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Da Lat – Vietnam

" ─ Muito cedo na minha vida ficou tarde demais" disse Marguerite Duras em seu livro "O Amante". Escolhi o Vietnam como destino por conta desse livro, eu sei, são memórias muito antigas, de um Vietnam que não existe mais, porém certas coisas, nunca tendem a mudar.

Estou olhando meu reflexo na água, sentado nas margens do lago Xuan Huong. Não posso dizer que estou feliz, é difícil relaxar sabendo que quando eu voltar para casa, vou retomar a minha rotina de trabalhar e ser uma peça funcional da sociedade. Eu deveria estar feliz por ter conseguido um emprego, mas não estou. Eu não sei o que eu quero fazer, mas eu sei o que eu não quero fazer.

Quando eu subi nas costas daquele majestoso Dragão Alaranjado, eu vi Seul coberta de neve, até o Namsan parecia a torre de um palácio invernal, mas quando o Dragão pousou em Saigon, a neve desapareceu, flores voaram como se fosse primavera. O Vietnam é sempre quente. Depois dei um jeito e cheguei em Da Lat, uma cidade romântica para apaixonados, mas eu estou sozinho.

Os vietnamitas estão comemorando o Tet, ou Ano Novo Lunar. Os templos estão lotadas de pessoas, o cheiro de incenso toma conta dos arredores, as famílias preparam Báhn tét, um bolo de arroz recheado em volta de folhas de bananeira, rezam pelos ancestrais e pedem um ano melhor. Eu sou apenas um turista, observando esse mundo entre o parecido e o muito diferente. A Ásia é enorme.

─ Tourist? Uma voz melodiosa interrompeu os meus pensamentos. Quando eu me virei, vi um jovem que parecia mais novo do que eu, com um chapéu cônico nas costas segurando uma cesta de palha com rosas recém-colhidas.

─ Oh yes, Korea! ─ ele sorriu, um sorriso largo e inocente, e respondeu, como se eu fosse a pessoa mais importante do mundo:

─ Eu posso falar um pouco de coreano! Precisa de ajuda?

─ Ah bom... Eu gostaria de tirar algumas fotos, você pode me mostrar alguns lugares bonitos?

─ Mas é claro, me acompanhe!

Acompanhei-o por uma série de belos chalés coloniais, templos multi-coloridos e flores, muitas flores por todos os lados. A minha câmera se esforçava para capturar a beleza das frágeis pétalas do pessegueiro. Em certo momento, uma brisa inesperada balançou os galhos e uma pétala voou até pousar em meu cabelo descolorido. Ele se aproximou, riu e retirou a pétala, e depois, ergueu o braço e a deixou ser levada pela corrente.

─ Me desculpa, mas qual o seu nome? ─ perguntei. Havia me esquecido dessa convenção social básica.

─Ngọc Hưng! Mas me chame de Hanbin!

─ Certo, pode me chamar de Hwarang!

─ Hwarang-shi! ─ ele pronunciou o meu nome com aquele sotaque que mais parecia uma canção de amor. Eu sorri, sorri com os lábios e o coração, fazia tempo que eu não sentia algo assim. Hanbin começou a cantar, distraído, uma música em sua língua nativa. Era como um velho Trot coreano, mas com aquela melodia primaveril dos vietnamitas. Fotografei-o.

─ Tem mais algum lugar que você queira ver, Hwarang-shi? ─ ele perguntou.

─ Bom, você sabe de algum lugar bom para comer?

─ Sim! Tem um restaurante ótimo aqui perto! E ele só vai fechar lá pra noite.

─ Bom, que música você estava cantando?

─ Ah! Uma antiga, sobre a guerra, no Vietnã tem muitas música sobre isso.

─ É difícil imaginar que um dia esse jardim celestial foi palco de uma guerra infernal... ─ ele concordou, e pegando uma flor da cesta, disse:

─ Mas tudo isso já passou, enquanto houver flores, o mundo vai ser um bom lugar para se viver.

─ É um bom pensamento. ─ concordei, a simples felicidade de uma flor é difícil de ser compreendida por uma mente cheia de matemática financeira e notícias pessimistas.

─ Devemos começar o ano com bons pensamentos! Assim vamos deixar o Gatinho feliz enquanto nos despedimos do Coelhinho feliz!

─ É Ano do Gato, certo?

─ Isso! Muitos planos para o próximo ano?!

─ Bom, na Coréia já é Ano Novo, mas mesmo assim não sei o que vou fazer...

─ Não se preocupe! Você ainda tem um ano inteirinho! E depois outro e outro, você sempre vai ter um ano novo! O importante é florescer.

─ Florescer? ─ questionei e ele sorriu me entregando a rosa que estava segurando. Eu senti um leve calor no meu peito, como se meu coração estivesse florescendo depois de um longo inverno.

Que esse seja o ano da minha primavera.




one por: narumacoffeehouse

betagem por: jaketulips

capa por: Taty_005

O ano da minha primavera | hwabinWhere stories live. Discover now