar e deixar a chuva pega-la.

Acabou decidindo ir em uma passo normal e deixar que do resto o destino desse conta, chegou em casa com as primeiras gotas. Alice morava no terceiro andar de um prédio novo perto do parque, um prédio cinza sem graça que em nada combinava com ela, por isso dentro de casa a decoração era animada.

Moveis diferentes do convencional, quadros coloridos, flores de cores fortes. Cortinas azul escuro, uma estante de livros no canto com vários livros e caixas para tirar os que faltavam, um lugar simples, de um quarto, banheiro, sala, cozinha, área e o cômodo preferido a varanda.

Era pequena e ficava descoberta de forma que caia chuva, e foi isso que Alice amou na casa quando decidiu alugar. Ela sempre olhava uma coisa nas casas antes de alugar, algo fora do convencional para muitos, não importava se podia ter bichinhos, fazer barulho ate tarde ou se era pequena demais para morar mas a casa tinha que ter uma forma dela pegar chuva.

De poder sentir a chuva caindo em si. A ultima casa que tinha morado era perfeita pois tinha um quintal longo, mas o aluguel acabou se tornando caro demais para alguém que queria juntar dinheiro para ir a praia em um dia de chuva. Sim, muitos a achariam doida mas era seu sonho.

Quando pequena constantemente ficava na chuva, pulava em poças de chuva e chegava em casa como um moleque segundo sua mãe. Sempre se sentiu um pouco só por isso, pois quando a chuva caia todos queriam entrar em casa e só ela ficava para brincar, rindo de si mesma.

Mas não estava mais sozinha, pelo menos não se sentia mais, pensou enquanto tirava os tênis e corria para a varanda sentando no chão. Os pingos já eram mais grossos, e o vento bagunçava seu cabelo, ela olhou ao redor, os carros que chegavam em suas casas, os que saiam, as pessoas que corriam apresadas para fechar as janelas e por fim o apartamento de frente ao seu, no prédio da frente, outro prédio cinza sem graça. A qualquer momento ele iria sair, se passaram 5 minutos de chuva, 10 e então as cortinas cremes longas do 3 andar se abriram e ele apareceu.

O jovem daquele apartamento, com quem Alice sempre se encontrava em dias de chuva, pelo menos ao longe. Tudo começou quando ela se mudou para ali e a primeira chuva aconteceu, ela estava na varanda apreciando a chuva quando notou uma figura de pé na divisa da varanda com a sala do apartamento a frente o seu.

Era um jovem, devia ter sua idade, de longe ela não podia dizer muita coisa mas sabia que tinha pele clara, cabelos castanhos e parecia alto. Imaginou o que não conseguia ver, que ele teria queixo marcado, olhos azuis profundos, talvez cinzas. Que ele devia morar sozinho pois passavas longos tempos ali sem que ninguém o interrompesse, sempre com uma caneca na mão.

Alice não sabia porque mas não achava que ele bebia, imaginava ser um chá, talvez um café forte. Ela havia criado que ele devia ser dentista, talvez psicólogo, eram empregos que pareciam combinar com ele. Ela nunca tinha se encontrado pessoalmente com ele na rua ou tentou chamar a sua atenção para saber se ele a via.

Apenas torcia para que chovesse pois se chovesse os dois iriam se encontrar, ficar em suas varandas por varias horas. Enquanto sentia a chuva cair em si naquele fim de tarde Alice pensou porque o garoto nunca vinha para fora, sempre ficava na divisa, onde não podia se molhar. Ela tinha vontade de gritar, de chamar para que ele saísse pois não era assim que se apreciava a chuva de verdade.

Mas claro, apenas o olhou, observou a fina blusa branca, a calça preta de moletom e sua caneca branca na mão e sorriu. Feliz porque dividia aquele momento com alguém.

Quando tudo escureceu e o garoto saiu dali, Alice se levantou com a roupa secando no corpo e entrou também fechando as longas cortinas azuis.

Sim, eu sou uma jovem que gosta de romance clichê como adivinhou? kkkkk essa ideia como varias outras vieram quando eu estava observando a chuva e eu achei muito fofa. É um romance agua com açúcar, bem açucarado porque quem não queria viver um né?

Por culpa da chuvaOnde histórias criam vida. Descubra agora