CAPÍTULO UM

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DOIS DIAS HAVIAM SE PASSADO APÓS O APARECIMENTO DO JOVEM DESNUTRIDO E DELIRANTE.

A população descobriu que aquele rapaz era um dos 16 garotos que tinham desaparecido misteriosamente. Após seu retorno, seus pais o levaram para um check-in no hospital e dali, foi direto para casa, ás escondidas. Por ter sido o único a retornar daquele quase sequestro coletivo (o que era uma possível teoria, já que ninguém sabia a verdade), ele tinha se tornado uma 'celebridade infortunada', e todos queriam falar com ele para descobrir o que tinha acontecido e onde os outros estavam.

Bernardo Salles, o rapaz em questão, havia se acalmado um pouco, mas ainda repetia coisas como: "elas virão..." ou "demônios... aberrações... me deixem em paz..." ou ainda "minha alma não...", entre um sono e outro, provavelmente tendo pesadelos com aquilo que o tinha raptado.

Na manhã do terceiro dia do seu retorno, a campainha da casa tocou. eram por volta das 08h15 da manhã e a mãe do jovem, muito preocupada, foi olhar pela janela, para ver se atendia ou não. Com um suspiro de alívio, ela abriu a porta e três jovens entraram.

Se tratavam de Anna Victória Nascimento, Felipe Junqueira e Warley Queiróz, amigos de infância de Bernardo, e que, muito preocupados, resolveram visitar o rapaz. Eles estavam ansiosos e aliviados, por que, finalmente, seu grande amigo tinha voltado.

_ Bom dia, tia. - a menina sorriu, dando um abraço nela. Nos muito dias de ausência de Bernardo, Anna sempre esteve lá, para dar apoio a mãe e a irmã do menino, juntamente com os outros dois jovens. - Como ele tá? Nós esperamos um pouco pra vir por que não queríamos assustá-lo e nem atrapalhar o momento familiar de vocês. Também não sabemos como ele vai reagir...

_ Anna? - uma voz veio do corredor. Era Bernardo, e ele sorria. andou meio vacilante em direção a moça e a abraçou. Ela retribuiu e ele murmurou - Achei que nunca mais ia te ver... Achei que nunca mais ia ver nenhum de vocês... - ele olhou de relance para os amigos.

_ Hey, cara... - Warley chamou, com um meio sorriso. - A gente acreditava a todo instante que você ia voltar.

_ Abraço coletivo! - Felipe falou, alegre.

Eles se cumprimentaram e se abraçaram, muito felizes. O rosto de Bernardo estava corado e ele parecia muito melhor. A presença dos seus amigos fazia o rapaz esquecer da dor e do sofrimento dos dias desaparecido. Bernardo sentiu-se seguro de novo e aproveitou aquele momento. A mãe do menino, contente por ver alegria de novo no rosto de seu filho, abraçou-os também, sendo recebida com todo carinho. Ela sempre foi como uma mãe pra eles, principalmente para Anna, que era orfã e havia sido criada com os tios cruéis que sempre favoreciam a própria filha e deixavam a garota de lado, mesmo usufruindo dos bens deixados pelos pais de Anna.

Eles se afastaram do abraço e a mãe do jovem foi para a cozinha. Ouviram passos na escada e a voz fina de Maria Eduarda gritou:

_ Anna, você veio, finalmente! Já ia perguntar sobre você pro meu irmão. Acho que ele também tava ansioso pela sua visita, né, Bê?

Bernardo corou visivelmente. Ficou visível que ele tinha uma quedinha por Anna, e a irmã, com um pequeno sorriso maldoso, ergueu as sombrancelhas pra ele como quem diz: "fiz a minha parte, agora é sua vez.".

_ Maria Eduarda, também estava com saudades! - Anna sorriu, abraçando a menina. - Eu estava com medo de incomodar, por isso não vim antes.

_ Você não incomoda. - os dois irmãos falaram em uníssono, mas Maria Eduarda falou tranquilamente, enquanto Bernardo parecia um tanto aflito.

Os garotos sorriram e Anna também, mas com um leve rubor nas bochechas. Dona Maura, a mãe de Bernardo e Maria Eduarda, chegou na porta, sorrindo.

_ Venham crianças, vamos tomar um café da manhã caprichado.

_ Como recusar? - Warley abriu um grande sorriso, sendo o primeiro a seguir em direção a cozinha.

_ ah, Warley! - todos exclamaram, rindo muito. Ele era o esfomeado do grupo desde pequeno, e todos já estavam tão acostumados que aquilo virara piada interna dos jovens.

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DEPOIS DO CAFÉ, OS JOVENS FORAM PARA O QUARTO DE BERNARDO, SE ACONCHEGARAM POR ALI SEM CERIMÔNIAS, E FOI FELIPE QUEM FALOU O QUE TODO MUNDO QUERIA DIZER:

_ Agora que está tudo tranquilo, você vai nos contar o que aconteceu, certo?

Bernardo engoliu em seco e estava prestes a desconversar, quando Anna pediu, carinhosamente, segurando sua mão:

_ Bernardo... conta pra gente... todos nós ficamos muito preocupados com você...

_ Olha... é um tanto estranho o que me aconteceu... É assustador, na verdade. - ele começou a tremer violentamente e Anna apertou mais forte sua mão. - No dia que eu sumi, eu estava voltando da festa da cidade, eu tinha despedido de vocês e caminhava pra casa tranquilamente.

_ Eu lembro. - Anna comentou, ainda apertando a mão do menino. - Você disse que estava cansado e que queria dormir, aí foi embora. Depois disso você simplesmente desapareceu.

_ Eu tinha ficado com preguiça, então resolvi cortar volta do centro da cidade pela praia, que tem saída bem no fundo do quintal de casa. Eu fui caminhando tranquilamente, tinha tirado os sapatos e estava sentindo a areia meio morna nos pés, quando ouvi uma voz. Ela cantava, mas eu não consegui reconhecer a língua. Não era português, disso eu tenho certeza, nem nenhuma língua que eu já tinha visto. A canção era aguda e melodiosa e me prendeu tanto que eu fiquei instigado a buscar a origem. - nessa hora, Bernardo já suava frio, e era visível o quanto relembrar daquelas cenas era desconfortável para ele.

_ E então? Quem estava cantando? - Maria Eduarda foi quem perguntou por todos. Anna abraçou Bernardo e fez um carinho leve no rosto dele, para acalmar o rapaz, que continuou a narrativa.

_ Bom, era uma menina. Não, na verdade, era uma mulher. De costas, parecia quase ou totalmente nua. Observei ela cantando por um longo tempo, sem entender nada da letra, se é que tinha alguma, e sem entender o por que eu estava ali, preso daquele jeito, encantado com a voz dela. Depois de algum tempo, ela me notou. Durante todo tempo que eu a observei, ela se manteve virada e eu não pude ver seu rosto. Pelo brilho da lua, só consegui ver suas costas finas e delicadas, com a pele clara e sedosa, e o cabelo, que eu não consegui ter certeza da cor, e sinceramente eu não lembro mais. Quando ela me olhou, o canto parou e eu saí do transe. Os olhos dela brilhavam, e foi aí que notei que ela estava em cima de uma pedra, sentada. Ela sorriu, e voltou a cantar. Eu tive vontade de me aproximar dela, e foi o que eu fiz. Ela estendeu os braços, segurou meus ombros e o canto parou, e foi aí que eu vi que estava terrivelmente encrencado. - o garoto parou por alguns segundos para respirar. Ele ainda suava muito e tremia. Anna passava levemente a mão pelo seu rosto, limpando o suor carinhosamente. - Quando ela me encarou, a primeira coisa que eu notei foram seus olhos negros, que escorriam o que visivelmente parecia petróleo. Queria gritar a todo custo mas não tinha voz, nem reação. A coisa abriu a boca, e os dentes pareciam serrinhas, pontiagudos e afiados. A pele, era praticamente transparente e meio azulada. Dava pra ver as veias, que pareciam roxas e verdes, e o cheiro daquilo era nojento, uma mistura de mar, com enxofre e morte. O cabelo, ressecado e estranho, estava seco, caído nos ombros, e o corpo era murcho. Mas o pior nem era isso. O pior de tudo, era que aquela coisa tinha escamas de peixe em alguns pontos aleatórios do corpo, e tinha cauda ao invés de pernas.

_ Uma sereia?! - todo mundo gritou ao mesmo tempo.

O Encanto Da SereiaOnde histórias criam vida. Descubra agora