Aquele era o grande dia, então assim que as atividades do Clube de Artes Marciais encerraram, Shouji foi o primeiro a correr para o vestiário e o último a sair. Após se checar no espelho algumas vezes - o que era quase engraçado já que sua franja pálida e a permanente gaiter azul cobriam quase todo o seu rosto -, ele foi despachado por Ojiro, um de seus melhores amigos e colega de clube.
- Boa sorte! - Ele gritou.
Shouji apenas acenou de volta enquanto corria para o prédio principal. Ele ia precisar daquela sorte. Afinal, não era todo dia que ele se confessava seus sentimentos.
Quando chegou no genkan, o salão dedicado à troca de sapatos dos estudantes, ele já estava suado novamente - para o seu infortúnio -, e só teve tempo de ajeitar os cabelos antes de perceber Tokoyami se aproximando. Assim que seus olhares se cruzaram, o menor deu um de seus raros sorrisos que mostravam a dentição branquinha e com um aparelho discreto, e o coração de Shouji foi trespassado pela flecha do cupido mais uma vez.
- Perdoe-me pelo atraso. A discussão em torno de Murakami foi mais acirrada do que o previsto. Não conseguimos nos conter. - Tokoyami explicou quando parou de frente para o amigo, diante do seu armário.
Shouji balançou a cabeça, sem se importar. Como ele poderia quando o menor parecia tão adorável se esforçando para conter seu sorriso empolgado em seus lábios finos e voltar à sua persona austera e nobre, imperturbável?
- Parece que foi divertido. - Ele respondeu com um sorriso escondido pela gaiter, mas que podia ser visto em seus olhos.
- E foi! Você deveria lê-lo também. É inspirador. - Tokoyami garantiu, a empolgação evidente em sua voz potente.
- Eu irei depois que eu conseguir terminar sua última recomendação. - Shouji prometeu, embora soubesse que não deveria.
- Assim espero. Você está demorando muito para terminá-la.
- Já estou na metade, Yami... Bom, quase... - Shouji esfregou sua nuca com um sorriso nervoso. Ele até estava gostando da leitura, mas era difícil terminar um livro de quinhentas páginas e cumprir as obrigações da escola, da casa e do clube. Ele não tinha ideia de como Tokoyami conseguia, mas essa era uma das milhares de qualidades que ele amava no garoto.
- Certo. Mas lembre-se que não há vergonha em desistir de um livro que não te cativou. E você não precisa dizer "sim" para toda história que eu peço para você ler. - Tokoyami acrescentou com um toque de preocupação.
- Eu gosto de poder acompanhar a conversa quando você começa a falar sem parar. - Shouji respondeu com tranquilidade.
Tokoyami semicerrou os olhos em sua direção, então se agachou para pegar seus sapatos. Ao invés deles, porém, ele retirou um envelope preto, fechado por um singelo adesivo redondo e prateado. Medo invadiu o coração de Shouji ao entender imediatamente a situação. Entretanto, o rapaz agachado apenas revirou o envelope em mãos e olhou para o amigo, claramente confuso.
Sem pensar, Shouji também se agachou, ajudando a encobrir a descoberta de possíveis olhares curiosos - embora os dois agachados e encurvados ali pudessem chamar ainda mais atenção -, e Tokoyami abriu o envelope e retirou uma carta dobrada.
Era um poema escrito em papel envelhecido; o texto era um pequeno soneto de palavras difíceis, mas rimas bem construídas que proviam uma linda melodia; e a caligrafia era charmosa, em estilo gótico. Seja lá quem escreveu aquilo, pensou em cada detalhe que poderia agradar Tokoyami, além de se inspirar em cada pormenor que o agradava no pequeno estudante.
Shouji ficou surpreso com sua urgente vontade de arrancar o papel das mãos pálidas do outro e rasgá-lo em um milhão de pedacinhos. E quando olhou para Tokoyami, a dor em seu peito aumentou. O menor estava vermelho como Shouji nunca viu antes. Pelo tempo que ele passou encarando a folha, Shouji podia dizer que ele estava relendo de novo e de novo, com uma expressão incrédula e embaraçada ao mesmo tempo.
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Eu só Queria Dizer que te Amo
RomanceQuando Shouji decide se confessar para Tokoyami, cartas de um admirador secreto começam a aparecer no armário do menor, e agora ele não sabe como prosseguir.