A lua era testemunha de sua solidão. Sozinho no próprio chalé, Nico encarava o próprio reflexo no espelho rachado apoiado num canto da parede, as sombras refletindo toda a atribulação do filho de Hades. Ele fazia isso várias vezes ao decorrer das semanas, retirava suas roupas e se julgava pelo que via no espelho, ignorando as risadas dos mortos que também julgavam seu corpo tão longe do masculino. Era uma autocrítica ordinária, enquanto todos cantavam animados envolta da fogueira, Nico se autosabotava pelo corpo indesejado que não pode escolher nascer. Se questionava como Will poderia se atrair por si, ele era tão repugnante. Sem nenhuma qualidade, o que o namorado poderia enxergar além de uma alma quebrada?.
Nico fazia de tudo para que sua própria feminilidade não atrapalhasse seu julgamento, reprimindo todas as disforias como se não fossem nada. Mal comia e treinava demais, esperando que suas gorduras inexistentes sumissem para que as curvas se arretassem. Fazia mil coisas para alcançar uma meta irrealizável: se tornar mais masculino, para que assim finalmente fosse mais bonito.
As lágrimas surgiam em seus olhos conforme os segundos passavam, julgando, sentindo aversão de si próprio. Teria deixado que a água transbordasse trazendo em conjunto o pânico disforico se não fosse pelas batidas na porta. Esfregou os olhos com força, já sabendo de quem se tratava, ninguém mais aparecia em seu chalé naquele horário. Ninguém além dele aparecia em seu chalé. Nem se deu o trabalho de vestir uma roupa, estava escuro e vazio, ninguém notaria o garoto vestindo apenas a peça íntima inferior como vestimenta. Respirou fundo antes de abrir a porta, dando o que o filho de Hades esperava ser um sorriso ao namorado que exibia os dentes brilhantes.
— Oi Ni!... O que aconteceu? – Perguntou, preocupado, entrando no chalé – você está com os olhos vermelhos... – Constatou, se sentando na cama do namorado, este que logo copiou o movimento.
— Ahnm... – Riu nervoso – Maconha...? – Tenta enganar o namorado, mesmo que a resposta tenha vindo com mais dúvida do que certeza.
— Nico, você estava chorando? – Passou o polegar pelas manchas secas por onde as lágrimas passaram anteriormente. O filho de Hades se esquivou desviando o olhar.
— Hm? C-claro que não. Que pergunta.
— Nico... – Tocou novamente seu rosto, virando-o para si.
— Apenas um pouco! Não precisa de tanto alarde, foi coisa boba.
— Por que estava chorando? – Questiona o filho de Apolo. Nico prende os lábios entre os dentes num ato involuntário, desviando o olhar novamente enquanto apertava as mãos em punhos. Will percebeu, claro, conhecia boa parte dos tiques nervosos do namorado então não hesitou em acolher as mãos frias do menor contra as suas que eram quentes – Se não quiser falar é 'ok, eu respeito seu tempo e sei que há coisas que doem demais externizar. Mas desabafar ainda é bom, principalmente você. Ni, eu confio em você e não hesito antes de jogar meus problemas em seus ombros, você sempre me ajuda como pode – Tocou-lhe a bochecha, depositando um carinho ali – Você é meu pilar, confie para que eu seja o seu também. Namoros não vem apenas com bons momentos e memórias esplêndidas! Dificuldades e medos são também presentes, no entanto não torna o relacionamento ruim ou menos atrativo. Estamos juntos nessa, eu estou com você e sei que esta comigo também. Então me diga se estiver tudo bem ou não, se quiser desabafar ou só ficar de preguiça em silêncio. Sabe que eu estou com você em tudo, não é? – Nico assente levemente, uma única lágrima, que foi delicadamente seca pelo loiro, caindo.
— Eu não sou bonito Will!! – Soltou, sentindo o peso saindo dos ombros – Eu odeio o meu corpo, odeio como... Como ele se parece tão... Feminino! É repulsivo! E... E eu não entendo como alguém como você possa se atrair por alguém como eu!. Eu nem sou um garoto de verdade, apenas uma farsa num corpo errado.
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Insicurezza
FanfictionOnde, movido pelos sentimentos disforicos rotineiros, Nico não consegue enxergar nada além de falhas em seu corpo e Will o ajuda a enxergar o quão bonito é.