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Estou em pé na proa do navio, meus cabelos embaraçados voam conforme o vento sopra em meu rosto. 
sinto uma mão apertar meu ombro, e sei o que isso significa, não quero mover um centímetro não quero sair daqui, não quero ouvir o que Parrot tem a me dizer  

— Malia — sua enorme mão aperta levemente meu ombro, e então me viro para Parrot, o meio orc da tripulação, sua pele tem um tom de verde suave e seus olhos dourados transbordam uma certa preocupação, Parrot demora alguns segundos olhando atentamente meu rosto antes de dizer — Não achamos o corpo do capitão Hild, mas tudo indica que ele morreu 

Respiro fundo, antes de acenar com a cabeça, eu já esperava essa resposta.
Capitao Hild ou melhor Rodin, era meu pai, ou foi a figura mais próxima que tive disso, a pouco mais de três semanas saiu em uma expedição com mais sete homens em busca de um artefato sagrado, fiquei no navio com o resto da tripulação, há cinco dias os sete homens retornaram sem ele, tudo que sei é que eles foram encurralados, presos e torturados, mas conseguiram fugir com facilidade, mas a cela do meu pai estava vazia e havia apenas sangue pelo chão

Enviei então Parrot para fazer buscas, para localizar ao menos o corpo de Rodin, para que pudéssemos fazer a cerimônia de despedida, e agora descubro que Parrot não o encontrou, talvez tenham queimado o corpo, ou enterrado, o que acho pouco provável, só enterram quem é digno e piratas nesse mundo não são dignos de nada a não ser da forca, inevitavelmente a nossa tripulação prefere correr o risco e viver em alto mar do que viver sobre as ordens de um rei tirano em terra firme

—Malia, podemos fazer a cerimônia de forma simbólica, dessa forma todos nós conseguimos despedir do Capitao Hild de uma forma justa, o que acha? — apenas assinto com a cabeça e me viro observando a imensidão do mar  

Perder Hild é algo que nunca ponderei, sempre tive a sensação de que era eu quem morreria e o deixaria sozinho, afinal ele era um elfo, imortalidade era um fato para ele
agora eu? Sou apenas uma humana, provavelmente viverei até os oitenta anos sendo bem otimista.
Não sei ao certo como vim parar no mundo feérico, nem mesmo Hild sabia me responder a isso, dizia apenas que havia me encontrado em uma de suas expedições e ficou com medo do que poderiam fazer com um pequeno bebê humano, então me adotou e cuidou de mim como se fosse sua filha, me deu um nome, e uma família, me ensinou a navegar, a olhar mapas, a barganhar, foi ele quem passou unguento em meus olhos para que pudesse ver o mundo magico como ele realmente é, me ensinou a lutar e a usar facas, quando completei 14 anos e sangrei pela primeira vez ele contratou uma diabrete por um ano para me ensinar coisas de mulheres das quais ele dizia que não era capaz de me ensinar, ele era um amigo, nunca me tratou diferente por ser humana, e nunca permitiu a tripulação de não me tratar com respeito, me ensinou a beber o vinho feérico e não me embebedar, me ensinou tantas coisas, mas nunca me ensinou sobre a dor de perder ele.

— Malia, está tudo pronto, vamos? — me viro pra Parrot e apenas o sigo até o convés, onde tem um pequeno bote de no máximo um metro e meio de comprimento, dentro dele tem um par de botas e o chapéu que Hild mais gostava junto a sua luneta, vejo Bee se aproximar e deixar uma garrafa de vinho feérico, e aos poucos os demais vão fazendo o mesmo, deixando coisas que gostam como se simbolizasse que a pessoa ao morrer leva um pedaço de você com ela, passo pelo bote e desço para meu quarto, olho em volta procurando algo que eu gosto muito para colocar naquele bote, mas nada parece ser o suficiente, olho o par de joias que Hild me deu ano passado no meu aniversário de 17 anos, são brincos que imitam a orelha de elfos, são de ouro maciço.
Levo minhas mãos para pegar o par de brincos e noto o reflexo de minha mão no pequeno espelho ao lado, então pego espelho oval e me olho através do espelho, meu rosto mais pálido que o normal, pequenas olheiras se formam abaixo dos meus olhos, meus cabelos que tanto amo estão bagunçados e sujos e então percebo que os brincos não são tão importantes para mim quanto meu cabelo

Sombra e FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora