Suguru o beijou como se fosse o seu último dia na terra. Os seus lábios tinham um gosto excessivo de despedida que o fez estremecer por trás de cada um de seus olhos. Havia algo distinto desta vez, um sentimento impalpável que descia agre pelo seu sistema digestivo, algo que provavelmente lhe causaria um enjôo demasiado mais tarde, os órgãos virados do avesso e a promessa silenciosa que parte de seu coração havia sido pego. Gojo o fitou longamente, a luminosidade precária deixando parte do rosto do seu garoto ocultado pela penumbra. Ele só estava tentando saber se essa escuridão partia de algo concreto ou das próprias entranhas de Geto. Ele suspirou, levantando as pernas e apoiando os braços nas mesmas, decidido a olhar a rua estreita, coberta pela quietude do interior do Japão. O garoto podia ver as folhas caídas de encontro a parte da grama ao longe, as casas alaranjadas de madeira com poucas luzes acesas, os canteiros de flores que farfalhavam quase tão alto quanto o seu coração.
“Você está fazendo um som estranho.” Geto disse de súbito, olhando-o de lado, as mãos pálidas por cima das pernas.
Satoru não se atreveu a encarar ele de volta, porém conseguiu devolver a frase com um sorriso de canto.
“Qual é? Você espera que meu estômago seja tão resistente para aguentar passar quase duas horas sem nenhum lanchinho?”Geto riu de forma seca e irônica. Foi como se ele estivesse se forçando a deixar qualquer coisa escapar de sua garganta, algo que não fosse nem tão assustador e nem tão falso. Sua presença não parecia estar ali. Não, não era a sua presença apenas, sua essência, os pormenores desajeitados e humanos que o faziam ser quem ele é, haviam desaparecido em alguma daquelas casinhas tácitas. Embora sua intuição berrasse para ele que a alma de Geto tinha se perdido em um local muito mais sombrio.
Satoru encarava o chão como se aquele fosse o único lugar certo para se olhar, porque, de alguma maneira, sua visão não parecia estar alcançando seu amado como deveria.Suguru se levantou de súbito, ainda sem procurar os olhos de Gojo diretamente. Ele colocou as mãos no bolso e anunciou baixinho:
“Vou comprar mais uns cigarros.”
O de cabelos brancos só disse algo como "já estava mais do que na hora", enquanto o outro partia em passos lentos em direção a pequena conveniência na outra rua.Oh, isso era trágico. Tragicamente reconfortante. Suguru o deixou sozinho em seus pensamentos nublados, mas o mesmo era causa deles. Gojo sentiu um desconforto junto
da longa paz que o alívio o trouxe. Ele não conseguia reconhecer se o garoto que partira a pouco era o seu garoto ou qualquer outro que tinha cruzado o seu caminho acidentalmente, com os olhos mortos e intenções cruéis. O seu toque se situava diferente, Satoru sentia que não estava tocando na pele de Suguru, no entanto sim na parte sangrenta onde seus demônios se escondiam. Ele não poderia culpá-lo de todo, suas próprias maldições internas às vezes também pareciam maiores que qualquer uma que ele tivera o desprazer de exorcizar. Contudo, sua consciência pesava quando por um mínimo segundo ele se pegava fantasiando como seria se abandonasse aquele mundo, se nunca tivesse tido consciência dele ou melhor, se ele sequer tivesse existido, se tornado simplesmente um grande ponto de interrogação na cabeça de seus progenitores. O cansaço físico e psicológico que ele se obrigava a aguentar era tamanho, entretanto fazia parte de seu ser, como uma prova de que ele havia nascido para ser o mais forte e morreria com todos ao seu redor sussurrando isso
ao seu cadáver.
Ele enterrou a cabeça entre os joelhos, um frio percorrendo a espinha ao imaginar quais possibilidades idiotas estavam se passando pela mente do melhor amigo naquele momento. Gojo gostaria de saber se comunicar diretamente, mas o que restava eram piadas meia
boca, ironia e poderes grandiosos. Ele não estava acostumado a lidar com coisas que não se expressavam e não se percebiam numa escala imponente. O mundo por essa ótica parecia impossível para ele compreender. Mas tinham tantas palavras que ele gostaria de dizer a Suguru. Gostaria de saber verbalizar: eu o amo como a primeira gota de água que transformou a vida humana numa racionalidade, oculta ao coração e que desde antes da
consciência soube como amar.Ele sentiu um pacote de pipoca sendo atirado contra a sua cabeça, e quando a levantou, viu Geto se sentar ao seu lado com o cigarro entre os dedos. Ele apanhou a pipoca com uma mão e com a outra remexeu nos seus bolsos, achando o isqueiro roxo desgastado que costumava fazer companhia aos dois em noites como aquela. Quando ele pegou, sentiu Geto inclinar a cabeça com o cigarro no canto da boca. Ele teve coragem de olhar nos olhos de Suguru quando o viu concentrado na chama do isqueiro, tentando incansavelmente fazer com que ele ascendesse. Satoru o achou lindo, mas não como achava antes. Era uma beleza ameaçadora, que queimava sua língua se você tentasse a descrever demais, repelia contato e poderia ser usada para fins questionáveis.
Geto se afastou novamente, apoiando a cabeça na parede e tragando o cigarro. Gojo abriu a pipoca rapidamente, dando algumas mordidas mas sem prestar atenção no sabor, apenas mastigando automaticamente e tentando captar a expressão de Suguru de soslaio. Eles ficaram naquele silêncio estranho por algum tempo, enquanto Satoru tentava ocupar a mente com qualquer bobagem e Suguru fumava, olhando para longe. Os olhos azuis viajaram para o lado novamente, observando atentamente cada centímetro do corpo do melhor amigo, tentando convencer a si mesmo de que ele era uma pessoa real, com sombra, cérebro e alma.
“Suguru?” Ele não saberia dizer se aquilo era uma indagação ou uma afirmação, todavia Gojo conseguiu sentir o coração se transformando em uma espiral e se conectando ao de Geto quando ele finalmente o encarou de volta pela primeira vez naquela noite.
“Satoru.” Geto disse, baixo, alto, sussurrando ou gritando, chorando ou com o maior sorriso que o mundo já fora capaz de presenciar. Ele não saberia dizer.
Ele hesitou um pouco.
“Somos os mesmos, não somos? Eu e você?” Ele indagou, as orbes percorrendo o rosto do outro como um pedido de socorro.Suguru desviou o olhar, tragando o cigarro com maior profundidade e em seguida o atirou ao chão. Ele tentou dar um meio sorriso ou o que quer que fosse, Gojo realmente não conseguia ler o que ele estava tentando comunicar, a face do seu garoto parecia um idioma
morto de uma civilização antiga.
Geto deu um suspiro, voltando a encostar a cabeça no muro alto. Satoru continuou disperso na coloração escura de seus olhos, tentando achar a saída, buscando respostas enquanto ia desarmado a um deserto perigoso cheio de bestas monstruosas. Por dentro, ele quis chorar.
“Você é bem idiota as vezes, né?” Suguru respondeu por fim dando-lhe uma cotovelada, arrancado o pacote de suas mãos sutilmente.Gojo sabia que essa seria a única resposta que ele o daria naquela noite. Ele gostaria de se sentir seguro, gostaria de sentir o amor atrapalhado e bobo que eles nutriam um pelo outro, onde um dia eles estavam beliscando um ao outro por trás das carteiras de Jujutsu High e no outro se beijando sorrateiramente durante uma missão. Seus questionamentos em relação a tudo aquilo eram tão altos que ele podia ouvir um zumbido incômodo nos ouvidos,
o mundo começou a ficar embaçado e distante do seu corpo. Quem não estava verdadeiramente ali? Mais uma vez, ele não saberia dizer. O desejo doce de ter Geto
Suguru eternamente para si, destruiu seus pensamentos em ordem cronológica, indo do primeiro cumprimento ao momento em que ele percebeu que parte do seu ser estava ausente, porque Geto havia ido embora. Ele almejava localizá-lo um dia, mesmo que nesse dia ele se situasse naquele lugar hostil onde elementos disformes comiam seus órgãos.
Gojo Satoru não reclamaria que o âmago amargo de Geto Suguru engolisse sua luz por inteiro, desde que no final ele pudesse agarrar a morte com as mãos sobre as dele, e dessa vez, salvá-lo.
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my six eyes tell me youre suguru geto but my soul knows otherwise
Fanfictionpela eternidade eles se amarão, mesmo que o fogo indistinto do inferno condene suas almas E os rasguem em pecados. (eu odeio os satosugu por me fazerem sofrer e odeio ainda mais a necessidade grandiosa que tenho em escrever sobre eles)